Apagão de nacionalismo

O apagão que tumultuou o Brasil no dia 15 de agosto último foi muito revelador. Até o dia seguinte as autoridades ainda não conseguiam ─ ou ainda não ousavam ─ revelar as causas. Mas admitiam que o sistema brasileiro é interligado, e que o problema num determinado local pode originar um efeito dominó de consequências nacionais. E também admitiam que as causas poderiam ser devidas a “falha humana ou até dolo”. Ou seja, não sabiam dizer se poderia ter sido um acidente ou uma sabotagem, algo premeditado.

Este apagão não poderia ter vindo em hora mais adequada para uma advertência: na véspera, o governo do Paraná vendia a antes estatal Copel ─ Companhia Paranaense de Energia ─ na bolsa de valores de São Paulo. Antes, a Eletrobrás já fora privatizada, em 2022. E, num sistema integrado como reconhecem as autoridades, onde um colapso localizado pode estender-se nacionalmente, as empresas de energia estaduais assumem a mesma importância estratégica da nacional. O possível dolo, ou seja, a possibilidade de uma sabotagem, aventado pelas autoridades, pode ter origem numa estadual, ou na nacional.

No Brasil ainda não aprendemos que o mundo vive um momento de conflitos e disputas que não dispensam as sabotagens? Que não é improvável que o apagão tenha de fato resultado de uma sabotagem? E que o sistema energético do país é de importância vital, e que seu colapso desencadearia o caos e a absoluta vulnerabilidade? E que hoje, no mundo, nações agem como as aves de rapina que são seus símbolos, debilitando suas presas para depois predá-las impiedosamente?

Energia, água, alimentos, combustíveis, transporte coletivo, saneamento, comunicações, saúde, educação, pesquisa científica, moradia... são setores vitais para um país que deseja tornar-se soberano, próspero e inclusivo. Setores que devem estar controlados por interesses nacionais, e não pelo volúvel e ambicioso interesse de empresas privadas. A razão de ser das privadas é o lucro. Doa a quem doer. A razão de ser das empresas estatais é, em princípio, a autonomia, o benefício coletivo, a independência. Embora as estatais estejam sob ataque constante daqueles que querem sucateá-las, depreciá-las e então privatizá-las, para o lucro e benefício de poucos vis apaniguados.

Essa é a diferença entre governos e políticas públicas socializantes versus privatizantes. É a diferença entre o socialismo e o neoliberalismo. Este último propugna o “estado mínimo”, alegando que o mercado é autorregulável, e que a estatização só atrapalha e atrasa. Que argumento tão enganador! A prática tem mostrado, no mundo todo, que a privatização dos setores estratégicos só traz prejuízos e retrocesso para as nações e suas populações. Quem ganha são aqueles poucos acionistas que já estão locupletados, mas nunca lhes basta a riqueza, nada consegue saciar sua sanha. Privatizações de setores estratégicos têm sido revertidas em reestatizações nos países que experimentaram os erros de acreditar na mentira da autorregulação do mercado.

Privatizar setores estratégicos, como é o caso da energia, é entregar o país à sanha da vampiragem transnacional.