VINTE DE NOVEMBRO, DIA DE CONCIÊNCIA.
Em um dos poemas de Fernando Pessoa: “Mar Português”, ele constatou:
“... quem quer passar além do Bojador, tem que passar além da dor...”.
Ao dobrar o Cabo Bojador, na África, o primeiro grande feito marítimo dos portugueses em 1434, os lusitanos chegaram ao coração daquele continente e logo esqueceram a dor da desafiadora conquista, tal qual aludida por Pessoa e também citada no inicio do mesmo poema:
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!...
Inesperadamente, nossos patrícios, dissiparam de suas memórias a dor para em seguida passar a infligir dor, pois, principiou-se naquela ocasião o “vaivém” dos navios negreiros. Ao fincarem seus pés na África, os portugueses, deram inicio à escravização daquele povo desvalido, era o ano de 1444. Posteriormente chegaram às “terras brasilis”; por aqui desaguaram o que iniciaram em meados daquele século e durante os 388 anos subsequentes, a degradante escravidão do povo africano prevaleceu. Por último, no sentido de “depois de tudo e todos” quando não mais precisavam deles, obrigados que foram pela força da Lei, trocou-os pelos formosos, famintos e miseráveis italianos, espanhóis, alemães e japoneses, entre outros. Sim! A Europa, assim como a Ásia, em constante “vira e mexe”, vez ou outra, se veem miseráveis e pobres; acreditavam, logo, piamente, que os ex-escravos africanos não eram merecendentes do trabalho remunerado, deixaram aqueles desamparados à própria sorte, ao largo da sociedade religiosa, perdulária, aristocrática, branca, elitista e racista de então. Sem direito à terra, educação e isolados socialmente, se juntaram nos morros, nos entornos de nossas cidades e por lá ficaram esquecidos.
Essa asseveração, ainda perceptível, a fazer parte do cotidiano do país, vai de encontro às intenções de melhorias em algumas dessas condições, planejadas através do humanismo, solidariedade, integração ou distribuição de renda, porém, sobressaem fortes objeções, advindas de parte da sociedade, uma desmensurada e absurda falta de noção da real história. Nosso país chegou ao que é hoje, edificado pela mão escrava, debaixo de chibatadas, torturas, privações e muito sofrimento. Foram eles os protagonistas da bonança tupiniquim colonial, mas sem deixar traços, visto que, subjugados, foram apagados da convivência, se, por ventura, fossem reparados, a causa era por motivo torpe, afinal, como afirmavam à época: “escravo não tem alma”.
Os afrodescendentes retratam seus ascendentes, consequentemente, vitimas são de suas exíguas perspectivas de vida, assim como da falta de discernimento social, cultural, político e intelectual; tentam sobreviver, apesar das circunstâncias, visto que ainda continuam sem muito de suas necessidades básicas, pois, a contínua convicção de alguns pela hegemonia de raça, etnia e gênero, sobre outros, está a resultar em discriminação, preconceito e tratamento injustificado.
Até quando?
Pelo livre arbítrio bíblico, acredito, que nem Deus saiba.