DEMASIADAS AUTOCOBRANÇAS

DEMASIADAS AUTOCOBRANÇAS

Estamos vivendo num mundo altamente estressante, de cobranças infinitas e, portanto, inalcançáveis, diante de um contexto no qual a perda de saúde mental parece inevitável. De acordo com o último relatório da Organização Mundial de Saúde, o Brasil é considerado o país mais ansioso do mundo. Como podemos nos manter saudáveis em meio a tantos desafios?

O fato de figurarmos como o país mais ansioso do planeta aponta para a precária saúde mental, com implicações que refletem na forma como nos relacionamos e no modo como enxergamos a nós mesmos. Não ter tempo para si também representa não estar disponível para o outro, a não ser quando se trata de relações de trabalho, as quais estão cada vez mais exploratórias, haja vista o acesso constante aos colegas de ofício, fora do horário de expediente, incluindo os finais de semana.

Diante disso, a falta de rotinas mais saudáveis contribui para o aumento do estresse e, por conseguinte, para o adoecimento psicológico. Fazer refeições baseadas em alimentos não industrializados, exercícios físicos, leitura, (con)viver com familiares e amigos, realizar viagens, tomar um banho de mar trazem benefícios à nossa saúde mental. Em contrapartida, percebemos que frente aos excessos – de trabalho, de telas, de estímulos diversos, é comum recorrermos a aditivos, energéticos, café, remédios. A desordem é tal que o mesmo indivíduo que recorre a medicamentos para manter-se acordado posteriormente buscará um fármaco para conseguir dormir.

A gestão emocional passa por analisar quais fatores têm contribuído para promoção do mal-estar. Se muitos desses estressores não podem ser anulados, a forma como os encaramos pode ser modificada, seja por meio de um diálogo direto e franco com a pessoa que desencadeia o desassossego, seja com o auxílio profissional de um psicoterapeuta. Por vezes, é preciso criar metas realistas e procurar maneiras criativas e até bem-humoradas para lidar com os desafios. Considerar delegar as atividades, minimizar as situações – na medida do possível –, pedir ajuda a quem já vivenciou o problema são algumas das formas de administrar o estresse proveniente das demandas.

Também é preciso acomodar a ansiedade ao refletir que não somos obrigados a dar conta de tudo, inda mais quando é “tudoaomesmotempoagora”, pois super-heróis e super-heroínas são raros na vida real. Nossos poderes são limitados, e ser frágil não deve ser sinônimo de ser fraco. Admitir isso é sinal de muita força, sobretudo numa era em que se mostrar vulnerável para muitos é uma falha de caráter. Porém, muitas vidas poderiam ter sido salvas se propagássemos mais frequentemente o acolhimento de nossa fragilidade e falássemos mais sobre os nossos defeitos e menos dos nossos supostos feitos, tão falsamente disseminados na era das redes sociais.

É importante avaliarmos se as oportunidades que nos surgem merecem o desgaste psicofísico ou se é apenas o nosso senso de responsabilidade nos angustiando, além do desejo de que evento ocorra como esperamos. A situação é importante e desafiadora ou requer de nós uma energia tão dispendiosa a ponto de nos custar a saúde, noites mal dormidas, doenças de pele, gastrite, dores de cabeça, entre outras doenças e sintomas?

A cultura do desempenho nos ensina que devemos sempre nos superar, ser melhores e mais eficientes, mesmo que isso gere um constante sentimento de insatisfação. O problema é que essa lógica nos aprisiona em um ciclo desgastante, no qual nos cobramos além do necessário e, paradoxalmente, acabamos nos sentindo cada vez menos capazes.

Saber dizer “não” para certas exigências externas – e internas – não significa irresponsabilidade ou fracasso, mas um compromisso com a própria saúde. Momentos de ócio, pausas para respirar e atividades prazerosas são fundamentais para mantermos nossa capacidade de concentração, criatividade e, principalmente, nossa qualidade de vida. Ao contrário do que muitos pensam, parar por um instante não significa improdutividade, mas sim um investimento para que possamos seguir adiante com mais clareza e energia.

Em última instância, o verdadeiro desafio não está em realizar cada vez mais, mas em encontrar um ritmo sustentável que nos permita viver com propósito, bem-estar e leveza. Isso significa compreender que o nosso valor não está apenas naquilo que produzimos, mas também na nossa capacidade de reconhecer os próprios limites e cuidar daquilo que temos de mais precioso: nossa saúde física e mental.

Leo Barbosa é professor, escritor, poeta e revisor de textos.

(Texto publicado no jornal A União em 21/2/25)

Leo Barbosaa
Enviado por Leo Barbosaa em 21/02/2025
Código do texto: T8269393
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