A vida mental de um empreendedor bem-sucedido
Introdução
Seja o que for que você sonha, comece.
A ousadia tem força, poder e magia.
Goethe
Este trabalho visa investigar alguns aspectos da constituição psíquica de um empreendedor bem-sucedido - consoante a psicanálise. Para tanto, inicia-se com a definição de empreendedorismo, que comporta diversas facetas. Dentre estas, elementos da genética, da neurociência e da psicologia são acrescentados às informações iniciais. Em seguida, hipóteses de trabalho da autora acerca do desejo e do sistema representacional permitem dimensionar essa condição no vértice psicanalítico. A próxima seção centra-se na história de vida e em elementos do discurso de um empreendedor bem-sucedido - com base no método clínico psicanalítico.
O empreendedorismo se define pela ação do empresário - que inicia uma organização. Significa atuar para mudar o mundo, ao identificar oportunidades e criá-las. O empreendedor é um realizador ativo, que muda o ambiente através de suas ações. Ele é capaz de lidar com incertezas e crescer com riscos calculados (Gartner, 1989).
Especialistas divergem em suas explicações sobre a mente empreendedora, conquanto citem as mesmas competências propulsoras do empreendedorismo: crença na própria eficácia, autoconfiança, personalidade proativa, tenacidade, paixão pelo trabalho, inovação, necessidade de realização, tolerância ao estresse, compromisso, motivação, otimismo e sacrifício (Mc Clelland, 1985).
Após essas informações gerais sobre o empreendorismo, faz-se mister adentrar no campo do funcionamento cerebral e dos genes para entender suas bases biológicas.
Empreendedorismo, neurociência e genética
Há regiões do cérebro que os empreendedores desenvolvem mais e melhor do que pessoas que não realizam uma atividade econômica, por sua própria conta e risco. Nesse quesito, Zollo (2016) revela que os empreendedores tomam decisões com mais rapidez, possuem uma visão geral mais ampla e desconsideram eventuais desarmonias do seu ambiente.
Tejero (2015) destaca a rapidez e a segurança na tomada de decisões como características fundamentais do empreendedor. Para tanto, precisa coordenar as diferentes áreas do cérebro: a tomada de decisões no córtex pré-frontal deve interagir com o lobo parietal, considerando o conjunto de informações, julgando os prós e contras da situação e avaliando o sucesso de sua decisão.
Shane (2010) aposta na influência da genética sobre a vida profissional, desde a escolha da profissão até os comportamentos da pessoa. Logo, a tendência de se tornar empreendedor está marcada nos genes abarcando o desejo de trabalhar por conta própria, explorar oportunidades, buscar novidades e valorização social - aliados à inteligência. Nos realizadores, o gene NR2B parece ser parcialmente responsável pela capacidade de sobreviver em ambientes hostis ou diante de mudanças bruscas na vida. Contudo, famílias de empreendedores têm maior chance de gerar novos empreendedores e os empreendedores de sucesso quase sempre têm um modelo, a quem admiram e imitam. No âmbito social, há países que incentivam essa forma de trabalhar.
Ainda no terreno da genética do empreendedor, o gene DRD4 está ligado à propensão de se assumir riscos financeiros. Ele atua nos níveis de dopamina, relacionada a centros de recompensa e prazer no cérebro. Ele regula características como motivação, busca de emoção e de novidades e se traduz em inquietação e curiosidade. Essa inquietação pode impulsionar a pessoa a assumir riscos maiores do que as outras (Mayseless et al, 2013).
Empreendedorismo e psicologia
A influência dos aspectos relacionais e das características de personalidade que favorecem essa condição é estudada nesta seção.
De acordo com De Vries (2001), o empreendedor tem uma memória dos fatos de sua infância, na qual o pai aparece como vilão que negligencia a família, enquanto a mãe aparece como controladora, que dá direção e coesão à família. Na medida em que estas duas figuras se confrontam, o filho empreendedor usa da rebeldia como fonte de inovação e habilidade. Quando o pai trabalha por conta própria, o filho pode se identificar com ele e superar os obstáculos com que se depara. E, ainda, sua exposição precoce ao risco pode aumentar sua tolerância a ele.
Para Mc Clelland (1985), uma pessoa empreendedora detém características empreendedoras: busca de oportunidade, iniciativa, persistência, assume riscos calculados, exigência de qualidade e eficiência, comprometimento, estabelecimento de metas, planejamento e monitoramento do negócio. O empreendedor tem a necessidade de realização, desejo de poder e de tomada de decisões; não gosta do trabalho rotineiro; tem alto grau de ansiedade e mentalidade prática. A necessidade de realização envolve a busca de excelência, em projetos de risco para atingir o sucesso, o enfoque dos resultados como oportunidades - não como mérito de seus esforços. Nesse caso, o dinheiro não é o elemento motivador mais importante de seu comportamento.
A ousadia em psicologia
Visto que ser empreendedor demanda ousadia, cumpre refletir sobre ela.
De acordo com a Associação Americana de Psicologia, a ousadia é a tendência para aceitar riscos e uma dimensão do temperamento de humanos e animais. As diferenças individuais na ousadia decorrem de diferenças na excitação de áreas do sistema límbico ligadas à avaliação de estímulos. Adultos ousados tem maior ativação do núcleo accumbens e menor ativação da amígdala, ao olhar as faces de estranhos.
Filliozat (2013) considera que assumir alguns riscos permite a construção de si, implicando ações necessárias, para se posicionar na vida. Lidar com suas falhas desbloqueia situações travadas, fazendo avançar seus projetos, ao ser responsável por sua vida. Quanto mais ousa atravessar certas barreiras, mais ganha confiança em si.
Conforme Senk (2017), a audácia implica a vontade de fazer as coisas, apesar dos riscos. Uma pessoa audaciosa pode aceitar o risco da vergonha e da rejeição em situações sociais ou públicas e, ainda, confrontar as regras de etiqueta e da polidez. A audácia tem relação com a coragem, para enfrentar o medo. Ela permite ganhar confiança, ao mobilizar recursos internos para atingir objetivos e afrontar adversidades.
O desejo e o sistema das representações
Para se aprofundar a compreensão do fenômeno em pauta, algumas propostas teórico-clínicas são adicionadas. Considerando-se a transmissão da vida psíquica na família conforme o approach psicanalítico, o empreendedorismo pode ser examinado no campo do desejo e do sistema representacional - hipóteses investigativas da autora.
O desejo se apresenta como um conjunto de representações e de afetos, que rege as forças psíquicas do sujeito. Em princípio, ele gera movimentos psíquicos em direção aos seus objetos de satisfação, até se efetivar no mundo. Contudo, as inibições na satisfação do desejo do adulto derivam de sua fixação em certas representações e afetos, que impedem sua realização. Esses bloqueios do desejo do sujeito se fundam no material psíquico de sua família. Assim, vivências familiares de gerações passadas marcaram o desejo do sujeito e seu sistema representacional (Almeida, 2003).
O sistema das representações do sujeito constitui um dispositivo psíquico com potencial para representar seus impulsos, relações de objeto e estados mentais. Sua função de representar as diversas vivências psíquicas se desenvolve a partir dos sistemas representacionais de seus objetos primários e, assim, se assujeita ao seu desejo. Logo, esses conteúdos psíquicos internalizados pela criança derivam dos conteúdos psíquicos de seus pais e antepassados. Esse sistema é constituído por diferentes camadas ou estratos psíquicos, nos quais se encontram as representações e os afetos do desejo que, a priori, dirige-se ao mundo das relações humanas. Esses processos tem relação direta com as gerações da família (Almeida, 2003).
A clínica do empreendedorismo
Nesta seção, a história de vida do paciente e recortes das sessões são apresentados ao leitor. Seu discurso é destacado por meio de aspas simples. O uso do travessão visa tornar mais claro o relato sobre ele. O itálico ressalta suas representações, suas mudanças na análise, bem como palavras estrangeiras.
Certo empreendedor bem-sucedido tem quarenta anos, sendo dono de cinco empresas. Chegou à análise, empurrado pela esposa e dizendo ‘o que é bom para ela, é bom pra mim’. Ainda que vocês estejam unidos, você é uma pessoa e ela é outra. ‘Não quero trair minha esposa, mas olho quando uma mulher bonita passa’. Seu pai traiu sua mãe e no tocante à sua esposa, ele deseja ser o oposto do pai. Porém, foi noivo durante nove anos de uma garota, a quem traiu várias vezes e por quem foi traído.
‘Eu olho no espelho e olho para fora’. Vamos olhar para dentro de você. Ele valoriza disciplina para alcançar metas no futuro, sendo bastante atento à questão do tempo. Nos negócios, busca parcerias com quem trabalha há tempos na área e tem valores próximos aos seus. Ele quer buscar investidores nacionais e estrangeiros, para ampliar seus negócios. Ele não tem medo de empreender e não conseguir realizar o que deseja. Ao contrário, ele tem medo de não tentar e de se sentir deprimido e frustrado depois. Que tal você pensar a relação entre disciplina, prazer e liberdade, nos negócios?
Ele valoriza pontualidade, honestidade, confiabilidade e compromisso nos negócios. Propõe para os funcionários que todos podem crescer juntos e odeia ser cobrado pelas pessoas. Em meio a isso, não sente culpa por seu desejo de crescer e não se identifica com indivíduos perdedores, fracassados e maltratados pela vida.
Aos sete anos, seus pais estavam brigando e sua família não foi convidada para uma festa de natal, na qual o restante da família se divertia. Ao vê-los na festa e ao ver turistas com um Nike, disse para si: ‘eu ainda vou ter tudo isso’. Essa frase revela otimismo, autoconfiança e capacidade de enfrentamento de situações adversas. Em vários momentos de sua vida, ele experimentou altos e baixos nos negócios. Frente a esses baixos, sentiu revolta, procurou caminhos alternativos e conseguiu crescer.
Em seu berço havia um tio Patinhas e sua mãe lhe dizia: ‘vamos arrebentar de vender’. Aos dezenove anos, herda uma loja da mãe, junto com o encargo de ele ajudar dois irmãos. Assumiu a direção do negócio, mas se sentia lesado e explorado por eles. Um ex-sócio/‘irmão’ o lesou e o explorou; ele ajudou um amigo ‘quebrado’: ‘eu carregava os quebrados’. Com isso, ‘explodia’ ao se sentir desconsiderado como pessoa e explorado nos negócios.
Aos vinte e dois anos, vendeu um carrão vistoso, para investir numa loja. Começou a ganhar dinheiro e entrou num ‘período ruim, de maus espíritos, vício, bagunça, baladas, amigos, mulherada, drogas’, de quinta a domingo. No domingo, eu trabalhava e na segunda-feira, estava esgotado física e mentalmente’. Não foi tão ruim assim, pois você não teve um filho indesejado, não contraiu nenhuma DST e não foi roubado. ‘Eu me arrependo do que fiz, eu poderia estar lá na frente’. Você está desconsiderando o prazer e as necessidades do garoto, na época. Porém, ele já tinha a meta de entrar na faculdade, para trabalhar com construção.
Aos trinta quatro anos, teve uma grande briga com o irmão, que não pagou a conta de luz. Então, ele assumiu o lugar de adulto responsável por cobrir as faltas dos pais/irmãos. Seus pais partiram do zero e cresceram muito, mas estacionaram na vida. Ele continuou crescendo. Encontrou sua esposa, iniciou seu negócio e entrou numa igreja, na qual o pastor fala de sucesso , abundância, prosperidade, amor e fidelidade. Assim, ele encontrou nesse pastor e em empresários de sucesso, modelos de inspiração para sua evolução. Esta vem ocorrendo, superando seus pais: atribulados por brigas constantes e desorganização nos negócios.
Ele tem raciocínios pouco comuns: ‘quando eu tiver um milhão, compro um carro de cem mil’; ele comprou um terreno, fez uma casa e a vendeu. Com o dinheiro da venda, fez uma aplicação, que lhe rende muito mais do que gasta no aluguel. ‘O que faço é simples’. Não é, é bastante fora da média. ‘Eu não fiz nada’, tendo se organizado para vender chocolates, um mês e meio antes da páscoa.
‘Eu me considero um sonhador’. Você é um sonhador-realizador, empreendedor focado e determinado. ‘Tenho medo de ser convencido’. Ser convencido é diferente de ter consciência do seu valor. Contudo, ele é simples na relação comigo. Vê que deixou sujeira no chão do consultório. ‘Você quer que eu varra?’ Quando precisa desmarcar a sessão, pergunta ‘posso’?
‘Você me acha ambicioso ou ganancioso’? Você está me dando muito poder para te avaliar, sem me conhecer. Você me parece ambicioso, pois sempre cresceu sem lesar ninguém. Antes, ele traduzia seu valor em números do valor de seu salário por mês; hoje, traduz seu valor não deixando que diminuam o valor de seu trabalho. Mudou do valor numérico externo para o valor interno, sem medo de ser convencido. ‘Consigo vender um imóvel - que construí - sem um corretor’.
Saiu da análise por oito meses, em meio à pandemia e voltou otimista. ‘O Brasil tá crescendo; aumentaram as vendas de carros caros e de apartamentos de alto padrão. Enquanto todos os negócios fecharam em sua rua, ‘fui pra cima e reformei duas lojas, troquei de carro e vendi uma casa de alto padrão.’ Assim, fez várias conquistas, mas é simples na maneira de se apresentar e de lidar comigo. ‘Meu raciocínio é simples’ - referindo-se a uma palestra e a uma viagem surpresa para os funcionários, a quem estimula a crescer. Seu raciocínio não é simples, pois uma rede importante de livrarias faliu - dada a concorrência com a Amazon e o assédio moral aos funcionários.
É capaz de ser bom e ser meigo - ao se referir ao meu atraso, me chama de ‘minha doutora’. Doutora já significou que eu era excelente e hoje significa que tenho raciocínios complexos. Você também é doutor na sua área e tem raciocínios complexos. Seu diferencial psicológico favorece suas conquistas: ele não tem medo da inveja do outro; não se preocupa com a concorrência; comanda seus negócios, chegando cedo e supervisionando-os todos os dias; oferece produtos de primeira qualidade, com preço acima da média, viaja para outros países para melhorá-los. Procura ter funcionários acima da média e oferece benefícios financeiros - acima da média dos outros.
Sua união com a esposa produz sucesso, pois ele tem uma grande capacidade de investir e ela de administrar e poupar, incluindo cálculos com receita e despesa. Formam um casal construtivo que trabalha junto para atingir objetivos em comum. Vive ganhos nessa relação, apesar da perda das ‘muitas garotas’.
Em três sessões consecutivas sobre o tempo, na primeira diz: ‘time is money’ e na terceira, fala sobre gerenciar diferentes negócios demanda tempo. Porém, aos poucos, o tempo vai incluindo o tempo para ficar com a filha, cuidar da saúde e aproveitar uma refeição. Tem uma fábrica de certo produto, vendido em duas lojas. Ele trabalha com construção e tem uma imobiliária para vendê-las. Você precisa estabelecer prioridades e delegar atividades. Contudo, o que ele mais gosta de fazer e faz melhor é executar metas. Seu foco é ‘produzir, executar e ganhar dinheiro’ de manhã, pois a tarde pensa em negócios futuros. ‘Eu planejo metas financeiras pra cada mês e pra daqui a dez anos’. Esse planejamento tem que dialogar com os limites da realidade. ‘Eu me programei pra acordar às seis, mas acordei às seis e vinte’. Precisa equilibrar o tempo de seu corpo, da família e do lazer. ‘Não gosto de procrastinar’. O tempo da procrastinação é diferente do tempo do relaxamento, que o ajuda a ser produtivo.
Ele é regido por um ideal de empresário, que trabalha muito, produz muito, ganha muito e dorme pouco. Você precisa descobrir seu estilo de ser empresário como fator de sucesso e como administrar seu tempo. Outro ideal é funcionar como uma máquina de produzir. ‘Quando tenho que fazer alguma coisa, que não gosto ou que não sei fazer bem, eu me irrito muito e explodo com minha esposa’. Como é ganhar muito dinheiro, mas passar muito tempo do mês, irritado? ‘É importante planejar pra perder menos tempo, casando planejamento e execução. É importante distribuir os produtos e investir em marketing numa mídia social, mas eu não tenho tempo pra isso’. Como fica a questão do prazer, do que você gosta e do que você faz de melhor, frente a todas as suas responsabilidades com relação ao tempo?
Ele ficou vários meses sem vir à análise. Seu conflito entre ser máquina e cuidar de si se desdobrou em esquecer a agenda de compromissos. ‘A tomada de decisão de manhã significa que às catorze horas, o cérebro pode estar cansado. Não gosto de procrastinar’. Há diferença entre procrastinar e ter tempo para relaxar, voltando às atividades com mais vigor. ‘Isso tá provado cientificamente. Vou pra praia por quatro dias. Tô feliz por ter feito uma grande venda e meus sócios me deram parabéns’.
‘Não gosto quando perco o controle. Minha esposa e minha filha estavam em casa, quando homens da prefeitura vieram derrubar a cerca da viela, adicionada a ela. Recebi uma ordem de despejo da minha fábrica, por causa de reclamações de barulho. A fábrica é o coração de meus negócios’. Quando aquilo que você ama de coração, é ameaçado, você o defende de forma agressiva, mas você pode ser machucado. ‘Durante vinte anos, convivi com a briga dos pais e não gosto de brigas. Minha mãe fazia o almoço e eu queria brincar, mas tinha que comer naquela hora, senão ela me batia’. Então, o tempo do prazer se tornou o tempo da submissão, da impotência e da raiva acumulada. ‘Meu pai tinha uma loja e comprou outra loja, que rendeu mais. Eu fiquei com a primeira loja e fiz o negócio crescer. Quando minha loja deu certo, meu pai propôs que a gente ficasse sócio. Quando nos separamos, preferi deixar de lado a justiça na divisão do dinheiro, pra que a briga não se prolongasse. Quando pus a comida pra cadela mais velha e a menor avançou na comida, a mais velha a atacou, por instinto. Corri atrás dela até bater nela e chutá-la, mas acordei arrependido de madrugada’. Muitas vezes, você se sentiu lesado pelos mais velhos e maiores/seus pais, ao ficar com os encargos e seus irmãos ficarem com as regalias. ‘Eu gostaria que meus pais ficassem orgulhosos com meu crescimento, mas escondo meu patrimônio, porque senão eles vão dizer: seus irmãos têm tão pouco’.
‘Eu não aceito situações ruins em minha vida’. Antes, você falava em revolta com elas e parece que seu sofrimento se transformou em amor e vigor. ‘Num momento de muita fúria, pra não bater numa garota que paquerou outro cara na minha frente, soquei a mão no vidro e fiquei com uma cicatriz’. Numa reunião com seus sócios, ele disse: ‘Agora vocês me têm, mas não me percam como ...’ - citando desde familiares até antigos sócios. O que faz com que alguém te perca? ‘Traição’. Traição envolve ser humilhado e ser desvalorizado em público, como pela garota; envolve seu ex-sócio que não cobriu sua falta quando ele precisou, deixou dívidas e tomou muito dinheiro dele. Lealdade inclui ser valorizado e ser reconhecido. Diferencia o tempo para desenvolver seu potencial do tempo do imediatismo, para finalizar um negócio.
Um vendedor se atrasou com ele, atendeu-o e seus sócios esperaram por ele. Quando ele atende o vendedor e seus sócios têm que esperá-lo e ele se atrasa comigo ocorre um engate inadequado do tempo. Ele foi o carro chefe, ao qual seus irmãos estavam engatados. Cobrir a falta dos irmãos atrasou seus planos. Porém, rompeu engates que o atrasavam e quer fazer engates de crescimento, quanto a tempo e lealdade. Dado seu desejo de grande lucro nos negócios, a parceria vem em primeiro lugar, incluindo lealdade, honestidade, transparência e diálogo entre os sócios. ‘Antes, fazer o que eu fazia, me parecia normal; hoje tenho maior consciência de mim. Evoluí com a terapia e recomendo pras pessoas’. Ele me elogia e reconhece meu trabalho com ele.
‘Revi a vila em que nasci, não é possível que eu tenha sido o único bem sucedido entre as pessoas. É surpreendente. Eu me sinto culpado por ser muito mais bem-sucedido do que elas’. Lá pelos trinta e dois anos, virei uma chave, a maneira que eu tava vivendo não tava boa, eu tava cansado daquela vida de baladas, amigos, mulherada’. De zero a dez, quanto você ganhou sendo responsável? ‘Sete em ganhos e três em prejuízos. Quero ajudar meus pais com dinheiro, mas cobrir as faltas dos outros...’ Você pode ajudar seus pais por generosidade, sem cobrir as faltas deles.
‘Esqueci a chave da loja em casa. Eu tenho esquecido essa chave várias vezes, coloco no balcão, entro e saio e acabo esquecendo. Minha esposa já pediu para eu fazer uma cópia dessa chave, mas esqueço. Para tirar essa cópia. demora uma hora. Tenho que ir até a loja, pegar dois produtos para enviar pro México e esqueço’. Essas tarefas, fundamentais para seus negócios continuarem crescendo, podem ser feitas por um motoboy, inclusive para você ter conforto psicológico. ‘O Bill Gates não faz a parte operacional, faz a parte estratégica. Eu preciso ficar na parte estratégica, tenho pouco tempo’. Você faz uma comparação de alto nível. Que tal pensar o tempo pra você, pra família, pra expansão dos negócios e pras lazer? ‘No final de semana, fico com elas na praia, faço exercício e tenho lazer’. Você já mudou, está pondo você e sua família em primeiro lugar e tem feito os negócios crescerem. ‘Fico triste ao ver os problemas dos meus pais e irmãos, mas as bases de honestidade vêm deles, é difícil unir minha mãe e minha esposa, há problemas entre elas. Vou pôr minha filha na natação, aí minha mãe e minha filha podem se aproximar. Eu tenho mudado, mas eles têm os mesmos problemas’. Hoje, você sente tristeza e preocupação por seus pais. ‘Eu gostaria de reuni-los, mas quando a gente se reúne, eles falam de faltas e me pedem alguma coisa. A sessão completou 360 graus’. Quando se completa 360 graus, se parte de um ponto, várias questões são revistas e se volta ao ponto de origem, de forma mais ampla e enriquecida. ‘Tô podendo ver as coisas de maneira melhor. Vou contratar um motoboy e ajudá-lo. O dinheiro tem que servir para abençoar as pessoas’. Você está conseguindo realizar o que desejou. Hoje, você tem sua definição de ambição e das bases das relações: honestidade, lealdade, junção de forças e dinheiro pra abençoar pessoas. ‘Sim, tô bastante feliz e orgulhoso de mim mesmo, com maior gratidão por meus pais.
‘Eu tô mais equilibrado e o equilíbrio é muito importante, junto com saúde mental e física, boa relação com a família, crescimento dos negócios e relação abençoada com dinheiro. Dei um dinheiro a mais pra gerente, pra que ela possa cuidar melhor do filho, pra ele comer melhor’. Você tem humanidade com seus funcionários.
Sua explosão à cobrança de uma vizinha traz o fato de ele ser o responsável sobrecarregado por tarefas, como na infância. Você não pode se posicionar e se defender: olha eu tô resolvendo isso, mas eu dependo da resposta de outros. Ele não podia se defender das cobranças da mãe: peraí, sou uma criança, sou um dos seus filhos, não tenho que dar conta dos meus irmãos. Não pode ser espontâneo, ter lazer, se divertir como criança. ‘Outra consequência ruim de ser o responsável que vigiava meus irmãos é o afastamento’. Porém, hoje, em 95% das situações, ele tem prazer de ser responsável, gosta de ser prestativo e de ajudar as pessoas, mas não gosta de ser cobrado.
Surge a confusão mental entre traição sexual-afetiva, traição pela falta de compromisso da funcionária junto com perda de pouco dinheiro e traição envolvendo o roubo de muito dinheiro. Ele fala da ‘minha carioca’, uma garota bastante bonita e desejada por seus amigos. Quando eles brigavam, ela ficava com outros homens e ele sofria muito com isso. Durante dez anos, ela ficou em sua cabeça. Esse encanto ocorreu porque ambos descobriram sua sexualidade juntos. Sua esposa é melhor do que ela.
Discussão
No início da análise, aparecem em seu sistema representacional ser indiferenciado da esposa, ser traído e ser traidor da ex-noiva - como seu pai e em oposição a ele. Nos negócios, ele busca ser disciplinado para atingir metas, ser parceiro de quem trabalha há tempos na área e tem valores próximos aos seus. Demonstra ser otimista e ser autoconfiante, tendo medo de não empreender e se sentir deprimido e frustrado depois. Ele valoriza ser pontual, ser honesto e ser compromissado nos negócios. Ele não sente culpa por seu desejo de crescer e se identifica com indivíduos ganhadores, bem-sucedidos e impulsionados pela vida (Almeida,2005).
Ao ser excluído da festa da família e ao ver turistas com um Nike, disse para si mesmo: ‘eu ainda vou ter tudo isso’. Essa frase revela ser otimista, ser autoconfiante e ser resiliente frente às situações adversas. Sua revolta o levou a caminhos alternativos e conseguiu crescer. Quanto a isso, as competências propulsoras do empreendedorismo são: crença na própria eficácia, autoconfiança, personalidade proativa, tenacidade, paixão pelo trabalho, inovação, necessidade de realização, tolerância ao estresse, compromisso, motivação, otimismo e sacrifício (Mc Clelland, 1985).
O tio Patinhas em seu berço e a fala de sua mãe - vamos arrebentar de vender -podem apontar o desejo materno de que ele trabalhasse muito e ficasse rico. Ao ser herdeiro de sua loja, coube-lhe ajudar dois irmãos. Um ex-sócio/‘irmão’ o lesou e o explorou; ele ajudou um amigo quebrado. Porém, explodia ao ser desconsiderado como pessoa e ao ser explorado e ser lesado nos negócios (Almeida,2005).
Após uma briga com o irmão, passou a ser o adulto responsável por cobrir as faltas dos pais/irmãos. Ele tem raciocínios incomuns: ‘quando eu tiver um milhão, compro um carro de cem mil’; comprou um terreno, fez uma casa e a vendeu. Aplicou o dinheiro da venda, que lhe rende muito mais do que gasta no aluguel da casa. Pensa ser simples o que faz, apesar de ser fora da média. Considera ser um sonhador, mas revela ser um sonhador-realizador, um empreendedor focado e determinado. Ser convencido é diferente de ser consciente do seu valor (Almeida,2005).
‘Você me acha ambicioso ou ganancioso’? Você está me dando muito poder para te avaliar, sem me conhecer. Você me parece ambicioso, pois sempre cresceu sem lesar ninguém. Seu valor mudou do valor numérico externo para seu valor interno, sem medo de ser convencido. Ser otimista surge em: ‘O Brasil tá crescendo; aumentaram as vendas de carros caros e de apartamentos de alto padrão’. Enquanto todos os negócios fecharam em sua rua, ‘fui pra cima e reformei duas lojas, troquei de carro e vendi uma casa de alto padrão.’ Assim, ser vitorioso alia-se a ser simples comigo. É capaz de ser bom e ser meigo comigo. Ele é doutor na sua área e tem raciocínios complexos. Seu diferencial psicológico favorece ser vitorioso: ele não tem medo da inveja do outro; não se preocupa com a concorrência, comanda seus negócios, chegando cedo e supervisionando-os todos os dias: oferece produtos de primeira qualidade, com preço acima da média e viaja para outros países, para melhorá-los. Procura ter funcionários acima da média e oferece benefícios financeiros - acima da média dos demais. Na relação com a esposa, vivencia ser parceiro, ser ganhador e ser bem sucedido, apesar da perda das ‘muitas garotas’ (Almeida,2005).
‘Time is money’ liga-se a gerenciar diferentes negócios, que demandam muito tempo. Aos poucos, ele inclui o tempo para ficar com a filha, cuidar da saúde e aproveitar as refeições, estabelecendo prioridades e delegando atividades. Ser realizador de metas se entrelaça ao tempo de ‘produzir, executar e ganhar dinheiro’ e pensar em negócios futuros. Ser um ótimo planejador demanda equilibrar o tempo dos negócios, o tempo de descanso do corpo, o tempo da família, do lazer - para ser mais produtivo - e o manejo dos limites da realidade (Almeida,2005).
A esse respeito, Mc Clelland (1985) diz que o empreendedor detém características como: busca de oportunidade, iniciativa, persistência, assume riscos calculados, exigência de qualidade e eficiência, comprometimento, estabelecimento de metas, planejamento e monitoramento do negócio. O empreendedor tem a necessidade de realização, desejo de poder e de tomada de decisões; mentalidade prática. Sua necessidade de realização envolve a busca de excelência, em projetos de risco para atingir o sucesso. O dinheiro não é o elemento motivador mais importante de seu comportamento.
Seu ideal de empresário abrange ser muito trabalhador, ser muito produtivo, ganhar muito e dormir pouco. Porém, falta-lhe descobrir seu estilo como empresário para ser bem sucedido e ser bom administrador do tempo. Outro ideal é ser uma máquina de produzir. ‘Quando tenho que fazer alguma coisa, que não gosto ou que não sei fazer bem, eu me irrito muito e explodo com minha esposa’. Precisa pensar a relação entre ganhar muito dinheiro e ficar irritado parte do tempo. E, mais, precisa gerenciar ser responsável, ter prazer, realizar o que gosta e focar no que faz melhor. Seu conflito entre ser máquina e cuidar de si se desdobrou em esquecer a agenda. Cabe diferenciar o tempo de procrastinar e o tempo de relaxar, voltando às atividades com mais vigor (Almeida,2005).
‘Não gosto quando perco o controle’. Quando aquilo que você ama, de coração, é ameaçado, você o defende de forma agressiva, mas você pode ser machucado. Durante vinte anos, conviveu com a briga dos pais e as regras/punições maternas. Então, o tempo de ter prazer se tornou o tempo de ser submisso, ser impotente e ter raiva acumulada. Muitas vezes, ele sentiu ser lesado pelos mais velhos/pais, ao ficar com os encargos e seus irmãos ficarem com as regalias.
Conforme Senk (2017), a audácia implica a vontade de realizar, apesar dos riscos. Ela tem relação com a coragem, para enfrentar o medo. Ela permite ganhar confiança, ao mobilizar recursos internos para atingir objetivos e afrontar adversidades.
‘Eu não aceito situações ruins em minha vida’. Antes, ele falava em revolta com elas e parece que seu sofrimento se transformou em amor e vigor. Ser traído envolve ser humilhado e ser desvalorizado em público. Ser leal inclui ser valorizado e ser reconhecido. Num engate inadequado do tempo, coube lhe ser o carro chefe, ao qual os irmãos estavam engatados e cobrir suas faltas atrasou seus planos. Posto seu desejo de ter grandes lucros em grandes negócios, ser parceiro vem em primeiro lugar, incluindo ser leal, ser honesto, ser transparente e ter diálogo com os sócios. ‘Antes, o que eu fazia, me parecia normal; hoje tenho maior consciência de mim. ‘É surpreendente ser muito mais bem-sucedido do que outras pessoas. Ao ser responsável, obteve ‘setenta por cento em ganhos e trinta por cento em prejuízos’. Decide ajudar seus pais por ser generoso, sem cobrir as faltas deles (Almeida,2005).
De acordo com a Associação Americana de Psicologia, a ousadia é a tendência para aceitar riscos e uma dimensão do temperamento de humanos e animais. As diferenças individuais na ousadia decorrem de diferenças
na excitação de áreas do sistema límbico ligadas à avaliação de estímulos. Adultos ousados tem maior ativação do núcleo accumbens e menor ativação da amígdala, ao olhar as faces de estranhos.
Para seus negócios continuarem crescendo e para ele ter conforto psicológico, decide delegar tarefas para um motoboy. Decide ser responsável pela parte estratégica dos negócios, como Bill Gates. Consegue administrar o tempo para si, para a família, para lazer e para expansão dos negócios. Sente-se triste ao ver os problemas dos pais e irmãos, mas pode ser grato para com seus pais. Ele tem maior clareza mental: ‘consigo ver as coisas de maneira melhor, vou contratar um motoboy e ajudá-lo; o dinheiro tem que servir para abençoar as pessoas’. Ser realizador de seu desejo, ter sua definição de ser ambicioso e das bases das relações abrange: ser honesto, ser leal, união de forças e uso do dinheiro para abençoar pessoas. Está bastante feliz e orgulhoso de si. Estar equilibrado se integra a ser saudável mental e fisicamente, ter boa relação com a família, crescimento dos negócios (Almeida,2005).
Contudo, ser cobrado por uma vizinha remeteu a ele ser responsável pelos irmãos e ser o vigia deles - quando criança - e a ser o responsável pelos negócios e ser sobrecarregado por tarefas - quando jovem. Ele não pode ser espontâneo, ter lazer e ser divertido em sua infância. Atualmente, ele tem prazer de ser responsável e de ser prestativo com as pessoas (Almeida,2005).
Surge a confusão mental entre ser traído do ponto de vista sexual-afetivo, do descompromisso da funcionária e de ser roubado qua nto a muito dinheiro. ‘Minha carioca’ era uma garota bastante bonita e desejada por outros homens, com quem ele vivenciou estar encantado, ser traído e ser muito sofredor. Sua esposa ganha dela.
Considerações finais
Ao lado de fatores biológicos - genéticos e cerebrais - a herança psíquica de sua família - os pais como modelos de guerreiros e a delegação de papeis - ser responsável pelos irmãos e pelos negócios - atuaram na formação desse empreendedor de sucesso.
Referências
Almeida, M.E.S. (2003). A clínica do absoluto: Representações Sobre-investidas que tendem a deter o Encadeamento Associativo. Tese de doutorado em Psicologia Clínica, PUC - S P.
Almeida, M.E.S. (2005). A clínica do absoluto: Representações sobre-investidas por ódio e horror. Pulsional Revista de Psicanálise, 182, 93-100.
Frese, M. (2010). Rumo a uma psicologia do empreendedorismo: uma perspectiva da teoria da ação. Revista de Psicologia. Universidade Federal do Ceará.
Disponível em: http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/17514.
Gartner, W. B. (1990). What are we talking about when we talk about Entrepreneurship? Journal of Business Venturing, 5(1), 15-28.
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