Não existem mimimis
“A vida avança, velho, e quem não avança com ela fica só, como você.”
Maximus Gorki
Hoje em dia, todo mundo adora falar que tudo é mimimi, frescura ou exagero. Se falarmos de bullying, essas pessoas que usam o discurso do mimimi dirão que, no tempo delas, isso era coisa normal e ninguém falava nada. Dirão que agora gays, negros e mulheres são cheios de besteiras e tudo o mais. Façamos uma pergunta: será que essas pessoas que falam em mimimis são capazes de se colocar nos lugares das pessoas que elas chamam de “frescas” ou “melindrosas”? Dizer que leis antibullying ou que protegem as mulheres, negros, homossexuais e índios são exageros do politicamente correto não é apenas insensível, é uma prova de que quem diz isso, provavelmente, não presta atenção ao mundo à sua volta nem percebe que a vida evolui, anda para a frente.
Podemos falar que os negros são cheios de mimimis quando lembramos que, por um bom tempo, eles foram escravos não só no Brasil mas em outros países? Existe frescura e exagero por parte dos negros quando sabemos bem que, quando uma pessoa de pele negra entra num shopping, todos os seguranças já ficam de olho em seus movimentos, como se esperassem que ela fosse furtar algo? E, se houver um furto, suspeitarão logo dela. Ninguém também pode falar em mimimi quando se fala em bullying. Se bullying fosse apenas “besteira de jovem”, não haveria tantos casos de depressão e suicídio. Bem, talvez alguém diga que os jovens de hoje estão muito fracos e que, antes, não havia “essas frescuras”, pois cada um que aprendesse a se defender. Mas a gente pode dizer que é bobagem ser injustamente perseguido por um bando de valentões que se aproveitam de quem está em desvantagem, tratando essa pessoa como se ela fosse alguém sem valor, servisse apenas para ser saco de pancadas? Imaginemos como é alguém que sofre bullying e não entende por que o perseguem, sente-se sozinho, ignorado por todos, como se suas dores e o fato de ser agredido, humilhado e perseguido sem motivo não fosse importante. É frequente que lhe digam que isso é “normal”, que antes era só brincadeira e que hoje as pessoas estão muito exageradas. Com frequência, as próprias famílias das vítimas de bullying dizem que a culpa é delas, que não sabem se defender e que os outros as agridem porque elas são bobas e passivas. Será que a questão do bullying é mesmo vitimização? Então, vejamos os casos de Columbine, de tantos outros tiroteios em escolas e o de Suzano. Todos os atiradores haviam sofrido bullying. Claro que nada justifica que vidas inocentes sejam ceifadas de maneira tão violenta. Mas o fato dessas pessoas chegarem a atos tão extremos é uma prova do quanto o bullying causa danos psicológicos que não podem ser ignorados.
No caso da Lei Maria da Penha, é mimimi? Então, mulher é mesmo para apanhar? Lutar por nossos direitos não é mimimi, é reconhecer nossa dignidade como seres humanos. Não seria necessário que houvesse leis que criminalizassem a homofobia e o racismo se não existissem o racismo e a homofobia e se todas as pessoas entendessem que somos todos iguais no nosso direito de ser tratados com dignidade. Antes, mulheres eram consideradas quase incapazes e hoje, mesmo com todos os avanços, ainda enfrentam muitos preconceitos. Culpa-se a mulher que foi vítima de estupro, assédio sexual. Uma mulher, muitas vezes, tem que provar que é tão boa quanto seus colegas homens se ocupa uma posição importante. Seria ótimo que chegássemos ao ponto de nenhuma mulher mais precisar sentir que tem de provar que pode ser tão boa quanto um homem na execução de uma tarefa. E que ninguém mais visse negros como seres inferiores – um absurdo num país com tanta miscigenação racial – ou homossexuais como abominação. Homossexualidade já foi considerada doença, é vista por muitos como pecado grave e, em outros tempos, era um crime passível de condenação à morte em muitos países. Nos países do Oriente Médio, eles são enforcados.
Seria ótimo que não separássemos mais as pessoas em negros, mulheres, índios, homens, homossexuais, heterossexuais, crentes, descrentes e tantas outras categorias. O bom seria que todos nós nos víssemos como seres humanos.