A proposta da pedagogia de alternância

Nos últimos anos, surgiram no Brasil diversas experiências educacionais no campo. A pedagogia de alternância constitui uma proposta singular e inovadora na formação profissional dos jovens rurais.

No contexto de Pernambuco, uma das propostas alternativa de educação profissional do campo foi estabelecida pelo Serta (Serviço de Tecnologia Alternativa), através do Curso Técnico de Ensino Médio em Agroecologia. A escola busca implementar um modelo inovador de educação no campo através de um sistema de alternância. Ela procura atribuir um novo papel social e político para a juventude do campo, principalmente em pequenos municípios pernambucanos. O Curso Técnico de Agroecologia tem como objetivo principal formar os jovens para o desenvolvimento sustentável do campo, com enfoque na produção da agricultura familiar e na transformação das circunstâncias sociais, políticas, econômicas, ambientais e culturais na região.

A opção metodológica pela alternância tem o propósito de atender as especificidades do campo e contribuir para o desenvolvimento das comunidades rurais e para a formação integral dos educandos no curso de agroecologia. Portanto, escolas como o Serta utilizam o regime de alternância como uma experiência alternativa de ensino e aprendizado (MEDEIRO, 2017).

Inspiradas nas Casas de Famílias Rurais francesas, a Pedagogia de Alternância surgiu a partir da década de 1930. Porém, a criação dessas escolas rurais, remota o ano de 1911 quando o sacerdote católico e filho de camponês padre Pierre-Joseph Granereau vivenciou as dificuldades e injustiças com os habitantes do campo. Segundo Nosella (1977), Granereau fundou um sindicato rural com o objetivo de ajudar os camponeses a superar o individualismo e isolamento proposto pela elite francesa. Ao conviver com os camponeses por três anos, percebeu que o problema agrícola estava relacionado à educação. “Ou seja, para reverter o quadro de miséria em que se encontravam os camponeses, necessário se fazia oferecer-lhes uma formação escolar voltada para agricultura, particularmente dos mais jovens, pois estes estariam aptos no futuro a construir pequenas empresas rurais” (ARAÚJO, 2007, p.41). O sacerdote entendia que as escolas instaladas no meio rural, direcionadas para os jovens agricultores, tinham uma concepção das escolas urbanizadas e, sobretudo, não atendiam aos interesses daqueles sujeitos sociais.

Surge então uma nova etapa na Casa das Famílias Rurais Francesas, tanto no aspecto administrativo e financeiro, quanto da pedagogia do movimento. “As Maisons Familiales ganharam assim, uma concepção teórica e técnica que lhes permitem sair do improviso” (ARAÚJO, 2007, p.43).

Durante a estruturação, assumiu o educador André Duffaure que ficou responsável pela elaboração do instrumento pedagógico denominado Plano de Estudo, que constitui até o momento um importante referencial para o processo de ensino-aprendizagem dos centros familiares de formação da alternância. Assim, o regime de alternância, surgiu através de experiências educacionais que buscavam dar conta das necessidades dos filhos de camponeses a prosseguirem seus estudos, sem, por outro lado, afastá-los de suas comunidades, intercalando momentos de formação profissional/escolar e em suas localidades e propiciando uma relação retroalimentar entre teoria e prática. O sistema de alternância tem orientação em dois momentos que integram os saberes camponeses e científicos: o tempo escola, que diz respeito ao tempo presencial dos educandos nas aulas e nas práticas pedagógicas da instituição de ensino e o tempo comunidade, referente às práticas do educando em sua comunidade de origem. (SILVA, VAZ, 2015).

Ao longo do tempo, essa escola ganhou maior notoriedade na França e tornou-se internacional. A primeira relação de caráter exterior aconteceu na Itália, onde são intituladas como Scuola dela Famiglia Rurale ou Scuola-Famiglia. Expandindo-se, logo, por toda a Europa e, em seguida, alcançando a África, a Ásia, a América Latina e a América do Norte. Essas instituições têm como propósito estabelecer “a responsabilidade e a condução de trabalhos da experiência pelas famílias, por meio de associações próprias, e a adaptação da pedagogia à realidade rural, como uma maneira de oferecer ao indivíduo a formação integral e, com isso ajudar no desenvolvimento do seu meio” (ARAÚJO, 2007, p.44).

Atualmente, cada país tem uma associação nacional e associações regionais. Elas se agrupam na Associação Internacional do Movimento Famílias Rurais (AIMFR). A sede está localizada em Paris, na França, e tem o apoio da Solidariedade Internacional dos Movimentos Familiares de Formação Rural (SIMRF), com sede em Bruxelas, na Bélgica.

A utilização da proposta pedagógica de alternância é considerada por muitos educadores e técnicos como uma matriz pedagógica de organização do trabalho, que contribui para o aprendizado dos jovens agricultores. Essa pedagogia é caracterizada pela conjugação de períodos e espaços alternados que perpassam pela formação na escola, comunidade e família e pelo uso de instrumentos educacionais específicos. A flexibilização, sob a forma de alternância, é considerada por diversas instituições como uma das metodologias mais adequadas para atender as especificidades das populações do campo.

A proposta de alternância, apesar de possuir algumas variações em sua pedagogia, conforme o objetivo e/ou perspectiva de cada instituição “[…] vai ao encontro dos anseios da formação intelectual e humana dos atores envolvidos no processo educacional, possibilitando o desenhamento e materialidade a todos os sujeitos, a partir dos eixos temáticos que norteiam o processo de ensino e aprendizagem” (CARVALHO, 2015, p.117). As experiências de alternância, portanto, propõem de uma maneira geral, uma formação que perpassa pelas práticas que estão articuladas ao trabalho, estudo, escola, família e o estabelecimento produtivo, permitindo uma real integração do jovem agricultor com todos esses espaços de vivência e aprendizado.

Referências

ARAÚJO, Sandra Regina Magalhães de. A alternância na formação do jovem do campo: O caso da escola família agrícola Angical. In: OLIVEIRA, João Francisco de; NASCIMENTO, Claudemiro Godoy do. Educação na Alternância: Cidadania e inclusão social no meio rural brasileiro. Goiânia: Ucg, 2007. p. 39-70.

CARVALHO, Ângelo. A pedagogia de alternância no ensino técnico agrícola: a experiência do pronera na Escola Agrotécnica Federal de Castanhal do Estado do Pará. In: SOUZA, Romier; CRUZ, Renilton. Educação do campo, Formação Profissional e Agroecologia na Amazônia: Saberes e práticas pedagógicas. Belém: IFPA, 2015. p. 296.

MEDEIRO, Inã Cândido de. A formação profissional proposta pelo Serta: Construindo o futuro dos jovens no campo. 2017. 114 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Sociologia, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2017.

NOSELLA, Paolo. Uma nova educação para o meio rural: sistematização e problematização da experiência educacional das escolas familiares e agrícolas do Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo. 1977. 204f. Dissertação (Mestrado em Filosofia da Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

SILVA, José Edivaldo; VAZ, Janaína. “Nós tamo aprendendo com eles, eles tão aprendendo com a gente”: a troca de saberes vivenciados na turma PROEJA Quilombola – IFPA Campus Castanhal. In: SOUZA, Romier; CRUZ, Renilton. Educação do campo, Formação Profissional e Agroecologia na Amazônia: Saberes e práticas pedagógicas. Belém: IFPA, 2015. p. 153-190.