Marginalidade e perda do Prêmio Nobel. Por Meraldo Zisman

Everett V. Stonequist (1901 – 1979), sociólogo americano conhecido por seu livro O homem marginal, publicado em 1937, afirma: A pessoa marginal está pronta na incerteza psicológica entre dois (ou mais) mundos sociais, refletindo na sua alma, as dissonâncias e harmonias, repulsões e atrações desses mundos… em que a adesão é implicitamente, se não explicitamente baseado nascimento ou ascendência… e onde a exclusão retira o indivíduo de um sistema de relações de grupo.

Neste sentido, o homem marginal é aquele que, através da migração, educação, casamento, ou alguma outra influência, abandona um grupo social ou cultural antes de ter realizado um ajuste satisfatório em outro, e encontra-se na margem de ambos, sem pertencer a nenhum deles. Sendo assim, devido às barreiras culturais, ele se considera impedido de (efetuar) parte do grupo majoritário.

Continua sendo complicado tentar explicar a marginalidade por sinonímias como a pobreza, normas, valores, conhecimentos, crenças, tecnologias, organizadas e utilizadas p or integrantes de uma sociedade, de modo a permitir a sua adaptação ao meio em que vivem, com precárias condições de habitação, de alimentação, sanitárias, escassez de serviços urbanos, carências na infância, ausência paternas, iniciação precoce ao sexo, gravidez indesejada, fuga do lar, baixos níveis de instrução, que resultam em baixa ou nenhuma qualificação profissional.

O homem marginal é um homem híbrido (aqui entendido como uma pessoa que possui elementos diferentes em sua composição), compelido a viver entre dois mundos, em duas sociedades em simultâneo, e a crescer e desenvolver memórias, valores e tradições diferentes. Torna-se uma pessoa com atitudes ambíguas, duvidosas e, não poucas vezes, sem integridade moral, com uma saúde mental comprometida. Daí, a grande ocorrência de morbidade e mortalidade existentes junto àqueles tidos como “marginais”.

É compreensível que haja pequenas e/ou grandes diferenças entre grupos, ou sociedades. No entanto, a presença de qualquer preconceito, por mais inofensivo que ele possa parecer, é uma atitude de lesa Humanidade.

Não somente as sociedades necessitam ser repensadas e reprogramadas, como também as masmorras físicas ou mentais em que são mantidos “vivos” os homens e mulheres “marginais”.

Humor e lágrimas.

Será que existe mesmo um humor judaico? Sim, ele existe e realiza graça da própria desgraça. A técnica foi aperfeiçoada por anos e anos de perseguições, tendo nascido no século XIX, nos shtetls, palavra em iídiche — língua falada pelos judeus da Europa oriental — que se refere aos miseráveis povoados, vilas ou aldeias daquela região, onde eles eram permitidos morar. O shtetl surgiu como resultado de dois processos intimamente relacionados: primeiro, a exclusão social dos judeus e sua permanência, apenas, em determinadas áreas (conhecidas como Zonas de Residências Judaicas); e, segundo a restrição dos seus direitos, como o de circulação nas cidades, o de exercer cargos no governo e a posse de campos de cultivo. Desse modo, eles foram concentrados, discriminados e forçados à grande pauperização. Esta situação foi criada pelo ‘czar’ Nicolau I (1796 – 1855), e mantida pelos ‘czares’, Alexandre II, Alexandre III, e Nicolau II (1868 – 1918), o último ‘czar’ que imperou na Rússia. Prossigo. Sendo assim, igualmente a outros povos discriminados, os judeus se voltaram para suas crenças ancestrais, endogâmicas e fechadas em relação à maioria da população dos países onde habitavam. Além disso, para conservar o equilíbrio mental, bem como as defesas psicossociais, eles criaram o “humorismo da desgraça”, produzindo humor da situação em que viviam.

O denominado humor judaico foi (e continua sendo) adubado pela estranha parceria sadomasoquista entre torturador e torturado. Quem pesquisar o caráter desse humor, de forma mais aprofundada, não poderá negar que ele representa uma tentativa (embora frustrada) de angariar migalhas de seduções e muitas gargalhadas à custa da própria dignidade humana. É interessante observar que tal espírito judaico, surgido nos shtetls da Europa oriental, migrou para os Estados Unidos e outros países como o Brasil.

Creio que a ansiedade foi se tornando cada vez maior, para se adaptar ao modelo de referência da maioria populacional das novas Pátrias, mais corriqueira, masoquista, autodepreciativa e autocrítica. O grande poeta judeu, Chaim Nachan Bialik (1873 – 1934), considerado um divisor de águas da literatura hebraica moderna. Pouco antes de falecer, a mídia divulgou que ele seria o provável vencedor do Prêmio Nobel, mas o prêmio terminou sendo outorgado a outro poeta. Indagado como se sentia, por perder o cobiçado troféu, ele respondeu: eu estou muito satisfeito em não ser o ganhador. Caso tivesse sido o escolhido, meus patrícios iriam dizer: que besteira é esse tal de prêmio Nobel, até o Bialik ganhou um…Agora, todos vocês escrevem, falam, fazem entrevistas comigo para saber como eu me sinto. Se eu fosse o vencedor, não haveria tanto interesse em minhas emoções.

O perigo da sobrevivência da humanidade, não está nas armas ou nas honrarias, mas na oração dos homens: nas agressões, no fanatismo, nas prepotências, nos excessos de zelos, na incapacidade de imaginar, de sonhar, de ouvir e de perder a capacidade de rir de nós mesmos. Esses são os grandes dilemas da humanidade. E a entrevista está encerrada, senhores jornalistas.