Março da Resistência: Memórias que Inspiram a Luta Contra o Racismo

Março é um mês que respira história, luta e resistência. Nele, o tempo parece se dobrar para nos lembrar que a batalha contra o racismo, o preconceito e a discriminação racial não é apenas uma memória distante, mas uma realidade pulsante que exige ação constante. Cada dia deste mês carrega consigo marcos históricos que ecoam as vozes daqueles que, em diferentes épocas e lugares, ergueram-se contra a opressão. São narrativas de dor, mas também de coragem, que nos convocam a refletir sobre o passado e a agir no presente. A luta pela eliminação da discriminação racial não é um evento pontual; é um compromisso diário, uma chama que não pode se apagar.

No Brasil, o dia 19 de março de 1849 marca a Insurreição do Queimado, um dos mais significativos levantes contra a escravidão no Espírito Santo. Nasceu de uma promessa quebrada: a liberdade prometida pelo frei Gregório José Maria de Bene aos escravizados de São José do Queimado. A revolta, porém, foi brutalmente reprimida. Eliziário Rangel, líder do movimento, foi preso, e muitos escravizados foram assassinados com seus corpos lançados na “Lagoa das Almas”. Essa história não é apenas um registro de violência; é um testemunho da resistência negra, um grito que ainda ressoa contra as injustiças.

No dia 14 de março de 1914, nascia Abdias do Nascimento, em Franca, São Paulo. Um homem que se tornou sinônimo de luta e arte. Ator, poeta, escritor, dramaturgo e político, Abdias dedicou sua vida à defesa dos direitos civis e humanos da população negra. Preso durante a ditadura de Getúlio Vargas, ele não se calou. Como deputado federal e senador, apresentou projetos que buscavam combater o racismo e promover a igualdade. Sua trajetória é um farol que ilumina o caminho daqueles que buscam justiça.

Em 7 de março de 1955, nos Estados Unidos, cerca de 600 pessoas marcharam de Selma a Montgomery, no Alabama, em uma das mais emblemáticas Marchas pelos Direitos Civis. Era um protesto contra a negação de direitos básicos à população negra, um ato de coragem que mudou os rumos da história. Já em 21 de março de 1960, na África do Sul, o massacre de Sharpeville chocou o mundo. Tropas do exército abriram fogo contra manifestantes negros desarmados, matando 69 e ferindo 180. Eles protestavam contra a Lei do Passe, que restringia seus movimentos e os reduzia a números em uma caderneta. Em memória às vítimas, a ONU instituiu o dia 21 de março como o Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial.

No Brasil, o mesmo dia, 21 de março, ganhou outro significado em 1997, quando Zumbi dos Palmares foi incluído na galeria dos heróis nacionais. Zumbi, símbolo da resistência negra e da luta pela dignidade humana, representa a força de um povo que não se rende. Recentemente, o Senado Federal também reconheceu João Paulo de Oliveira, o João do Pulo, medalhista olímpico e deputado estadual, como herói nacional, reforçando a importância de celebrar figuras negras que inspiram gerações.

Março nos convida a olhar para trás não para nos paralisar, mas para nos impulsionar. Cada data, cada nome, cada história é um chamado à ação. A discriminação racial não é um fantasma do passado; é uma sombra que ainda nos persegue, manifestando-se em olhares, palavras e estruturas. Eliminá-la exige mais do que memória; exige mobilização, educação e empatia. Que as almas da Lagoa, os passos de Selma, os gritos de Sharpeville e a resistência de Zumbi nos lembrem que a luta é contínua. Que Abdias do Nascimento e João do Pulo nos inspirem a construir um futuro onde a cor da pele não defina o valor de uma vida. Que este mês, e todos os dias, sejam de reflexão, mas também de ação. Porque a luta contra o racismo não é apenas um dever; é um ato de amor à humanidade.