Antídoto contra o estresse da pandemia
Tragédia anunciada, a pandemia da Covid-19 está sendo sucedida por outra. A variante brasileira do vírus é mais contagiosa e letal que a original. Não estamos vivendo uma segunda onda; estamos vivendo uma segunda pandemia, muito pior. E esta não deve ser a última.
O ânimo e a esperança da população vêm fraquejando diante do prolongado distanciamento, do pesar pelas vítimas fatais e o sofrimento dos internados, das incertezas, da desfaçatez do desgoverno do país, da falta de vacina e do necessário auxílio emergencial às vítimas econômicas, da estupidez que vitupera insultos num momento crítico que demanda sobriedade, sensatez e solidariedade. Por tudo isso, estamos abatidos, muitos estamos à beira ou já mergulhamos numa amarga depressão.
Entretanto, lembremo-nos que, ao longo da História, os momentos de crise como esta que estamos vivendo sempre foram momentos de superação, de transformação. Aprendemos com as crises, elas só nos revelam que as estruturas obsoletas têm que ser trocadas por novas, mais adequadas às necessidades evolutivas. Graças a isso deixamos as cavernas dos tempos pré-históricos e avançamos até a complexa sociedade atual.
E como atravessar com saúde, orgânica, mental, emocional e espiritual, estes momentos de crise que nos impelem ao desespero e à depressão? Circulam várias recomendações a respeito, desde a oração diária até o cuidado para não se intoxicar com um excesso de informação, que, nestes dias de mídias alternativas, muitas vezes mais nos confunde que esclarece.
O livro A Virada - o Nascimento do Mundo Moderno, de Stephen Greenblatt (Companhia das Letras, 2013), lembra-nos outro forte antídoto pessoal contra o abatimento e a depressão da pandemia: a leitura. O livro de Greenblatt trata justamente do papel fundamental do livro, e da invenção da imprensa que o popularizou, na virada da obscurantista Idade Média para as luzes do Renascimento, no século XV. O final da Idade Média foi também um momento de aguda crise, grassavam então a corrupção, a ignorância, a superstição, a tirania. Greenblatt fala na “liberdade para ler”, algo na época privilégio de poucos.
Os livros, sejam impressos ou digitais, têm o condão de conduzir-nos a uma realidade alternativa, amplia-nos horizontes, transporta-nos a existências, concretas ou imagináveis, que ampliam a visão que temos do que seja realizável. Isso não é só ficção, isso pode ser a semente de um novo real, melhor que o atual. A descoberta de um bom livro é a descoberta de um precioso amigo, que temos prazer de reencontrar sempre que possível, e de quem lamentamos ter que nos afastar, ainda que temporariamente.
E encontrar um livro amigo é uma alegria singular. Nem sempre ele é o clássico consagrado ou o festejado hit. O livro amigo depende de nossos gostos, experiências, do nosso momento. Vale a pena procurarmos por esse amigo, cujo valor peculiar só nós reconhecemos. Ainda que tenhamos que fazer algumas experiências infrutíferas antes de encontrá-lo.
Encontrar nosso livro amigo, e compartilhar com ele a descoberta de que a realidade vai muito além das mazelas da crise em que estamos mergulhados, é encontrar um poderoso antídoto para o risco de desesperança e depressão.