Quando a morte te convida para conversar...

A morte está sempre presente em nosso cotidiano, ainda que passe despercebida aos nossos olhos. Estamos, constantemente, sendo bombardeado pela mídia com caso de indivíduos que vieram a falecer por motivos trágicos ou mesmo por causas naturais.

O desastre de Brumadinho, pessoas que entram em escolas e matam estudantes e funcionários, policiais – militares ou não – cometendo diversos abusos de poder, roubos seguidos de assassinatos, e por aí vai... Mas, infelizmente, tudo isso já virou rotina, entra no esquecimento e, no geral, vira estatística.

Estatística são números. Números não tem sentimentos e geralmente nem permitem reflexões aprofundadas se não nos debruçarmos sobre eles.

“Sobe para 225 o número de mortos identificados no desastre da Vale em Brumadinho”, diz o G1. “Tragédia da boate Kiss, que matou 242 pessoas”, lembra o Correio Braziliense. “Em 2015, rompimento da barragem em Mariana matou 19 pessoas”, ressalta o R7. “Com 63.880 vítimas, Brasil bate recorde de mortes violentas em 2017”, destaca o Estadão.

Entretanto, o que importa tudo isso? No dia seguinte nenhum desses fatos são mais lembrados. Não são parentes e nem conhecidos... E outra, sempre haverá uma tragédia maior para apagar a lembrança da anterior. No final das contas, tudo vira estatística, e nada mais do que isso...

Em um determinado dia, tudo muda. A monotonia cotidiana é rompida, ainda que momentaneamente. Há algo que vêm e vira a rotina “de ponta cabeça”. Uma pessoa que amamos fica doente, sofre um acidente ou é assassinada e, finalmente, morre.

Nesse momento, não é estatística. Não! Nesta hora a morte bate à porta e convida para um diálogo. É impossível recusar o convite, porque nessa hora o indivíduo é tocado na alma. Não foi o jornal que lhe falou de um ou muitos desconhecidos falecidos. Definitivamente não! É alguém que você, caro leitor, conhece, admira, convive. O jogo muda totalmente.

Diante disso, normalmente vem o arrependimento por não ter dito certas coisas ao ente querido, por não ter aproveitado melhor os momentos que tiveram ou poderiam ter tido juntos e, em alguns casos, a pessoa pode até se questionar: O que estou fazendo da minha vida? É isso mesmo que eu quero? Será que se eu morresse agora morreria como uma pessoa que se sentisse plena e realizada?

Mas, no final das contas, isso tudo é passageiro. No outro dia a pessoa volta a viver sua rotina, pois tem que trabalhar, pagar contas, gastar. Enfim, continuar sua vida como se nada tivesse acontecido antes e, talvez, infelizmente, esse falecido venha a se tornar também apenas mais uma estatística e, em muitos casos, nada mais do que isso.

A morte nos convida para conversar muitas vezes no dia a dia, seja através da mídia, seja através de um ente querido. Ela nos revela o que de fato somos: seres fracos e limitados diante da grandeza do universo, por isso muitos evitam ter diálogos com ela. A morte revela a nossa humanidade ao extremo, expõe o que de fato somos. Evitá-la nos permite viver como se fossemos imortais, mas não somos.

Lembrar da finitude humana pode constranger a muitos, sendo que, na verdade pensar sobre ela deveria fazer com que as pessoas enchessem suas vidas de sentido e aproveitassem melhor o pouco tempo que possuem de vida. Como bem nos lembra o historiador Leandro Karnal “a beleza da flor natural é ela morrer. E é o horror da flor de plástico: nunca morre e, por isso, nunca vive”.