Debates impossíveis
Qual é o objetivo principal dos candidatos que participam de um debate eleitoral? Com certeza é angariar votos para o pleito que se aproxima. E, em nome deste objetivo principal, talvez muitos outros, que deveriam em teoria serem eles os principais, são negligenciados. Estes teóricos objetivos principais seriam as verdadeiras propostas de governo, quais os dados que credenciam o candidato como comprometido com tais propostas, quais são os aliados e suas condições de concretizar, se eleitos, essas propostas. Ciente destas informações, o expectador do debate, um suposto cidadão desapaixonado em busca de bem conhecer as alternativas, deveria então ser capaz de, usando seu discernimento, fazer a escolha mais condizente com suas convicções.
Mas o debate em busca de votos vira um confronto de ataques e esquivas, um festival de falsas e irrealizáveis promessas, uma enxurrada de dados descontextualizados, parciais, maquiados e mesmo totalmente falsos, com o intuito de promover o candidato e depreciar os adversários. Muito pouco se acrescenta de verdadeiro conhecimento dos candidatos e de suas convicções e propostas para o país.
Debates em busca do voto desviam o foco para temas digressivos: corrupção, supostas façanhas econômicas, alegados fracassos administrativos, acusações contra os concorrentes. Destaca-se a corrupção. Há muito tempo, no Brasil, ela vem sendo utilizada como pretexto para golpes que derrubaram governos legítimos para entronizar tiranias. Há ainda quem se iluda que a humanidade não tenha um forte pendor para a corrupção, e que um bom governo é aquele que reconhece isso e busca coibi-la e minimizar seus efeitos? Corrupção sempre existiu, existe agora, e continuará existindo, enquanto nossa civilização não avançar ética e moralmente, sobretudo através da educação e da cultura, até um patamar em que a empatia e a solidariedade sobreponham-se à cupidez humana. E a corrupção existe em todo o mundo, mesmo nos países mais ricos, democráticos e modernos. Lá, eles combatem a corrupção investigando-a, com imparcialidade, desbaratando-a, punindo os corruptos. E não destruindo as empresas, os governos, as nações.
Infelizmente, o eleitor ainda é manipulado pela mídia que fabrica falsos consensos. Prefere estigmatizar pessoas, partidos, correntes ideológicas, do que esforçar-se em discernir entre o que realmente importa. O debate verdadeiro não é entre corrupto e não corrupto. O debate verdadeiro é entre capital e trabalho. É entre exploradores e explorados. É entre candidatos(as) humanizados, compassivos e idealistas, comprometidos com a coletividade, e candidatos(as) ávidos de poder, de riqueza, privilégios e impunidade.
Talvez este seja o fulcro da questão: quem é o eleitor, como ele influencia a natureza dos debates, a postura dos candidatos, e, enfim, o governo eleito? Dizem que a humanidade divide-se em três partes mais ou menos equivalentes: os egoístas que só almejam benefício próprio, os solidários que enxergam que a cooperação é imprescindível e os indiferentes. Há também quem diga que não existem indiferentes: o indiferente está, mesmo sem o querer ou o saber, ajudando o time dos egoístas.
Muitos pesquisadores e pensadores estão fazendo o alerta: a humanidade está vivendo um momento de profunda crise, ambiental, econômica, social, política, sanitária... Oxalá seja uma crise precursora de um novo arranjo, que nos assegure a sobrevivência da espécie, numa civilização mais harmônica. Oxalá nos debates, nas eleições, saibamos comportar-nos como cidadãos com discernimento e firmeza na escolha.