PORCOS DA CIDADE

Porcos da cidade

Eles habitam o espaço urbano, que logo se vê transformado em pocilga. Mas há uma diferença: os porcos chafurdam para contribuir com a limpeza. Os porcos da cidade agem para promover o caos, indiferentes às consequências do lixo que atiram cotidianamente nas ruas. Tem sido recorrente me deparar com “cidadãos” arremessando toda sorte de resíduos sólidos pelas janelas dos seus veículos – de carros simples a luxuosos. Mundiça não tem classe social, é ser desabitado da real moral e bons costumes de entender o espaço citadino com um ambiente coletivo que deve ser zelado.

E as montanhas de lixo (não é hipérbole) são ainda maiores em eventos festivos, como carnaval, São João, Ano-novo. O balanço do carnaval do RJ foi o recolhimento de quase 500 toneladas de lixo. O recente réveillon de João Pessoa teve 100 toneladas de resíduos diversos, entre plásticos, enlatados, orgânicos. A maior parte na faixa de areia das praias. Não há cestos suficientes?

Outro ponto que me indigna é quando vejo os próprios pais deseducando os filhos. Muitas vezes presenciei pais e mães retirando das mãos das crianças a embalagem de bombons e afins para lançar pela janela do automóvel. Por que não esperar encontrar uma lixeira? Por que não guardar nos bolsos, bolsas, até chegar às suas residências?

Também tem sido queixa frequente de diversos pessoenses a quantidade de fezes de animais, geralmente cachorros, espalhada pela orla. Toda essa sujeita, que poderia ser atenuada, propicia mal-estar a toda comunidade e contribui para a propagação de pragas, como ratos, pombos – já repararam quão numerosos estão? Eles são transmissores de doenças, como a leptospirose, razão pela qual alguns os denominam de ratos voadores, nomeação que não ficou restrita aos morcegos.

Não consigo deixar de me indignar com a má educação, com a irracionalidade de quem se julga racional, mas age bestialmente sem pensar nas consequências, mesmo que diariamente a mídia dissemine campanhas educativas contra a difusão de lixo no espaço urbano, que corre para rios, galerias pluviais, posteriormente causando a morte de diversos animais e contribuindo para enchentes.

E não bastassem os resíduos sólidos, somos obrigados a aguentar o líquido – a quantidade de urina despejada nas ruas pelos transeuntes incontinentes. A avenida Epitácio Pessoa exalava o odor. As ruas de Salvador e de tantas outras cidades também. Será que não havia banheiros químicos o bastante? Não dá para esperar? Custa tanto ser civilizado? É preciso vigiar e punir para que a educação venha à tona?

Mas, se por um lado, exalta-se o desrespeito dos suínos urbanos, trago à baila o trabalho dos agentes de limpeza que trabalharam arduamente, desde cedo, antes de efetivamente as festas acabarem, para manter, na medida do possível, o ambiente organizado, livre da imundície. Esses anônimos que muitos de nós os invisibilizamos, negando-lhes cumprimentos de bom-dia, boa-tarde, boa-noite.

Já passou da hora de cessarmos o discurso do todo-mundo-faz e fazer aquilo que deveria ser regra: guardar a sujeira onde é o seu lugar. Vai à praia? Leve seu saco de lixo. Está no carro? Reserve também um espaço adequado ao descartável. Não sejamos aquele que se encanta com a limpeza de outras cidades brasileiras ou de outros países, mas que diariamente não cumpre o óbvio. Coerência. Sejamos “Humanos, demasiadamente humanos”. Porcos na cidade só se forem suínos.

Leo Barbosa é professor, escritor e poeta.

(Texto publicado em A União em 24/02/2023)