Encruzilhada

A vida, a existência, parece mesmo uma sucessão de encruzilhadas. Escolhas nem sempre lúcidas ou planejadas, mas que ditam o porvir. Não só aquelas decisões que vão definindo o caminho que trilhamos ao longo de nossa presença terrestre, mas também aquelas decisões que engendraram o terceiro planeta do sistema solar da galáxia espiral, ou ocasionaram a fortuita e precisa rota do meteorito que extinguiu os grandes répteis e iniciou a era dos mamíferos.

Não canso de render homenagem ao livro/filme Contato, ficção de autoria do astrônomo Carl Sagan. Uma preciosidade! A protagonista da trama, questionada sobre o que perguntaria a um interlocutor de uma civilização extraterrestre incontáveis séculos mais evoluída que a humanidade, responde: ─ “Perguntaria como fizeram para sobreviver à adolescência de sua civilização.” Ela perguntaria quais caminhos tinham escolhido nas muitas encruzilhadas que se nos apresentam, a todos nós, sobretudo na adolescência. Adolescência de um jovem indivíduo humano, ou de uma jovem civilização. Carl Sagan expõe no livro uma atual civilização terrestre atordoada sob o peso dos dilemas diante dos quais se encontra: a cupidez, o negacionismo, o oportunismo, o consumo predatório, a incúria...

Quais escolhas temos feito diante das encruzilhadas que têm aparecido em nosso caminho, enquanto indivíduos e enquanto sociedade? Entre o amor e o ódio? Entre a verdade e a mentira? Entre a essência e a aparência? Entre a autenticidade e a hipocrisia? Entre o sonho e a desesperança? Entre a luz e as trevas? Os seres humanos parecem estar capitulando perante a obstinação e a sofreguidão dos opressores e oportunistas. Parecemos povos escravizados, que desistiram da liberdade e da dignidade. Preferimos nos submeter e, alienados e acomodados, sobreviver, a combater a boa luta. Compactuamos com os que nos dominam, e que nos prometem que algum dia talvez possamos entrar no seleto grupo de privilegiados tiranos. Ou nos rendemos aos déspotas e truculentos, ou nos aliamos a eles. Exagero? Se não é assim para todos, é pelo menos para uma boa parte da população atual do mundo.

E as nações, cuja população escolhe seus mandatários? Hoje há uma nação hegemônica, empenhada em disseminar a cizânia e a guerra pelas outras nações do mundo. O velho axioma “dividir para dominar”. E as nações dominadas deixam-se cair nas tramas engendradas pela grande ave de rapina mundial. Guerreiam internamente em lutas fratricidas, ou batem-se com nações vizinhas e antes aliadas, por discórdias fomentadas desde a capital do império, por meio de sofisticada tecnologia de desinformação e intriga. Tem sido assim em muitos lugares do planeta, destacando-se Vietnã do Sul x Vietnã do Norte, Coréia do Sul x Coréia do Norte, Irã x Iraque, Rússia x Ucrânia, China x Taiwan, China x Japão...

Nas encruzilhadas que temos encontrado, somos induzidos a escolher o caminho que nos leva à submissão, à perpetuação do papel de escravos que labutam pela riqueza e bem estar dos dissimulados senhorios. É assim quando escolhemos em quem votamos. É assim quando escolhemos em quais causas acreditar. É assim quando escolhemos calar. É assim quando escolhemos obedecer aos comandos midiáticos para consumir, para ignorar, para desrespeitar, para depredar, para amedrontar-se, para odiar, para omitir-se...

É hora de, diante da encruzilhada, enfim nos perguntarmos qual caminho queremos seguir. E por que seguir esse caminho, ainda que ele nos pareça ser o mais difícil.