Entre Mulheres
Mulher
O que é ser mulher?
O que é se tornar mulher?
O que é se identificar mulher?
O que é se reconhecer mulher?
Mas minha deusa, o que devo fazer quando compreendo que sou mulher?
Que mulher eu sou?
Sou do tipo bonita?
Mas!!!
Minha pele conta?
Ser mãe sem marido me faz menos mulher?
Mas... Pera... sou gorda, ninguém me acha bonita!
Não sou mulher?
Preciso ter cabelo liso para ser uma mulher bonita?
Preciso ser forte e, ao mesmo temo, fingir que sou o tipo que os homens gostam?
O que devo fazer quando compreendo a carga extra que a sociedade deixou em minhas costas e em meu caminho, sem se quer pedir permissão para mim, pelo simples e único fato de eu ser mulher?
E o que faço com minha amiga que se acha a pior mulher do mundo? O que faço comigo quando me sentir a mulher mais fraca e pior do mundo?
O que faço com a menina que descobriu que perdeu a virgindade com um 'babaca' que expôs sua vida para os amigos?
E a vizinha que apanha do marido?
E a criança que sofre violência sexual, física e psicológica do seu dito pai?
São muitas perguntas que talvez não tenham uma resposta final, mas há reflexões que podem nos levar a diversos orgasmos femininos... ser mulher é um ato, uma colcha de retalhos, um interior e um urbano.
Por muitos e muitos séculos, não se perguntava coisas como: o que é ser mulher? Sou mulher? É normal sentir atração afetivo-sexual por outra mulher?
Apenas se ouvia falar na tríade mulher: a santa, a puta, a mãe. Essa tríade chega para nós por diversos meios de comunicação dentro da cultura e história do ser humano: cinema, poemas, músicas etc.
Por muitos séculos, o ser homem era o centro das atenções, de forma que suas vontades, sua formação quanto a cidadão livre e dono do seu meio, dono do carrinho de brinquedo, dono da mulher, dos filhos, etc, aquele que deveria ser o responsável, respeitado, e em certos momentos, ditador (cobrado por isso, numa certa proporção) construiu o que temos como sociedade patriarcal. E dentro dela, temos a roupa da masculinidade e sua relação com a virilidade, força, macheza, ordem, domínio, império, regras, que vestem o homem desde o momento em que este sai do ventre materno, ventre que, mesmo acolhendo a humanidade por mais ou menos 7 a 9 meses, terá como retribuição uma sociedade misógina, violenta, feminicida, e, sem dúvidas, contra a mulher.
Queria pedir licença aqui para fazer uma breve análise do trecho de duas letras de música do século XX e uma do século XXI: uma é Maria Ninguém (João Gilberto), a outra é Ai, que saudade da Amélia (canção composta por Mário Lago (letra) e Ataulfo Alves, revisão e música) e, a do século XXI, Vaza, canhão (Black Style):
Letra 1
" ... Só que tem que ainda é melhor
do que muita Maria que há por aí
Marias tão frias cheias de manias,
marias vazias pro nome que tem
Maria ninguém é um dom
que muito homem não tem
Se eu não sou João de nada
Maria que é minha é Maria ninguém
Maria ninguém é
Maria como as outras também"
Letra 2
"Não vê que eu sou um pobre rapaz
Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo o que você vê, você quer
Ai, meu Deus, que saudade da Amélia
Aquilo sim é que era mulher
Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer ...
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade"
Letra 3
"Eu conheci uma menina na Internet
Ela me disse que era um verdadeiro avião
Eu marquei um encontro com ela na Avenida Sete
E quando eu vi a menina pirei o cabeção
Ela tem cara de jaca Nariz de xulapo
Estria nas pernas
Bunda de peteca
Perna de alicate
Cabelo de Assolan
Ela é caolha
Tem unha encravada
Boca de desdentada
Barriga dobrada
Tirando a camisa o peito batia no chão ...
E o refrão é assim
Vaza canhão, Vaza canhão"
Os trechos são apenas para 'ilustrar' a mulher entre a Bossa e o Pagodão, a mulher descrita por palavras do ser masculino, sob a visão do homem em diferentes séculos e ritmos musicais.
Maria, 'a atual', Amélia e 'canhão', a mulher que só é alguém se o seu homem o for, a mulher imperfeita por cobrar, a mulher perfeita que aceita passar fome ao lado do seu amor e a mulher que, embora tenha uma estima alta que se vê como um 'tremendo avião', é adjetivada negativamente sob a visão do e, além disso, suas características são criteriosamente de uma mulher negra e gorda - associadas a algo negativo e inaceitável para um encontro.
O tipo de mulher que não pode ter uma estima elevada sem incomodar a todos na sociedade.
Tipos diferentes apresentados pelo homem.
Marias "cheias de manias", Marias "vazias", Marias objeto de pertencimento do homem. A mulher que não tem nome, a imperfeita que só pensa em luxo e riqueza em comparação com a ex perfeita, a Amélia, "a mulher de verdade", Amélia "sem vaidade", Amélia que aceita as condições do homem, Amélia, a mulher perfeita... Ai, que saudade da Amélia. A mulher do século XX que não falava, era falada nas canções. E quantas mulheres naquela época, não viam como elogio o adjetivo de Amélia.?! Mas... quantas mulheres também não se incomodaram com a tal da Amélia?!
E agora, vamos para a mulher do século XXI, ou melhor, aquela que, em pleno século XXI, para ser 'a mulher' ainda precisa passar pelos critérios e opiniões do homem. As exigências masculinas para que você seja mulher são inúmeros: você é boa de cama? Você sabe cozinhar? Quantos pratos diferentes você sabe fazer? Gosto de mulher que fala pouco. Quero uma mulher pra cuidar de mim e da casa. Preciso de uma mulher que me dê filhos. Prefiro mulheres que não pensam só em sexo. Aff... odeio mulheres gordas que não tentam emagrecer. Esse negócio de mulher querendo ser igual a homem e não pagar a conta não está certo, não quer direitos iguais?! Então, pegue peso, pague a conta.... Mulher que se masturba é feio. Apoio o Feminismo, mas as mulheres querem acabar com os homens... Parei, posso fazer um livro com tantas frases que somos obrigadas a ouvir.
(ainda bem que existe FEMINISMO!!!)
Voltando aos trechos das músicas citados, antes de sair das representações da mulher nesses contextos musicais, quero dizer que, das 4 mulheres, a negra foi atingida de forma perversa: psicologicamente. Ela não tem nome, ela não tem vez, ela não é padrão de beleza etc.
Temos, então, a Maria casada, a atual imperfeita, que só pensa em luxo e riqueza, a Amélia ex, que faz falta, que é perfeita, e a menina da internet, solteira, que tem todas as imperfeições que a sociedade nos ensina desde sempre.
A menina solteira da internet é estereotipada, faz parte da base da pirâmide social, essa menina é a mulher que carrega a sociedade nas costas, é aquela que passa fome, que paga aluguel, que mora e vive em condições subumanas, é aquela que só consegue estar financeiramente estável, mais ou menos, aos quarenta anos, é a mãe que tem que ensinar ao seu filho o que é racismo, é aquela que precisa se convencer que é linda todos os dias, mesmo que os padrões sociais não lhe incluam. É aquela que vai contra a maré. (claro, isso é uma análise, alguém poderá apresentar outras)
Os adjetivos das Marias e Amélias são de mulheres casadas ou que já foram casadas, pertencentes e 'coisas' de seus maridos - lembrando que Amélia foi largada pelo homem, mesmo sendo tão 'perfeita', por isso ele tem tanta saudade da Amélia e, dentro dessa mesma canção, apresenta-se dois tipos de mulheres: a atual e imperfeita, e a perfeita ex que aceitava tudo, sem contrariar a vontade de seu marido.
E pense o quão pesado é o segundo nome de uma mulher ser um tal de um NINGUÉM!!!!
O mundo da mulher, por tempos e tempos, se resumia ao seu homem, ela vivia, respirava, transava, cozinhava, tricotava, se vestia e até paria por ele. Tal homem, por sua vez, era (e é) livre.
O parto, por exemplo, para a mulher não será a mesma coisa para o homem, não é preciso ser mãe para saber que o parto feminino só termina quando a mãe ou a cria morre, o parto masculino, por sua vez, termina quando o homem decide, continua se ele escolhe, se mantém até quando ele quiser.
O pai terá o papel de ajudante da mãe, aquele que só fará algo quando tiver tempo, ou se quiser, aquele que tem outra família para alimentar, aquele que tem muito trabalho para fazer, aquele que, mesmo sendo péssimo, terá o eterno perdão social.
A mãe, não. Como diz o ditado popular: “quem pariu mantenha e balance”. Quem pare é a mãe, não o pai. Logo, manter essa criança é o papel da mãe, não do pai, e, infelizmente, isso é real e cruel na sociedade.
Passam séculos, passam anos, passam bois, passam boiadas, mas o perdão e liberdade social do homem nunca passam.
Mesmo não querendo dar enfoque ao ‘aborto’ paterno por agora, pois, para mim, o assunto é complexo demais para se resumir a alguns parágrafos ou folhas, esse tema - “aborto” PATERNO - me obriga a falar porque envolve, perversamente, um infante de forma psicológica, social, cultural, educacional que não tem a opção de escolher ter ou não ter o pai biológico.
A criança já nasce com a carga do abandono, antes mesmo de se entender como ser humano. Os homens precisam ser URGENTEMENTE reeducados, se livrar da formação machista e patriarcal, precisam se reconstruir como pessoa, como humanos, ou melhor, apertar o F5 e se reconfigurar para o melhor de si. Isso é muito sério. A perversidade masculina é algo que precisa ser desfeita, apagada, extinta. Quantas crianças choram, sofrem, adoecem porque os pais biológicos decidem, simplesmente, que não querem ser pais delas?!
E outra coisa que nos incomoda é que as mulheres mais afetadas negativamente, prejudicadas psicológico-afetivamente, insultadas sócio-culturalmente são as mulheres negras e de baixa renda. Afirmo isso com a segura propriedade do meu lugar de fala: mulher, negra, de baixa renda e que sofreu um “aborto” paterno, carregando hoje a culpa de ser a filha que não liga para o pai, a ingrata que não entende os motivos do seu pobre pai, pai esse que só não se aproximou da filha porque a mãe não deixou, não sabia se era realmente pai biológico dela, e bla, bla, bla, bla. Todas as desculpas possíveis que a sociedade encontra para encobrir as falhas masculinas.
Mas paro por aqui!
Sendo assim, vamos pensar primeiro na tríade mulher.
Talvez nem fosse necessário falar sobre isso, vez que, com a ascensão do movimento feminista (graças a Maria, mãe de Jesus; graças a Eva e sua maçã), essa tríade tem sido discutida, desconstruída, digamos até que nem mais tão falada quanto antes. Então, vamos abordá-la rapidamente, pensando em formação e construção.
Há séculos, a formação da mulher estava para: ser discreta, comportada, a imagem CMB - cama, mesa e banho, dizer sim, manter sua postura de ‘mulher para um compromisso sério’, como a Maria Ninguém e a Amélia que era mulher de verdade. Essa formação permitiria que a donzela atingisse seu grande ‘investimento’ da vida: o casamento, o nome de fulano de tal. A mulher saía dos limites paternos do pai, para os limites paternos do marido.
Sim, se pensarmos que o pai decidia e mandava no mundo das filhas, e que o marido decidia e mandava no mundo da esposa, veremos essa mulher numa transição de patriarcas. A figura daquele pai que mandava e decidia por amor e proteção à figura desse marido que lhe deu um nome, uma família, uma reputação e, por isso, decidia, protegia e, também, amava.
Embora isso nos incomode muito, mais ainda após as discussões feministas, sabemos que hoje ainda existe essa realidade em muitos contextos familiares, e muitas mulheres ainda, talvez por falta de acesso à leitura, discussão, educação, talvez por questões financeiras, de estima, religiosas e familiares, optam por permanecerem seguindo esse caminho.
O feminismo nos permite enxergar melhor a nós mesmas, a respeitarmos umas às outras, a ajudarmos umas às outras e a entender as dores umas das outras. O feminismo é justamente isso: nos permite.
Então, é doentio e não saudável para a vida da mulher um contexto como esse, mas precisamos respeitar suas escolhas, mesmo que uma delas seja viver nos limites do patriarcado. O que podemos fazer é cada vez, mais e mais, praticar a conscientização por meio da leitura, escrita, discussões e, se preciso, uns gritos de vez em quando (rsrs) etc. (Às vezes, precisamos fazer até cartazes para atingir nosso objetivo).
Quanto ao desejo sexual feminino, não se via, nem ouvia, nem falava.
Embora programas de TV, séries, minisséries, novelas, o ‘professor’ de Literatura e suas interpretações na óptica masculina, as músicas e os filmes etc. mostrem as moças ‘da vida’ e sua ‘promiscuidade’, como se elas, de fato, fossem mulheres donas do seu próprio nariz (em parte, sim, acredito que fossem donas de seu próprio nariz, mas até certo ponto), pelo simples fato de praticarem o ato sexual com homens diversos, sabemos que a visão processada pela sociedade era de que ‘o homem escolhia e precisava saciar suas vontades’ e suas esposas nem sempre eram o ‘tipo de mulher’ para isso. Isso não está muito diferente nos dias de hoje.
Mas tirando rapidamente minha fala do parêntese, sim... as mulheres tidas como promíscuas eram na verdade a ousadia que a sociedade queria, mas era moralista demais para assumir, elas eram a ousadia que as esposas queriam ser, mas tinham medo de 'espantar' seus maridos.
As mulheres que praticavam o ato sexual, nesse contexto tido como promíscuo, não estavam livres das más línguas, nem das más visões, nem do mau reconhecimento social, nem de ser a eterna puta e nunca santa das ruas em que andavam, ou moravam.
Era, a meu ver, o que podemos chamar de perverso julgo ao feminino, esse sentimento do ‘perverso’ perdura nos dias de hoje, mas hoje temos mulheres em construção, tentando se livrar das amarras da antiga formação.
Entre a santa, a puta e a mãe... mulheres com algemas sociais invisíveis, mulheres recebendo todos os dias o tapa sem mão da sociedade. A santa que não podia perder sua pureza, a puta máquina de orgasmos masculinos, e a mãe, aquela que acolhe, que ama, que não abandona, que nunca se vai, imagem da casa, da família, a geladeira, o fogão, o prato feito, a comida posta, a toalha de prato, o chão varrido, a roupa lavada, a criação dos filhos e a que se deita na cama para o bel-prazer do seu homem, aquele que é o centro de sua vida.
E
“Há Sempre Um Homem
Me Dizendo O Que Fazer”
(CONCEIÇÃO EVARISTO)
A formação dos tempos antigos ditou o que é ser mulher, ditou a tríade mulher, ditou as Marias Nínguém, as Amélias, as ‘canhões’, as que só pensam em luxo e riqueza, as vazias, as cheias de manias etc. foi uma injeção nos cérebros humanos, masculinos e femininos. Crianças, jovens, idosos, a mãe, o pai, o tio, a tia, o vô e a vó, todos e todas formados pela sociedade patriarcal, suas raízes estão em nossa mente o tempo todo, querendo se reverbera em forma de palavras, olhares e apontar de dedos.
Essas raízes da formação antiga se mantêm firmes ainda, mesmo com todas as belíssimas e fortes discussões feministas de Angela Davis, Djamila Ribeiro, Chimamanda Ngozi Adichie, por exemplo, que trazem o universo feminino, em especial, o universo da mulher negra, nos mostrando o que é o machismo e racismo, quando abordam o feminismo e a sociedade. São autoras que nos mostram uma nova construção, uma nova leitura da sociedade.
A mulher de agora tem se tornado, tem se construído, tem estudado, tem refletido, tem se questionado, tem seus intervalos, tem se dado um tempo, tem se permitido, tem querido mais, tem se deixado, tem aprendido que ser forte não é para sempre, uma hora ou outra, é preciso ser fraca, mas para nós que estamos às margens da sociedade, ser fraca ainda não pode ser por muito tempo, porque nós somos cobradas para ser e estar forte... o tempo inteiro. Nós somos cobradas, pela lágrima que derrubamos, pelo sonho que abandonamos, pelo estudo que largamos, pelo trabalho que paga pouco, pelo pouco que ganhamos, somos cobradas pelo ar que respiramos... somos cobradas.
Mas sim, a mulher de hoje é a tal da mulher da porra, a tal da mulher emulherada, é a tal que houve ‘você é muito feminista e vai ficar sozinha”, é a que não aprende a cozinhar para casar, não vai para cama para agradar ao homem como antes, mas sim por conta da necessidade biológica do seu próprio corpo, é aquela que desenha como quer ser agradada na cama, é aquela que pede ao seu parceiro ou parceira para abaixar a voz quando estiverem discutindo, é aquela que se masturba, é aquela que diz ‘sou cis, sou lésbica, sou bi, sou trans, e daí?’, é aquela que ajuda a outra da forma que for possível, seja financeiramente, emocionalmente ou feministicamente, por exemplo. A mulher de hoje é aquela que vai entendendo - sim, porque é um processo - que seu próprio amor é o que lhe completa.
A mulher de hoje é o resultado das lutas, dores, amores, horrores, sangue, ruas, rios, festas, bordeis, vassouras, quintais, casas, vez, voz e força das mulheres de ontem.
E aquela formação de antes vem sendo desconstruída. Mas é claro que isso é um processo histórico que está enraizado, não acabará de vez e tão rápido assim. E ainda nos faz cair em suas armadilhas em muitas situações. Devemos ter cautela, pois a nossa criação é para pensarmos a favor do homem, contra a vítima, para reproduzirmos o racismo e apoiarmos a cultura do estupro, para saber que o estereótipo branco é o bonito, para desrespeitar as crenças e fé dos outros, para reproduzir a meritocracia etc. Essa é a nossa formação.
Então, o feminismo nos mostra a construção, o refazer-se, a transição do rastejar-se a ter asas. A mulher que é cis, a mulher que é lésbica, a mulher que é trans, a mulher que é bi, a mulher que é ela é MULHER. A mulher preta, a mulher branca, a mulher rica, a mulher pobre, a mulher gorda, a mulher magra, a mulher forte, a mulher fraca, a mulher que se sente sozinha em seu universo afetivo, simplesmente, mulher. Todas elas com escolhas, opções, cobranças e restrições sociais diferentes.
Se, por um lado, a mulher cis, branca, rica e magra tem certa facilidade nas conquistas afetivas e sócio-financeira, por outro, a mulher cis, preta, pobre e gorda terá – e podem acreditar que sim – suas dificuldades, impedimentos, frustrações e nós afetivos e sócio-financeiros. É um fato INEGÁVEL, em nossa sociedade. Para uns, apenas mimimi, para outros: fica aqui no meu lugar e ressignifica essa merda de mimimi.
Se, por um lado, a mulher lésbica ou bi, branca, rica, magra tem, provavelmente, problemas para ser aceita devido a sua orientação sexual, a mulher lésbica ou bi, preta, pobre, gorda, terá que, com toda e plena certa, lidar com problemas que vão além da aceitação social quanto a sua orientação sexual. É outro fato INEGÁVEL.
E a dita “mãe solteira”?
E a mulher que apanha e leva a culpa por apanhar?
E a menina violentada?
E a menina que não gosta de rosa?
E a menina que não gosta de bonecas?
E a menina?
E a mulher?
E a criança?
E a idosa?
E?!!
As mulheres de hoje não são, com toda e plena certeza, as mulheres de ontem. Mas não estou dizendo aqui que uma tenha mais valor que a outra. Mesmo porque, a mulher de hoje existe por conta da mulher de ontem que, sem sombra de dúvidas, resistiu firmemente e iniciou toda essa ‘balbúrdia’ no momento em que começou a andar na contramão, a dizer não e a mostrar para o outro que queria ser escutada, vista, respeitada.
Isso nos fez procurar caminhos para o protagonismo feminino, para o lugar da mulher, para a voz e vez feminina, para a reeducação da menina, para o papel e reputação da adolescente, para a posição da mulher, para a aceitação, para a educação, para os direitos, para o sexo da mulher. Isso influenciou até no que chamo de ler mulheres. Apoiar projetos, livros, trabalhos de mulheres.
Antes que minha memória cheia de textos para dar conta falhe, aqui entre nós mulheres, que estamos a procura do nosso emulheramento constantes, vocês já perceberam como nosso mundo afetivo, no que se refere ao parceiro (a parceira, segundo amigas minhas, também não foge muito disso) é difícil de se manter? E a sociedade faz uma eterna pressão para que tenhamos alguém. Às vezes, a mulher até cai na doideira de se perguntar se: é sua culpa, se é muito exagerada com as palavras, se é muito afoita, se diz muito cedo que quer transar, se ser 'muito feminista' atrapalha o relacionamento, ou ainda se deveria ceder mais aos gostos do outro, se a risada é muito escandalosa (a minha é imensamente). Todos esses questionamentos surgem quando o encontro falha, quando a pessoa do outro lado vira um monstro monossilábico (pra descontrair), quando não há reencontro, quando depois do sexo, a pessoa assume relacionamento com outra parceira. Bom, acho que os problemas do relacionamento não têm nada a ver com o feminismo, mas têm a ver com a educação que estamos tendo.
A pressão social para que tenhamos outra pessoa é imensa, outra pessoa do sexo oposto, que fique claro. Crescemos sabendo que precisamos do outro para ser feliz, precisamos ter filho e um homem para sermos uma mulher completa, afinal “mulher boa, é mulher que...”.
Essa coisa que nos ensinam, ou melhor, esse negócio de depositar a felicidade no casamento, no filho, no homem, na família, gerou muita necessidade de terapia, deprês, remédios controlados, choros, crises, desilusões etc. Porque o outro, especialmente, o outro do sexo masculino, não é criado para fazer ninguém feliz, ao não ser a si mesmo. E porque, além disso, a felicidade, completude, sabedoria, realizações, vêm de nós. Só há um problema com essa minha afirmação: ninguém nos ensina, só descobrimos quando o poço não tem mais fundo.
A única coisa que fazem: é nos cobrar quando vamos achar um homem que nos queira, quando vamos dar um neto para mamãe, quando vamos conseguir nos casar, quando vamos ter... Um monte de quandos que, aqui entre nós, muitas vezes não é o que queremos naquele momento, mas que, por pressão social, acabamos procurando, seja por osmose, seja por um despertar da vontade, seja para se livrar da família, seja para não mandar todo mundo à merda – com perdão da expressão, ou não.
Se você estuda, não importa. Se você trabalha, não importa. Se você escreve, não importa. Se você é famosa, não importa. Se você é graduada, não importa. Se você é mestra, não importa. Se você é doutora, não importa. Se você é irmã, não importa. Se você é amiga, não importa. Se você é mãe, vó, filha, prima, não importa. Se você é uma demônia (adoro essa palavra), não importa. O que importa é se você tem um homem.
Se ele te ama, te odeia, te trai, te bate, te agride, te estupra, te impede, te mata, te deprime, te desconstrói, te desincentiva, te deixa sempre só, te oferece uma relação vazia, fria e sem graça... advinha??? Não importa, o que importa é tê-lo ao seu lado.
Por sorte, azar, exigência da vida, criação, educação, revolta, revolução, ou, seja lá o que for, “não se fazem mais mulheres como antigamente”, “já os homens.” (apenas para descontrair, ou não)
Deve, realmente, ser assustador para as diferentes gerações olharem para a mulher moderna/contemporânea e pensar quantas coisas esse corpo no mundo faz, carrega, gera e precisa enfrentar por conta de atos, escolhas e caminhos que toma.
O que há por trás da simples frase: Eu sou mulher!? --- o que assusta tanto?
Qual a carga semântica, pragmática, sintática, literária, histórica, política, social, cultural, matriarcal da palavra e ato MULHER?
Entre mulheres, pelas mulheres, para as mulheres, desejo:
+ amor
+ estabilidade financeira
+ escolhas
+ opções
+ vida
E
- feminicídio
- agressões
- injustiças
- julgamentos...