Blogs como Espaços de Protesto e Lugares de Memória

Conforme Yasmin Ibrahim (2006), novos espaços de mídia criaram oportunidades e novas maneiras de registrar e arquivar narrativas de comunidades, culturas e sociedades. Eles representam locais de produção intelectual onde a memória cultural ou coletiva pode ser articulada ou reacendida, rompendo com a historicidade linear dos Estados-nação e da modernidade.

Essa nova mídia resiste, até certo ponto, às estruturas de poder dominantes da mídia convencional, encorajando a participação cívica e a pluralidade nos novos espaços onde pessoas antes sem voz podem se tornar produtores de conhecimento. Isso dá origem, nas palavras de Ibrahim, a uma “nova memória” pós-moderna, que é difundida, mas não totalmente livre dos processos de poder do Estado ou de outros agentes.

Com a proliferação de novas plataformas de mídia nas sociedades pós-modernas, conforme Ibrahim, as distinções centro-periferia em relação à informação, notícias e construção de memória se tornarão mais problemáticas, sem diminuir completamente as divisões entre os espaços de mídia de massa e de nicho. Cada vez mais o acesso à informação é facilitado, de modo que esse deixou de ser um privilégio das elites.

Os blogs começaram a desempenhar um papel mais importante na divulgação e formação das notícias desde o final dos anos 90, mas um dos eventos mais significativos na trajetória desse gênero eletrônico, segundo Ibrahim, foi o surgimento dos blogs pós atentados terroristas de 11 de setembro, que recontaram as histórias do evento de perspectivas pessoais, mostrando como narrativas individuais mediaram eventos globais e temperando a paisagem das notícias. Da mesma forma, os warblogs registraram a guerra do Iraque a partir de perspectivas etnográficas, fornecendo insights interessantes que não poderiam ser encontrados na grande mídia.

Historiadores e outros estudiosos da sociedade, por conta disso, têm se debruçado cada vez mais sobre os blogs como fontes de relatos em primeira mão dos mais distintos contextos. No mais, as narrativas online têm modificado a própria forma como os historiadores trabalham. A observação de narrativas em blogs permite que os pesquisadores conduzam um trabalho de campo virtual, no qual não estão fisicamente,

mas virtualmente, “lá”.

Esse cenário é significativamente diferente da observação participante tradicional ou etnografia, em que pesquisadores são frequentemente vistos e reconhecidos pelas pessoas envolvidas no estudo, o que pode afetar a coleta de dados. Além disso, a distância geográfica frequentemente limita o que e como os pesquisadores podem descobrir sobre um determinado grupo de pessoas, enquanto a pesquisa em blogs não apresenta esse tipo de restrição.

Consequentemente, tirar proveito dos blogs expande as possibilidades da pesquisa social (TAKEDA, 2013), especialmente levando em conta que eles não são apenas registros de memórias e pontos de vistas, mas espaços de debate, já que outras pessoas interagem com o conteúdo publicado via comentários ou respostas em outros blogs (MATVIYUKOVÁ, 2020).

IBRAHIM, Yasmin. Weblogs as personal narratives: Displacing history and temporality. M/C Journal, v. 9, n. 6, 2006.

MATVIYUKOVÁ, Diana et al. Voices of Protest in the Digital Space: Britain's Social Issues Bloggers. 2020. Disponível em: <https://otik.uk.zcu.cz/bitstream/11025/41228/1/BP_Dmatviyukova.pdf>.

TAKEDA, Atsushi. blog narratives of Japanese migrant women in Australia: Consequences of international mobility and migration. International Journal of Intercultural Relations, v. 37, n. 4, p. 415-421, 2013.