Infância Interrompida

Já parou pra pensar o quão genial são as crianças? Elas sim que guardam a perfeição, e nós, somos os culpados por tirar delas esta virtude. Prova disso, é meu vizinho. Um garoto de apenas três anos, que acha que é o dono do mundo, que tudo deve acontecer conforme seu raciocínio. Inventou uma brincadeira nova, agora pensa que pode ser quem quiser e muda de rabugento para simpático apenas trocando de nomes... Genial, queria eu ter esta liberdade! Porém, talvez por inveja, apontam para ele e condenam: "Você não é Guilherme, seu nome é João.", ou pior, pensam que estão educando e dizem: "Não corra, não coma, não beba, não grite, não dance, não chore porque você é menino, não ria porque estou falando sério!".

Nossa inveja grita tão alto que sem perceber roubamos a liberdade das crianças, as colocamos em grades de ferro e esperamos que cresçam em ternos, limitando cada passo. E de quem é a culpa disso? É nossa!! Assassinos da alegria! Matamos cruelmente, com um golpe certeiro, a criança que somos. Fechamo-nos para o ilusório mundo dos adultos e fizemos questão de esquecer que também precisamos as vezes ser ingênuos, puros, alegres e sinceros como os pequenos. Queremos transformá-los no que rotulamos de jovens promissores, mas nem se quer sabemos o que significa. Fantasiamos o preconceito como a alegoria da diversidade de personalidades, pintamos a violência com a tinta podre da defesa pessoal, maquiamos a solidão com nosso limitado conceito de bem estar.

O João certa vez fingiu que voava como os pássaros dizendo que era o Homem-aranha. Pobre de nós, adultos, apontamos para ele e dizemos "João, o Homem-aranha não voa, quem voa é o Super-homem!". O garoto ficou emburrado e num resmungo respondeu: "Tá bom, eu sou o super-homem!" Tão inteligentes e não entenderam a metáfora que o ingênuo João acaba de criar. Ele só queria ser ele mesmo. Queria ser o super-herói que mais gostava e ter a sensação de liberdade que ele admirava nos pássaros, fazer o que ele mais amava, voar. Ser livre e continuar a ter o céu sobre sua cabeça.

Talvez se continuarmos a adestrar ele assim, um dia ele será um homem comum, daqueles que acordam, trabalham, voltam pra casa e dormem. Um daqueles que não percebe música no som dos pássaros, não se apaixona diariamente pela beleza da vida e nem sequer conhece o amor. Lerá mais jornais que romances, verá mais noticiários que filmes, irá perder mais tempo reclamando que agradecendo, acreditará nas explosões mas vai se recusar a enxergar o criador, simplesmente fechará seus olhos para a alegria e se mergulhará na mais intensa tristeza. Será que é esse o futuro que queremos para nossas crianças?