Capacitismo

Algumas pessoas podem até falar que nos textos anteriores eu não estava no meu “lugar de fala”. Pois muito bem. Hoje vou falar sobre capacitismo, o preconceito contra pessoa com deficiência.

– Ah, mas você não é PCD.

De acordo com a Lei Federal 12.764, de 27/12/2012, a pessoa com transtorno do espectro autista é considerado PCD para todos os efeitos legais.

– Tá, mas e daí?

E daí que por conta disso, tenho todos os direitos das pessoas com deficiência, especialmente da Lei Brasileira de Inclusão, nº 13.146, de 06/07/2015. É aí que chegamos, finalmente – “finalmente, mesmo!” – ao assunto deste texto. Já sofri capacitismo por ser autista, mas o que mais me surpreende é que o caso de capacitismo que mais me abalou foi de uma pessoa com deficiência.

– E PCD pode ser capacitista com outro PCD?

Claro, afinal somos todos humanos falhos e pecadores. Não vou dar muitos detalhes para não expor a pessoa. Eu estava falando sobre a minhas dificuldades como autista (que não são poucas). Então, essa pessoa simplesmente falou que eu estava me vitimizando. Que ela própria tinha mais motivos para ter depressão, mas não tinha, pois era feliz. Essa pessoa tinha deficiência física. A minha deficiência é invisível.

Com relação ao autismo, muitas pessoas pensam que autistas são apenas as crianças ou aqueles que exigem muito suporte e não falam. Nós autistas que conseguimos o diagnóstico tardio passamos anos invisíveis, mas mesmo com o diagnóstico as pessoas ainda acham que não precisemos de suporte. Não vou entrar em detalhes, mas a minha vida virou de cabeça pra baixo recentemente e o autismo tem muito a ver com isso.

– Mas e quanto o caso de capacitismo que você acabou de contar?

Quanto a isso, capacitismo é considerado crime aqui no Brasil, não exatamente como racismo e homofobia, mas é. Eu poderia ter denunciado a pessoa por capacitismo, mas não fiz isso. Porque já tenho dor de cabeça suficiente na minha vida.

– Mas e as pessoas que sofrem de gordofobia, misoginia e capacitismo, dentre outros?

Assim como não denunciei a pessoa por capacitismo, não acho que valha a pena fazer uma denúncia por conta disso. Não importa se uma pessoa gorda foi chamada de gorda. O que importa é que já houve caso de pessoas gordas serem reprovadas em perícia pra concurso público por ser gorda, mesmo tendo saúde. Não importa se um homem fala que lugar de mulher é na cozinha. O que importa é que já houve mulher sendo demitida após o término da licença maternidade. Não importa se alguém fala para um autista que ele está se vitimizando. O que importa é que autistas são demitidos após ter crise no trabalho ou receberem o laudo médico de autismo.

O mundo está cheio de pessoas que nos insultam. As ações delas prejudicam muito mais do que as palavras. Se uma pessoa fala uma coisa que te ofendeu, você não é obrigado a ouvir. Foi o que fiz com essa pessoa capacitista: eu deixei de falar com ela.

Eu já fui chamado de misógino, homofóbico, transfóbico e vitimista, mas nada disso me define. Não é o que os outros dizem sobre mim que define quem sou.

Eu sei quem eu sou: sou cristão, autista e escritor. E ninguém vai tirar isso de mim… a não ser Deus.

Até a próxima.

Miguel Salvador
Enviado por Miguel Salvador em 14/07/2023
Código do texto: T7836879
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