O mundo das aparências na sociedade narcísica
Vivemos em uma era onde a busca pela aparência perfeita e o culto ao próprio eu estão cada vez mais presentes. A sociedade atual se tornou uma sociedade narcísica, onde o valor pessoal é medido pela imagem que projetamos para os outros. Nesse contexto, o mundo das aparências ganha uma relevância sem precedentes, moldando nossas interações sociais, nossas aspirações e até mesmo nossos padrões de sucesso.
Para compreender a dinâmica do mundo das aparências, é importante olhar para o passado e entender como chegamos a esse ponto. Ao longo da história, a valorização da aparência sempre esteve presente, porém, de formas diferentes. Nas sociedades antigas, por exemplo, a aparência física era um reflexo do status social, sendo a obesidade um sinal de riqueza e opulência, enquanto a magreza denotava pobreza. Já na Idade Média, a beleza estava associada à pureza e à virtude moral.
No entanto, com o avanço da mídia, da publicidade e da tecnologia, a sociedade passou por transformações significativas. A popularização dos meios de comunicação de massa trouxe consigo a idealização de corpos magros, rostos perfeitos e padrões de beleza inalcançáveis. A indústria da moda e da beleza aproveitou essa demanda, promovendo produtos e procedimentos que prometem alcançar esses ideais de forma rápida e fácil.
As redes sociais desempenham um papel fundamental na perpetuação desse mundo das aparências, pois conforme já afirmara Aristóteles "A beleza é a melhor carta de recomendação." Tenho a sensação de que incontáveis vezes isso se torna mais que uma frase de efeito, torna-se um fato. Basta vermos plataformas como "Instagram, Facebook e TikTok", as quais são repletas de filtros, retoques e poses elaboradas que contribuem para a construção de uma imagem irreal e inatingível. A busca incessante por curtidas, seguidores e aprovação virtual cria uma pressão psicológica e social que leva muitos indivíduos a uma busca desenfreada pela perfeição estética.
Os famosos e controversos versos de Vinícius de Moares afirmam o seguinte pensamento: “que me perdoem as feias, mas beleza é fundamental”. Isso está cada vez mais acentuado? Ao afirmar que “a beleza é fundamental”, estamos alimentando a ideia de que o valor de uma mulher está intrinsicamente ligado à sua aparência externa? Isso não apenas desconsideraria a diversidade de características físicas que existem, mas também diminuiria as mulheres que não se encaixam nos padrões estabelecidos pela sociedade como "belas"? A afirmação de Vinícius reforça a superficialidade e a objetificação do corpo feminino, transformando-o em um mero objeto de desejo?!
Pois, ao colocar a beleza como algo fundamental, estamos perpetuando a ideia de que as mulheres devem se esforçar constantemente para atingir esse ideal inatingível? Isso não resultaria em uma pressão enorme para que as mulheres se adequem aos padrões estéticos estabelecidos, levando a consequências negativas para a saúde física e mental destas?
No entanto, é importante destacar que essa busca incessante pela aparência perfeita tem consequências negativas tanto para o indivíduo quanto para a sociedade como um todo. Do ponto de vista psicológico, o culto às aparências alimenta a insegurança e a insatisfação pessoal, uma vez que raramente conseguimos atingir os padrões idealizados. O resultado é um aumento nos casos de distúrbios alimentares, transtornos de imagem corporal e problemas de autoestima.
A sociedade narcísica tende a priorizar a forma sobre o conteúdo, a imagem sobre a substância. Ideias e projetos de valor muitas vezes são deixados de lado em favor daqueles que melhor se encaixam nos padrões estéticos vigentes. O julgamento superficial e a valorização excessiva da aparência podem levar a uma sociedade vazia, na qual a busca por likes e seguidores se sobrepõe à busca por conhecimento, sabedoria e autenticidade.
Se fizéssemos mais questionamentos e análises importantes a nós mesmos, como fizera William Shakespeare ao escrever em uma de suas peças teatrais: "Ó beleza! Onde está tua verdade?", poderíamos promover mais debates interessantes e mudanças de paradigma em relação à importância da aparência na sociedade. Devemos lembrar que a beleza real não vive e brilha somente na estética dos corpos, mas também vive e reluz na autenticidade de cada um, nas experiências vividas, nas conquistas alcançadas, no conhecimento lapidado e nas emoções compartilhadas.