Da janela
Da minha janela estou contemplando a vida. E como ela está passando rápido! Há muito tempo não sinto o abraço quente dos meus amigos ou dos meus parentes mais próximos... Vejo a vida passar...
Um vírus parou o mundo, aumentou as distâncias, fez-nos escravos da tecnologia... nos tornamos mais crentes, todas as tardes rezamos para o número de mortes que vão anunciar seja menor de que o anunciado no dia anterior...
Dá janela penso nas vidas ceifadas... nos parentes chorosos... nos planos interrompidos... nas viagem adiadas para sempre... no mundo em colapso...
Corpos não são mais velados... o choro tem que ser engolido... Pois a vida de quem escapou tem que continuar... estamos com uma roleta apontada para as nossas cabeças
Será que valerá a pena: a natureza se renova... há menos acidentes... menos roubos... mais atos de solidariedade... Mas também, menos abraços... menos beijos... menos apertos de mão... Será que não pagamos um preço muito alto?
Será que foi preciso um vírus para nos fazer entender o quanto precisamos um do outro, não só virtualmente... mas da presença, do aconchego, do olhar...
Que tudo isso nos sirva de lição... Que dentro em breve possamos extrapolar o espaço de nossas janelas... que o sofá volte a ser, novamente, mais um móvel do nosso lar... e que nossas casas sejam bem mais que trincheiras...
Nália Lacerda Viana, 30 de maio de 2020