O surgimento de uma Gileade
As grandes buscas por direitos constitucionais são lutas quase que diárias para as pessoas que fazem parte de algum grupo minoritário, seja no Brasil ou em qualquer parte do mundo. Recentemente, a Suprema Corte dos EUA decidiu por suspender o entendimento de que o aborto seja um direito constitucional, o que acaba por jogar esse país em um lago de obscurantismo completo. Ressalta-se que esse entendimento não tornou a prática proibida, mas abre espaço para que os Estados decidam por sua proibição.
Na oportunidade do julgamento, alguns juízes deixaram claro em seu voto o interesse de se retroceder em outros direitos já conquistados, como o direito a contracepção e ao casamento/relação entre pessoas do mesmo sexo. Nossos corpos são materiais simbólicos de ações culturais, como afirma Richard Parker em “Corpo Educado” (2019), e para tanto é necessário olhar essas ações com olhares de política. É por meio de ações políticas que esses direitos foram conquistados, e é por esse mesmo meio que essas conquistas estão sendo retiradas.
A crise instalada em todo o mundo desde a grande pandemia de Covid-19, tem acumulado e garantido ações reacionárias de cunho político-ideológico que fazem que com ideais conservadores tomem conta e contornos de ações legais do Estado contra políticas e direitos já conquistados por diversos grupos minoritários como: feministas, negros, LGBTQIA+ etc. Essa ideia é confirmada na obra “O Brasil fora do armário” de Nogueira, Pereira e Toitio (2020).
O advogado e especialista de direito LGBT+ Paulo Ioti, um dos responsáveis pela ação que criminalizou a homotransfobia no Brasil, em uma análise feita em uma rede social, destacou que o que ocorreu nos EUA, tem chances mínimas de se acontecer em nossa Suprema Corte brasileira. Mas destaca que os olhares estejam muito bem abertos, pois para surgir uma Gileade é só um piscar de olhos.