PENA CASTIGO FISICO

PENA CASTIGO FISICO :

UM PEDAÇO DO BRASIL, ONDE A LEI CRIMINAL COMEÇAVA A PROCESSAR E PUNIR MARIANA- RIBEIRÃO DO CARMO

Publicado em 2014, tese denominado ROL DAS CULPAS, pela pós Graduada MARIA GABRIELA SOUZA DE OLIVEIRA, na Universidade Federal de Ouro Preto, Instituo de Ciências humanas e sociais, Departamento de História, sobre Crime e criminosos em Minas Gerais (1711 e 1745).

Em primeiro lugar apesar de onde Maria Gabriela de Souza de Oliviera, fez sua tese de Pós Graduação, no instituo de direitos Humanos e sociais na Universidade de Outro Preto, onde se comenta a algum tempo, teria havido cursos sobre o comunismo e como ser comunista.

Outrossim, sobre o crescimento após a constituição de 1988, que foi após a anistia da revolução esquerdista brasileira no período militar e onde os esquerdista exilados ou não puderam exercitar a política e conseguiram atingir o poder por mandatos eletivos, Constituição esta que visou em parte demarcação de terras indígenas e quilombolas, iniciando com estes direitos um conflito demarcatório que passados quase 40 anos, ainda não se definiu o equilíbrio, visto que a constituição deferiu áreas muito maior que as usadas pelo índios e quilombolas, e estes em razão da constituição entenderam que foi gerado direitos, sobre áreas muito a maior do que estes usavam, e então iniciou a revolução para a demarcação.

É certo que existe um movimento para que as demarcações sejam restringidas as áreas que indígenas e quilombolas usavam ao tempo da constituição de 1988, até por que a demarcação na forma da constituição invadem ocupação por não indígenas ou quilombolas, e até mesmo por estes em forma de propriedade posse, com enormes plantação, e muitas benfeitorias construídas, com grande valor nestas áreas ocupadas, e a demarcação implicaria e espoliar os ocupantes, muitos a mais de 100 anos nos referidos territórios com riquezas geradas por gerações e com direitos eventual de usucapião para regularização.

É certo que que a mestranda pós graduada em sua tese e sua homenagem se referiu a nego, companheiro, bem como ao neguinho filho, de forma carinhosa, pelos prejuízos do tempo de convivência enquanto desenvolvia este belo trabalho, contudo em nenhum momento foi racista nem a favor dos afrodescendentes, nem racismo transversos.

Achei muito brasileira, como é, que reconhece como abaixo da constituição em vigor de 1988, apesar dos direitos criados de demarcação indígenas e quilombola, que fomentou a meu ver o racismo transverso para justificar os direitos dos afrodescendentes quilombolas que estão em posse de partes do território nacional, mas são na verdade verdadeiros brasileiros, que tem direito por posse usucapione, contudo não enveredou sua tese nestes assuntos de racismo, nem vitimando em qualquer momento os afrodescendentes de forma a criar rivalidades entre nós todos que somos brasileiros, antes de tudo. Parabéns por ser brasileira antes de tudo.

Quanto ao apurado e suas pesquisas, cita qualidades de pessoas de forma discriminatória como era feito na época da apuração, ou seja, nos idos de 1711/1740, um período de transição, embora falem em minas setecentistas, em Minas gerais, como um estado mineiro atual, precisamos temporizar que nos inícios destes períodos ainda não era Minas gerais.

As descobertas das minas de outro preto, foi nos idos de 1698, pelo Bandeirante.

Os primeiros a encontrarem o ouro e as pedras preciosas foram os desbravadores paulistas que entraram para a história como bandeirantes, mais especificamente em 1698, quando Antônio Dias de Oliveira descobriu as minas de Ouro Preto. Como a notícia se espalhou, muitas pessoas foram para a região na busca de ouro (Guerra dos Emboabas Por Karine Ferreira Brito Graduada em História (UFRJ, 2016)

Mariana foi, então, a primeira capital de Minas Gerais, que depois passou a Ouro Preto e, só em 1897 é que a capital foi, finalmente, transferida para Belo Horizonte, construída estrategicamente para este fim.

Fundada em 1696 como Arraial de Nossa Senhora do Carmo, passou à Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo em 1711, e foi elevada à cidade em 1745, quando passou a se chamar Mariana em homenagem à rainha Maria Ana D’Áustria, esposa de D. João V, o rei de Portugal que foi responsável por essa transição.

Outras cidades também foram capitais de Minas Gerais. Vila Rica (1720–1821), atual Ouro Preto, depois á como — sede da Capitania de Minas Gerais. Ouro Preto (1821–1889) — sede da Província de Minas Gerais. Ouro Preto (1889–1897) — sede do estado de Minas Gerais. Belo Horizonte (1897–atual) — sede do estado de Minas Gerais; entre 1897 e 1901 denominada Cidade de Minas.

É bom observar então que a tese de pós graduação em história foi tão especifica no tema, que não tratou que região do Brasil pertencia, não entrando em detalhas que até 1720, Minas gerais não existia, pertencia a Provincia de São Vicente, embora a região descoberta em 1698 ou 1696, foi invadida por forasteiro ou emboabas (homens de botas), que foram expulsos na chamada ( GUERRA DOS EMBOABAS 1707/1709), Borba Gato, líder dos paulistas, decidiu expulsar os emboabas da região, que haviam se apoderado de suas terras e minas. Mas como os paulistas eram minoria, acabaram sendo expulsos por Viana, indo na direção de Goiás e Mato Grosso, descobrindo novas jazidas. Viana acabou sendo expulso de Minas pelo governador do Rio de Janeiro após o massacre feito pelos emboabas contra os paulistas num lugar que ficou conhecido como Capão da Traição. As consequências dessa guerra, além das mortes e do massacre que ocorreu, foi que, no ano de 1709, a capitania de São Vicente chegou ao fim e, assim, foi criada a capitania de São Paulo e Minas de Ouro que, em 1720, acabou sendo dividida e tornando-se a capitania de São Paulo e a capitania de Minas Gerais.

A tese comentada, relata de 1711/1740, portanto, neste período a região passou pela administração da Capitania de São Vicente, pela Guerra dos Emboabas, onde paulistas tentava expulsar os forasteiros, pelo pela expulsão dos Paulistas, pelo Governo do Rio de Janeiro, e depois em 1720, pelo desmembramento de Minas, se tornando capitania de Minas gerais.

E não fez a Pós Graduanda citação de quem administrava a região; mas foi muita narrativa de forma a não comprometer os fatos apurados; como dito não dando impressões pessoais sobre os fatos, nem partindo para o racismo, nem protegendo brancos, índios, negros, mulatos.

Foi clara em seus conceitos, em esclarecer principalmente em sua conclusão, que todas as pessoas que viviam na região foram autores e vitimas de crimes, e que o livro “ROL DOS CULPADOS”, tinha classificação da origem, bem como da casta, e cor das pessoas envolvidas, como era comum naquela época, sem tecer comentários pessoais do que achava disto, imposto racismo ou não.

O que me levou a tal leitura, foi “O CASTIGO”, dos condenados (pronunciados/sentenciados como culpados), que poderia ser físico, como acoite em praça publica como pena, contudo não consegui confirmar tal aplicação de pena, conseguindo, no entanto, se é que entendi direito que nos interrogatórios/investigação era permitido até 03 (três) torturas, com horas marcadas para influenciar a confissão.

Tendo eu entendido que estas torturas eram físicas, logicamente que com horas marcadas, também eram psicológicas.

Interessante que a classificação da população onde a minoria era branca, depois vinha os “forros (pretos ou mulatos libertos)”, e finalmente os pretos escravos que eram a maioria.

Deu a entender a Autora, que mulatos era preferido a usar para mestiços criminosos, cabras eram mestiços de mais de uma cor ou raça, e carijós eram os índios escravos.

A categoria NC, “não consta”, exigiu cuidados. Entendemos que nela estão agrupadas as condições de forro, coartado, liberto e aqueles que nunca passaram pela escravidão. Quanto ao campo “qualidade”, o “não consta” deve agrupar mulatos, pardos, crioulos, bastardos, cabras, índios e carijós.

Algumas definições ou crimes, além do sistema criminal da época me chamou a atenção:

O Crime de adultério, bem como o crime de defloramento eram de ação pública, ou seja, não dependiam de representação cabia a sistema de justiça apurar independente de representação, sendo que estes crimes foram amenizados com o tempo, tendo o adultério virado contravenção penal no CP de 1942, e desapareceu da legislação atual, e o de defloramento não me lembro haja citação do mesmo.

A respeito ainda do crime de adultério, embora de ação pública, poderia ser perdoado pela mulher vitima do adultério.

Outra divisão interessante era (querela) para reclamação individual, e (devassa) para crime com mais de uma pessoa e que era apurado pelo sistema judicial.

O próprio nome da tese usando o nome do livro (ROL DOS CULPADOS), também atualmente é diferente, naquela época toda e qualquer ato delituoso ia para o rol dos culpados, se obrigando no caso a apuração no prazo de 8 dia, 20 dias e pronuncia ou sentença no prazo de 30 dias, sempre levando em consideração que a punição rápida, serve para educação.

É certo que atualmente só vai para o ROL DOS CULPADOS os condenados, com trânsito em julgado (quando não existe mais recursos), até o trânsito em julgado o réu é considerado inocente.

Outra coisa interessante, é que nos crimes de moral, como adultério, a igreja também poderia julgar, independente do sistema judiciário, valendo o julgamento eclesiástico. Embora isto não é muita novidade até hoje, pois até 1916 (nascimento do código civil brasileiro) a igreja era registro civil e tabelião e até registro de imóvel neste país, mais ou menos assim.

Algumas definições também me chamaram a atenção:

Como acordo verbal entre as autoridades e o povo, tendo inclusive uma sentença de absolve o motim de Vila Rica, entendendo que estava implícito um acordo.

Segue abaixo trecho da tese citada da Autora que definem muitas coisas dos acontecimentos, crimes e penas da época. 20.03.2022.

O defloramento é entendido como um atentado contra a moral e enquadrado como crime de violência, embora ofenda também a família. Assim como o adultério (que não foi localizado nominalmente, mas pode estar mascarado nas querelas), crimes que ofendiam a família poderiam ser entendidos como de foro misto, “estando assim agrupado a crimes contra a ordem religiosa, o que possibilitava serem julgados tanto por tribunais civis quanto eclesiásticos

Justiça: É uma virtude, que nos faz dar a Deus, e aos outros homens aquilo que lhes é devido a cada um. É o fundamento do trono e sem ela não há povo que possa subsistir.29

Moraes e Silva, por sua vez, é mais sucinto e entende o dolo como “engano, fraude, simulação” 75. Por fim, Sousa, na mesma linha de definição de Bluteau, também apresenta o dolo como bom e mal: 71BLUTEAU, Raphael. op. cit. p. 635. 72SILVA, Antonio Moraes. op. cit. p. 502. 73SOUSA, Joaquim José Caetano Pereira e. Esboço de hum dicionário jurídico... p. 308. Grifo nosso. 74BLUTEAU, Raphael. op. cit. p. 282. 75SILVA, Antonio Moraes. op. cit. p. 636. 32 é a cavilação de que alguém serve para enganar a outrem. Distingue-se em Direito dolo mau e dolo bom. Consiste o dolo bom em certa destreza, ou indústria pela qual se usa de dissimulação, não para fazer o mal a alguém, mas para se procurar a própria vantagem. O dolo é sempre punível.

Corpo de delito O corpo de delito é a “couceira do processo.”80 Somente ele dá fundamento, através das informações que fornece, para o andamento do processo. Nos casos em que havia feridas, o juiz enviava o cirurgião e o escrivão, os quais assinavam o exame e podiam incluí-lo tanto nas querelas quanto nas devassas.8

NÃO PODIAM SER PARTE ATIVA, PROMOVER QUERELA, OU PETICIONAR : Os furiosos, impúberes (entre 17 e 25 anos), os filhos e mulher sem autoridade do pai e marido estavam proibidos de pedir querela particular; já os oficiais de justiça, os inimigos capitais, os clérigos, as mulheres, os condenados a degredo perpétuo, os infames, os sócios no crime e os condenados em causas cíveis ou crime enquanto a sentença ainda não tivesse sido executada achavam-se proibidos de pedir querela pública. Estas proibições, porém, deixavam de existir quando os crimes fossem de lesamajestade, falsificações de moeda, escrituras e testemunho falso. cometer, porque nestes cada povo pode querelar, não sendo inimigo. 1

Pronúncia É a sentença que o juiz forma como resultado de uma devassa ou querela, declarando o réu suspeito do delito e incluindo-o no número dos culpados. Sousa cita o assento da Relação do Porto de 9 de Março de 1758, no qual se declarou que as pronúncias feitas pelos corregedores do crime, ainda mesmo por acordão, poderiam ser agravadas.117

Citação A citação era não só necessária nos processos sumários e ordinários, mas também em todos os atos jurídicos que podiam trazer prejuízo a alguma das partes. Se ela não fosse realizada, o processo tornava-se nulo. A citação era um direito de defesa da parte chamada a juízo, já que ninguém podia ser condenado sem antes ser ouvido. 137 De acordo com Alexandre Caetano Gomes, a citação era o que fundamentava toda ordem judicial; sem ela não se podia tomar conhecimento de nenhuma causa, devendo, portanto, ser feita em todas as causas cíveis, crimes, ordinárias e sumárias, sempre com o mandato do juiz. Era o momento em que o réu era chamado a Juízo. Havia duas formas de se fazer a citação. A primeira era a pública, feita através dos editos: “esta citação deve preceder a justificação da ausência ou parte incerta. Quando o réu está preso, tendo sido antes da culpa formada ou dentro de três meses sucessivos à Pronúncia”. A segunda era a particular, feita à própria pessoa. 138 Quando o réu não era localizado, o juiz o citava na figura de “um dos seus familiares ou vizinhos mais chegados.” 139

D. Carta de Perdão “Se algum houver carta de perdão de alguma morte de homem em que se diga ser culpado e nela for posta esta cláusula: Se outras partes aí não há a que a acusação da dita morte pertença etc.”172 - esta era a declaração necessária para que o culpado obtivesse o perdão pelo crime cometido. Porém, para isso, o réu devia fazer a diligência dos parentes do morto até o quarto grau (consanguíneos ou por afinidade) para conseguir efetividade do documento e, caso algum parente incluído na diligência, dentro do grau de parentesco estabelecido, aparecesse e quisesse acusar o réu, a carta perderia sua eficácia

Tormentos A tortura era justificada pela necessidade da punição. Surgiu no século XIII e se manteve até o século XVIII, apesar das muitas críticas. Desde o século XVI, opuseram se a ela as vozes de Montaingne, Voltaire, Montesquieu e Beccaria. 208Era de arbítrio do juiz o momento em que o preso devia ser submetido aos tormentos. Porém, para isso, deveria haver provas suficientes, uma vez que não bastavam muitos indícios leves ou somente um indício grande e evidente para a prática da tortura

O Livro V das Ordenações enumera três aspectos relativos à utilização do tormento. O primeiro dizia respeito aos casos em que o acusado fosse submetido ao tormento e negasse a culpa. Três caminhos levariam à repetição do procedimento: antes de tudo, por mais que a testemunha negasse todos os indícios, o julgador não deveria deixar de crer que o fez; em segundo, depois de submetido ao tormento uma vez e outros indícios apareceram e, em terceiro, a confissão acontece em meio aos tormentos

Prisão A prisão só poderia ser ordenada pelo juiz quando houvesse culpa formada e depois de perguntada as testemunhas. Formada a querela ou devassa, era feita a pronunciação à prisão. Só se podia prender sem culpa formada nos casos de delitos que merecessem pena de morte natural (e morte civil, como destacado por Pereira e Sousa), de crimes confessos por declaração e daqueles em que houvesse flagrante, como nos de ferimento, pois a prisão “traz consigo dano irreparável.”

No sentenciar os crimes deve-se inclinar mais à clemência, do que a severidade, porque vale mais pender para a misericórdia do que para o rigor merecendo o caso.221 Depois das ultimas razões das partes, o juiz sentenciava e julgava. Caso houvesse uma procuração que não fosse suficiente, ele podia mandar que se juntassem novas. “Sem paixão, ódio, ou amor, sentenciará não atendo ao poder ou pobreza das partes, porque o Juiz que sentencia com amor ou ódio está obrigado à restituição porque faz a causa sua, e por ela fica réu da Divina Justiça, sendo que deve julgar mais pela equidade que pelo rigor dela. E peca mortalmente, se sentenciar contra oque entender e prova os autos, pois falta a verdade e por ela sabida deve julgar, sem embargo dos erros do processado.” 222 O juiz devia aproveitar-se das confissões, provas e inquirição das testemunhas, além de avaliar as réplicas e tréplicas, como indicado por Cabral.

ferimento simples quando há perdão da parte, caso de adultério da mulher perdoando o marido, o caso de defloração tanto que a parte perdoa,; crimes de pesca ou caça nos meses defesos. O caso de furto de fruta, de vinhas, ou pomares ou de qualquer coisa sendo furto simples e módico. Em causa de injúria, exceto se é qualificada com bofetada ou açoite em mulher, porque sendo estes delitos declarados casos de devassa pela Lei de 15 de janeiro de 1652 e por isso por isso constituídos entre os crimes públicos, se perseguem pela Justiça ainda que a parte perdoe ou desista ou quando a injúria é feita a pessoa nobre e o injuriado desiste ou perdoa depois das inquirições.228

Execução A pena, diz Filangieri, é antes um exemplo para o futuro que uma vingança do passado. A vingança é uma paixão de que as Leis são isentas. Elas punem sem ódio e sem rancor. Se elas pudessem inspirar o mesmo horror ao delito, a mesma segurança à sociedade poupando o delinquente, o deixariam voluntariamente vítima dos seus remorsos, em vez de condenálos à infelicidade e à morte.235

Quando havia pena era de morte, ela devia acontecer dentro de três dias; as demais penas tinham de ocorrer no prazo de vinte e quatro horas. Todas as penas corporais deviam ser executadas em público e as condenações pecuniárias, por meio de apreensão dos bens posteriormente arrematados. Citando Beccaria, Pereira e Sousa discute sobre os castigos impostos aos condenados. quanto mais pronto for o castigo, quanto ele seguir de mais perto o crime, ele será tanto mais justo e útil; justo, porque então o criminoso não sofrerá os cruéis tormentos da incerteza, tormentos supérfluos e cujo horror aumenta a respeito dela emrazão da força da sua imaginação, e do sentimento da sua própria fraqueza, pois sendo já uma pena a perda da liberdade ela não deve preceder a execução da sentença senão tanto quanto a necessidade o exige; e útil porque quanto menos tempo tem entre a ação e o castigo que lhe corresponde, mais se [unem] no espírito de maneira que logo insensivelmente se considera o castigo como efeito certo e inseparável da sua causa. 2

Os valores alcançados através da análise do livro de rol de culpados e do “Inventário de devassas” são, portanto, próximos, aspecto que confere certa descumprimento de acordos não-escritos que se estabeleceram entre a população e as autoridades, relativos aos limites de cobrança de impostos, à destruição de terras, à garantia de abastecimento dos núcleos urbanos, enfim, descumprimento de acordos que geravam expectativas de procedimentos justos por parte da Coroa e em sintonia com os privilégios pessoais internalizados pela população. As revoltas derivadas do aumento de impostos, estabelecimento de contratos de gêneros de primeira necessidade, abuso de poder pelas autoridades, etc. tomaram a forma de motins marcados pela tradição, calcados na suposição de que não estavam sendo respeitados os privilégios que os seus atores acreditavam ter.29

A tensão do movimento aumentou e a Câmara de Vila Rica solicitou à Vila do Carmo que tomasse providências para conter o tumulto. Entretanto, os oficiais da Câmara de Vila do Carmo reconheciam a legitimidade da atitude dos amotinados, baseada nos costumes, e solicitaram à Câmara de Vila Rica interceder junto ao Ouvidor Geral para que fosse concedido perdão aos sublevados, devolvidos os bens sequestrados e as terras em que lavravam. 293 Os bens e as terras foram devolvidos aos rebelados, sendo todos perdoados a pedido do governador. Porém, “como castigo exemplar, os cabeças foram presos e condenados a degredo para Benguela e outros a degredos mais suaves.” 294 Infelizmente, nas cotas dos culpados deste levante não consta nenhuma informação da situação judicial em que se encontravam; há somente a informação sobre um deles ser escravo e oriundo da Mina.

É desta forma que Antonil registrou o que seus olhos viram nos primeiros anos do Setecentos das Minas. Acredita-se que, já na primeira metade do século XVIII, havia um contingente expressivo das mais variadas qualidades e condições de indivíduos. O período mais intenso de urbanização, no século XVIII, se deu entre 1711 e 1718, período da criação da Vila do Ribeirão do Carmo (1711), de Vila Rica (1711) e da Vila 303 Idem. p. 268. 304 SOUZA, Laura de Melo. Desclassificados do ouro. op. cit. p. 139. 305 SOUZA, Laura de Melo. Desclassificados do ouro. op. cit. p. 140 citando o “Regimento ou instrução que trouxe o governador Marinho de Mendonça de Pina e de Proença”. 306 ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; 1997. p. 167. 110 Real do Sabará (1711), da Vila de São João Del Rei (1713), da Vila Nova da Rainha (1714), da Vila do Pitangui (1715) e da Vila de São José del Rey (1718). O governador dom Baltazar da Silveira (1713-1717), com o intuito de exercer maior controle nas minas, divide a região mineradora em três comarcas: a de Vila Rica, a do Rio das Velhas e a do Rio das Mortes. 307 A Comarca de Vila Rica era, por sua vez, dividida em dois termos, Vila Rica e Ribeirão do Carmo, contendo ainda arraiais e distritos subordinados. 308 Faziam parte do termo do Carmo, na primeira metade do século XVIII, as seguintes localidades: Quadro II: Freguesias do termo de Vila de Ribeirão do Carmo e arraiais subordinados até 1750 Antônio Pereira ----------- Camargos Bento Rodrigues Catas Altas do Mato Dentro Morro da Água Quente Furquim Gualaxo do Norte, Conceição do Turvo (Senador Firmino), Arraial da Casca (Abre Campo), São Gonçalo do Ubá (Acaiaca), São José da Barra (Barra Longa) Guarapiranga (Piranga) Barra do Bacalhau (Guaraciaba), N. Sra. De Oliveira (Senhora de Oliveira), São José do Xopotó (Alto Rio Doce), São Caetano do Xopotó (Cipotânea), Calambau (Presidente Bernardes) Inficionado (Santa Rita Durão) Fazenda do Rio do Peixe e Sem Peixe São Caetano (Monsenhor Horta) Fazenda da Boa Vista (Cláudio Manoel) São Sebastião (Bandeirantes) ---------- Sumidouro (Padre Viegas) Pinheiro (Pinheiros Altos) Fonte: Cláudia Maria das Graças Chaves, Maria do Carmo Pires, Sônia Maria de Magalhães (orgs). Casa de Vereança de Mariana: 300 anos de história da Câmara Municipal. Ouro Preto, MG: UFOP, 2008, p.26. 307 PIRES, Maria do Carmo. O termo de Vila d

Os forros eram considerados um problema. Na década de 1730, a Coroa já questionava o governador de Minas a respeito das alforrias. Os libertos foram alvo da constante vigília da Metrópole, assim como os escravos. Assombrados pelo medo de uma revolta escrava, as autoridades emitiam ordens e bandos na tentativa de controlar quilombos 309 Além da pobreza, o escravismo e a mestiçagem faziam com que as Minas apresentassem um quadro bem mais complexo, salienta Laura de Melo e Souza. 310

Begard calcula, a partir dos dados da primeira matrícula de capitação elaborada em 1735, que havia em Minas 96.541 escravos. Mariana tinha a maior número, 26.892, correspondendo a 27,9% do total da Capitania. No que corresponde ao recorte temporal deste trabalho, a população escrava manteve e atingiu seu ápice em 1738 (26.532) e 1739 (26.545), começando a declinar a partir de 1740, quando atingiu a cifra de 20.539. As crianças não eram calculadas pela capitação, portanto, os dados estariam invariavelmente incompletos.313 Em relação às outras condições e qualidades, foram utilizados como base de comparação os dados sobre designação de cor, sexo e condição citados por Douglas Cole Libby no artigo já citado. Tabela 5: População de Minas Gerais, por designação de cor, sexo e condição legal Livres Ano Cor Homens % Mulheres % Total % Brancos 35917 54,7 29747 45,3 65664 100 1786 Pardos 38808 48,3 41501 51,7 80309 79,8 Pretos 19441 45,5 23298 54,5 42739 21,8 Total 95111 49,9 94546 50,1 188712 52,0 Escravos Ano Cor Homens % Mulheres % Total % Brancos - - - - - - 1786 Pardos 9879 48,5 10497 51,5 20376 20,2 Pretos 106412 69,2 47347 30,8 153759 78,2 Total 116292 66,8 57844 33,2 174135 48,0 Fonte: LIBBY, Douglas Cole. As populações escravas das Minas Setecentistas: um balanço preliminar. In: História de Minas Gerais – As Minas Setecentistas vol.1. Belo Horizonte: Autêntica: Companhia do Tempo, 2007. p. 407. Contudo, a superioridade de pessoas de cor seria característica durante toda a centúria. A população referente ao ano de 1776 acusa a existência de 70.769 brancos, 82 mil pardos e 167 mil pretos, somando 319.769 indivíduos. Convertidos em porcentagens, estes números significam 22,09% de brancos, 25.67% de pardos e 52,22% de negros, ou seja, uma população onde os mestiços e os negros somavam 77,9%. A massa branca era Tempo, 2007. p. 407. ; BERGARD, Laird W. Escravidão e história econômica: demográfica de Minas Gerais, 1720 – 1888. Bauru, SP: EDUSC, 2004. 313 Para mais detalhes sobre a população escrava ver BERGARD, Laird W. Escravidão e história econômica: op. cit. p. 149. 113 comparativamente diminuta, os escravos somando 27.909 em 1716 e 35.094 indivíduos em 1718. Entre 1735 e 1749, a população de cor permaneceria estável, declinando ligeiramente a partir de 1740. Em 1742 a escravaria representava pouco mais de 70% num total de 266.868 habitantes. 314 É sabido que a camada dos mestiços só cresceu ao longo do XVIII, assim como a dos alforriados. Em 1739, segundo Laura de Melo e Souza, “correspondiam a 1,2% do total da escravaria, aumentando para 35% em 1786 e atingindo 41% em 1808. O forro engrossaria frequentemente as fileiras dos desclassificados sociais.” 315 Segundo Marco Antonio Silveira,

Contudo, a superioridade de pessoas de cor seria característica durante toda a centúria. A população referente ao ano de 1776 acusa a existência de 70.769 brancos, 82 mil pardos e 167 mil pretos, somando 319.769 indivíduos. Convertidos em porcentagens, estes números significam 22,09% de brancos, 25.67% de pardos e 52,22% de negros, ou seja, uma população onde os mestiços e os negros somavam 77,9%. A massa branca era Tempo, 2007. p. 407. ; BERGARD, Laird W. Escravidão e história econômica: demográfica de Minas Gerais, 1720 – 1888. Bauru, SP: EDUSC, 2004. 313 Para mais detalhes sobre a população escrava ver BERGARD, Laird W. Escravidão e história econômica: op. cit. p. 149. 113 comparativamente diminuta, os escravos somando 27.909 em 1716 e 35.094 indivíduos em 1718. Entre 1735 e 1749, a população de cor permaneceria estável, declinando ligeiramente a partir de 1740. Em 1742 a escravaria representava pouco mais de 70% num total de 266.868 habitantes. 314 É sabido que a camada dos mestiços só cresceu ao longo do XVIII, assim como a dos alforriados. Em 1739, segundo Laura de Melo e Souza, “correspondiam a 1,2% do total da escravaria, aumentando para 35% em 1786 e atingindo 41% em 1808. O forro engrossaria frequentemente as fileiras dos desclassificados sociais.” 315 Segundo Marco Antonio Silveira

Percebe-se, num primeiro momento, que parte expressiva dos crimes envolvem conflitos interpessoais capazes de causar a morte dos envolvidos. Quando somados os casos das três categorias de culpados, “escravo”, “forro” e “NC”, são encontrados 206 casos de morte e 62 exclusivamente de ferimentos, havendo mais 18 em que esse último 119 tipo de delito aparece conjugado com outros (assuada, furtos, pancadas etc.). Nesse sentido, os culpados por causarem a morte correspondem a 34,3% do total e os acusados de provocarem ferimentos atingem 13,3%. Os dois tipos, quando somados, alcançam a cifra de 47,7% dos culpados, quase a metade do total. Há, no entanto, diferença quanto ao padrão de violência entre os grupos sociais. Cativos foram responsáveis por 45,6% das mortes, enquanto livres e libertos arcaram com 54,3% delas. Entre os escravos, 94 foram acusados de matar, 44 deles atacando pessoas da mesma condição (46,8%) e 50, livres ou libertos (53,2%). Os culpados de causar a morte dos que não eram cativos, por sua vez, chegaram a 112, 29 atacando escravos (25,9%) e 83, livres e libertos (74,1%). Em relação aos ferimentos, cativos acusados de causá-los alcançam 54,8% do total referente a esse tipo de delito, nove deles envolvendo-se em casos contra indivíduos da mesma condição (26,5%) e 25, contra livres e libertos (73,5%). Os causadores de ferimentos que não eram escravos foram responsáveis por 45,2% dos casos, quatro deles tendo atacado escravos (8,7%) e 42, livres e libertos (91,3%). Em linhas gerais, livres e libertos mataram um pouco mais que escravos, enquanto estes feriram um pouco mais que aqueles. A Tabela 9 sintetiza essas informações. Tabela 9: Culpados e vítimas em mortes e ferimentos Tipo Culpado Condição da vítima Total Morte --- Escravo % L e L % Total % Escravo 44 46,8 50 53,2 94 45,6 L e L 29 25,9% 83 74,1 112 54,3 Total 73 35,4 133 64,6 206 100,0 Ferimento Escravo 9 26,5 25 73,5 34 54,8 L e L 4 8,7 42 91,3 46 45,2 Total 13 16,2 67 83,8 80 100,0 Fonte: Rol dos culpados – AHCS. Le L: Livres e libertos. Nos conflitos interpessoais indicados, escravos foram vítimas de 73 (84,9%) e 13 (15,1%) indivíduos de condição variada acusados de causar-lhes, respectivamente, morte e ferimento. Livres e libertos, por seu turno, foram vítimas de morte não mãos de 133 pessoas (66,5%) e de ferimento nas de 67 (33,5%). Esses dados permitem que sejam sugeridas algumas hipóteses. A primeira delas é que, quando envolvidos em conflitos interpessoais, os resultados eram geralmente fatais tanto para escravos quanto para livres e libertos, mas aqueles pagavam o preço da morte bem mais do que estes. Os algozes dos cativos eram de condições variadas, com certa predominância para os 120 escravos. No caso de livres e libertos, os resultados dos conflitos com indivíduos da mesma condição tendiam a ser mais violentos do que quando os opositores eram escravos. Assim, pode-se sugerir que, sendo os envolvidos da mesma condição, o conflito interpessoal tinha maior possibilidade de terminar em morte – devendo-se, no entanto, ressaltar que os dados não permitem a desagregação de livres e libertos em duas categorias distintas. Uma segunda hipótese diz respeito ao fato de que, nesses mesmos tipos de conflito, não havia uma preferência por parte das autoridades no combate a crimes envolvendo escravos. A quantidade de culpados livres e libertos responsáveis pela morte de indivíduos da mesma condição (83) é quase o dobro da quantidade de culpados escravos que foram acusados de matar escravos (44). Em relação aos ferimentos, a distância aumenta ainda mais: de nove para 42. Essas hipóteses se forem válidas, tendem a explicar em parte por que as autoridades se preocupavam tanto com forros e mestiços e com o que classificavam como sendo vadiagem: enquanto os escravos estavam em alguma medida sob controle de seus senhores, os que não eram cativos podiam gozar de maior licença. A esse respeito, chama a atenção a ocorrência de apenas três casos em que cativos atacaram seus próprios senhores. Jacinto Pinheiro, morador na Passagem, foi morto por dois escravos seus em 1734.327 Um dos culpados, o cativo Miguel de nação Mina, foi preso na cadeia de Ribeirão do Carmo e seguiu para a cadeia de Vila Rica para ser julgado pela Junta da Justiça. Não há como saber o que sucedeu depois. 328 Destaque-se, por fim, que a violência constituiu-se como uma linguagem que se valia do homicídio e do ferimento na dinâmica dos conflitos. Outro tipo de delito bastante importante encontrado n

Pelo rol também foi possível contar histórias. Carijós, escravos, forros e homens livres também passaram pela justiça. Mortes, ferimentos, furtos, assuadas, levantes. Açoites aplicados a oficiais de justiça e a mulheres forras, embora fossem castigo destinado a escravos. Homens e mulheres que morreram na cadeia, que fugiram da Justiça. Outros degredados e mais alguns condenados à Junta da Justiça de Vila Rica. Alguns com carta de seguro, outros para os quais sequer há registro dos trâmites judiciais.

estreladamantiqueira
Enviado por estreladamantiqueira em 20/03/2022
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