É pau, é pedra, é o fim do caminho...

Acho que o que faz muita gente caminhar adiante,e disso se beneficia bastante a tal de autoajuda, é a crença do ser humano de que o mundo caminha para algo melhor, que há uma força maior regendo tudo e que receberão uma recompensa por serem boas; no conceito delas se acham boas.

À parte crenças, que não cabe discutir aqui, pois não acredito em tal coisa, o mundo não é algo que parte necessariamente de algo mais selvagem e se tornará manso como um cachorrinho Lulu; na sua essência continua o mesmo; claro, podemos criar leis para tornar o convívio mais civilizado e justo, como bancos e filas para idosos e gestantes. Isso parte de políticas de Estado e não da consciência coletiva de início; claro que o costume pode acabar internalizado e automático, como em sociedades como as orientais. Mas, não gosto de nações onde tudo é regulamentado; uma hora fica difícil o viver com tanta proibição.

Não há muita diferença entre nós e um touro selvagem se não tivermos o verniz da educação e da polidez. Em todos os ´séculos sempre existiram pessoas com uma educação mais esmerada ( e isso nada tem a ver com classe social) e outras mais grosseiras; sempre houve guerras e convulsões sociais, o que não impediu, em absoluto, de a humanidade continuar existindo. O ser humano subsiste, pois é de longe o pior dos animais.

Sou abordado na rua por uma Ong dedicada a construir casas para pessoas carentes; sem dúvida que acho que é um trabalho notável e voluntário. À parte a existência de Ongs desonestas, dá para se ver a satisfação no semblante desses voluntários; uma coisa que muita gente não sabe é que as ações são benéficas tanto para quem recebe o benefício quanto para quem doa ou tempo ou trabalho ou dinheiro mesmo; a filantropia também é um dos prazeres humanos, o que a sociedade de consumo nega a fim de que não diminuam os lucros pelo excesso de indivíduos generosos.

Vejo a cara de satisfação de alguns indivíduos que reciclam seu lixo e usam canudo de aço inox; do mesmo modo que doamos o dízimo na Igreja, pensando que assim nossa alma está salva, sendo que o sistema como tal continua funcionando do mesmíssimo jeito; a estrutura social tremandamente injusta de nosso país não se modificou em nada, mesmo com os programas sociais, que causaram tanto auê em um monte de gente, mesmo que esses últimos tenham uma efetividade maior em atenuar, não eliminar as diferenças sociais gritantes.

Tive um professor de italiano que falava do decadentismo, corrente literária antiburguesa ; não confundir com o pessimismo filosófico de um Schopenhauer, Nietszche, entre outros. Diante de minhas afirmações de que era uma literatura excessivamente pessimista, ele me dizia, do alto de sua sabedoria sexagenária: "non se iludere", ou seja, não se iluda.A sociedade moderna, através da autoajuda, acaba por trazer perspectivas ilusórias a boa parte dos indivíduos, o que pode gerar uma enorme frustração pela busca do corpo perfeito ou o par perfeito ou o emprego perfeito ou a ainda, e, ai de nós: a habitação perfeita! Ou ainda a viagem perfeita para falar para os amigos.

Não que não se possa, e a custa de um esforço fenomenal, alguns atingirem esse ápice do monte Olimpo, onde se estará mergulhado na felicidade absoluta, pois se sentirá um enorme vazio; sim , o ser humano é um eterno insatisfeito.

Aí vem Sartre e o Existencialismo; estamos condenados à existência e à liberdade; nós fazemos escolhas, mesmo quando não agimos.; aí se pergunta: mas e o escravo? Mesmo esse tem a liberdade de escolha, entre buscar a liberdade e se conformar ao cativeiro. Então tudo tem a ver com nossas ações, não de deuses que puxam cordéis lá em cima; mas há ainda a força do acaso, ou a Natureza, insensível diante do homem, como relata Leopardi; se estivermos no caminho ela nos arrastará sem piedade. É um mundo trerrível, e , para completar, vem Nietszche com a ideia do Eterno Retorno; sim esse mundo já existiu infinitas e infinitas vezes ao sabor do acaso. Mas não cabe a nós baixarmos a cabeça e lamentarmos; existe a nossa vontade, vontade de poder; todo o "foi assim" se torna : "assim eu o quis", mesmo esse mundo terrível, nele encontramos prazer e alegria, mesmo que sejam momentos fugazes; não, ela não pode ser contínua, pois seria um tédio; é essa batalha contínua, combates por potência, que dá alento e motivo para a vida. Nós a queremos assim, terrível, difícil, mas com inúmeros momentos de prazer; essa foi a nossa vontade!