Liberdade de expressão - O meu país é meu lugar de fala

No dia 3 de agosto, comemora-se o fim da censura no Brasil, sacramentado pela Constituição de 1988 que, também garante a liberdade de expressão, pensamento e manifestação, tripé fundamental nos regimes democráticos. Para os mais jovens parece algo natural, mas não é bem assim. Esta conquista é fruto de muita luta e deve ser valorizada, especialmente em um país que experimentou períodos onde a liberdade de expressão intelectual, científica, artística e política foi duramente cerceada.

A relação do Brasil com a censura vem do tempo de colônia, pois a coroa portuguesa possuía uma lista de obras proibidas de circular, principalmente as de teor iluminista ou com críticas ao Absolutismo ou a Igreja Católica. Existiu até proibição de cultos e rituais de religiões não católicas, principalmente de religiões indígenas, aliás, curiosamente esse tipo de intolerância começa a crescer novamente.

Na chamada Era Vargas também ocorreu censura com apreensão de livros e aprisionamento de escritores. Na década de 1940 foi criado o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), responsável pela censura e também pela propaganda oficial do governo.

O maior caso de censura ocorreu durante a Ditadura Militar brasileira, quando o Ato Institucional nº 5 (AI-5), determinava que toda forma de comunicação estava sujeita a análise e aprovação prévia de conteúdo. As maiores censuras ocorriam em notícias, livros, músicas e obras artísticas em geral, chegando até às aulas escolares e universitárias. Existiam vários agentes do governo responsáveis pela fiscalização e o descumprimento era duramente punido. Foram inúmeros casos de prisão, tortura, desaparecimento e mortes. Os mais atentos certamente se recordam que antes de todos os programas de televisão aparecia na tela um documento com autorização do Ministério da Justiça e um locutor solenemente anunciava “Esse programa foi aprovado e liberado pelo serviço de censura federal para ser exibido nesse horário”. Apresentações teatrais e cinematográficas também necessitavam do tal documento.

No mundo da música, provavelmente a maior vítima foi Taiguara com 68 de suas canções proibidas, já Gonzaguinha teve 54. Em um álbum de 11 músicas, Milton Nascimento teve somente três liberadas e como protesto gravou todas apenas com melodia, um verdadeiro espetáculo vocal. Nem Adoniram Barbosa escapou, pois o clássico “Tiro ao Álvaro”, foi censurado com o argumento de “falta de gosto” devido aos propositais “erros” de português e de pronúncia.

Agora vivemos um tempo onde curiosamente os maiores ataques são contra o jornalismo e a liberdade de imprensa. Segundo um ranking da organização Repórteres Sem Fronteira, nos últimos dois anos, o Brasil regrediu seis posições, chegando ao 111º lugar de um total de 180 países.

O avanço tecnológico trouxe modernas estratégias de censura, sendo a mais conhecida à proliferação de notícias faltas, as famosas “fake News” que junto com declarações polêmicas buscam desviar a atenção da mídia e da população escondendo ou censurando outras informações mais importantes de atos praticados, especialmente pelos poderosos da economia e da política.

Necessário registrar que a Constituição não ampara todo tipo de manifestação, os chamados discursos de ódio, a discriminação racial e a intolerância não são permitidos. A liberdade de expressão não pode ultrapassar os limites legais, éticos e morais. Desta forma quem difama, ofende e calunia deve estar preparado para responder nas esferas civil e criminal, pois a vida privada, a intimidade, a honra e a imagem também são valores amparados pela lei.

Celebremos a possibilidade de manifestar nossas opiniões sem medo de punições ou represálias, como canta Elza Soares na música “O Que Se Cala” (de Douglas Germano) “Mil nações moldaram minha cara. Minha voz, uso pra dizer o que se cala. Ser feliz no vão, no triz. É força que me embala. O meu país é meu lugar de fala”.