Capitalismo é só um rótulo
Diz um artigo sobre a COP26 que o problema é o capitalismo, e não o clima. Essa acertada afirmação nos faz refletir sobre o significado e as consequências do que se costuma abrigar sob o rótulo de “capitalismo”. Porque, afinal, é ele que, entre outras nefastas sequelas, ameaça o clima e a habitabilidade da Terra.
“Capitalismo” traduz o arranjo econômico predominante no mundo atual, acentuado principalmente a partir do final do século XVIII, com a Revolução Industrial. Na verdade, o capitalismo pressupõe a propriedade privada dos meios de produção, mas estes na prática usualmente são em parte controlados pelo poder público. Daí um capitalismo híbrido, não puro. Como nunca foram puras as experiências socialistas, comunistas e anarquistas, no que diz respeito a suas faces econômicas.
Mas é no capitalismo que se acentua uma característica que já foi denominada “o espírito animal” dos empreendedores: a ambição desmesurada daqueles que alcançam e detêm o controle dos meios de produção. A sofreguidão do lucro e do poder a qualquer custo destrói qualquer princípio ético, solidário, cristão. De um lado os capitalistas empanturram-se com fortunas fabulosas que escondem em contas secretas em paraísos fiscais, de outro pagam salários mesquinhos e mantêm um “exército de reserva” de desempregados, ávidos de trocar sua condição miserável pelos empregos dos trabalhadores aviltados que ousem reivindicar remuneração mais justa, e que, por essa ousadia, são demitidos e substituídos.
A ganância nutrida pelo capitalismo não é só desumana, promotora da desigualdade e exclusão social. Ela é também predatória. Assim como não vê as trágicas consequências sociais de seu afã, também não vê os desastrosos efeitos ambientais. A ganância insaciável cega o discernimento. É uma obsessão tão insensata que faz duvidar que sejamos de fato o Homo sapiens. Falta-nos o elementar de sapiência para compreendermos o que é essencial para nossa sobrevivência no planeta. Degradamos não só o clima, mas também o ar, as águas potáveis, o mar, os solos férteis, a camada de ozônio, as florestas, empobrecemos a biodiversidade, criamos condições para as pandemias de novos vírus... E nos destroçamos em conflitos e guerras selvagens.
A cobiça doentia é voraz. Nunca se satisfaz. Cria tanto as imensas periferias pobres, nos arrabaldes das grandes cidades e nos países subdesenvolvidos, como as promíscuas pocilgas de miséria, que geram os novos vírus, e os desertos em regiões antes férteis. O ser humano, enfeitiçado pela ganância, desumaniza-se. A competição, a necessidade de ganho e de poder, supera a cooperação. Não consegue enxergar o alerta embutido na milenar parábola do Rei Midas, que transforma em ouro tudo que toca, e assim acaba por não ter mais com que se alimentar.
Capitalismo é o rótulo, o sistema econômico que incita à ganância, esse traço de caráter herdado dos nossos ancestrais répteis do Jurássico, quando a competição era essencial para a sobrevivência da espécie. Esse atávico traço manifesta-se em tudo que fazemos. Hoje, a compreensão e a cooperação tornaram-se essenciais. Se não formos capazes de praticá-las, superando os atavismos reptilianos, acabaremos todos.