As coisas são minhas, faço delas o que quiser e ninguém tem nada com isso!
Título bem sugestivo, não? Dito por muitos. Vivido por milhares de pessoas. Aplicável à realidade? Vejamos...
“Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma” (Antoine Lavoisier)
Essa frase Lavoisier (1743-1794) – grande químico francês – muito mais do que tratar de questões das ciências naturais deveria nos fazer repensar um pouco as relações que temos com os bens materiais pertencentes a cada um de nós. Ou aos quais pertencemos, talvez... Isso depende muito do modo como lidamos com as coisas...
O enunciado deveria nos fazer pensar que, se na natureza não há nada de novo, mas apenas transformação daquilo que já existe, logo, tudo o que temos, inclusive nosso próprio corpo, é apenas a reorganização de átomos que já existiam à milhões de anos e, quando morrermos, esses mesmos átomos serão novamente reorganizados e passarão a ter outras funções e finalidades. Em outros termos, não conseguimos controlar e mandar sempre nem mesmo no material do nosso próprio corpo, o que se dirá então dos demais bens que possuímos?
Nada nos pertence de fato, somos apenas meros administradores temporários dos recursos de um pequeno planeta em meio a tantos outros espalhados no universo. Apesar disso, muitos ainda acreditam que possuem coisas e das quais podem fazer aquilo que quiserem sem pensar nas consequências...
Desde 1492, quando Cristóvão Colombo chegou à América, a globalização se iniciou de modo mais acentuado. A partir daí não havia mais lugar no mundo onde homem “civilizado” não tinha chegado e com o passar dos séculos começou a existir uma integração entre todos os continentes do mundo sustentada principalmente por vínculos econômicos.
Em consequência desse processo, hoje temos acesso ao mundo todo através dos meios de comunicação e também dos produtos que consumimos os quais são oriundos dos mais variados países. Consequências: além dos problemas ambientais que, independentemente de onde ocorram, afetam, de modo direto e indireto, a todas as pessoas do mundo; temos o fato de que ao comprarmos algo ou não podemos garantir o emprego ou mesmo a demissão em massa de muitas pessoas as quais talvez nunca nem sequer chegaremos a saber da existência delas.
Diante desse quadro não há como negar que aquilo que fazemos com o que acreditamos possuir é sim interesse de todos, pois, de algum modo afeta a vida de muitos. Vejamos um exemplo:
Uma pessoa que cultiva o hábito de fumar e possui consciência dos malefícios causados pelo vício diz: “Isso não é problema de ninguém, afinal de contas quem irá morrer sou eu mesmo”.
Nesse caso citado acima podemos destacar ao menos três pontos. Vamos a eles.
Primeiramente, cigarro produz fumaça altamente tóxica que pode causar problemas de saúde às pessoas que estão ao redor do viciado e, essa mesma fumaça, ainda que em pequena escala, também é um poluente da atmosfera que é respirada por todos. Temos aí dois problemas, mas vamos além.
Além disso, muito provavelmente essa pessoa virá a adoecer por conta do vício e irá recorrer a um sistema de saúde, se for privado terá que arcar com altos custos e será preciso recorrer a ajuda de muitas pessoas, pois, por mais rico que o indivíduo seja, o dinheiro dele não consegue fazer companhia para ele nos hospital e nem paga as contas sozinho sem que alguém o manuseei.
Agora, se o indivíduo recorre ao sistema público de saúde a situação se torna ainda mais complexa, porque os recursos usados para manter esse tipo de atendimento pertencem a todos os membros do país, isso é claro, sem se levar em conta que ao recorrer ao atendimento público o viciado estará ocupando a vaga de alguém que possivelmente poderia ter sua vida salva de uma doença que lhe foi causada por motivos alheios às suas escolhas e modos de vida.
E, por fim, ao fumar cigarros se contribui para que uma vasta rede de contrabando ilegal se mantenha ativa, ainda mais se levarmos em conta que boa parte dos cigarros consumidos são contrabandeados devido ao fato de possuírem preços mais acessíveis.
Diante desse breve exemplo que destrinchamos – o cuidado inadequado com o próprio corpo pelo fumo – e as consequências disso, podemos perceber nitidamente que a frase responsável por intitular este artigo não se valida, pois o mesmo que acontece nesse caso ocorre com todas as nossas ações cotidianas.
A partir do momento em que vivemos num mundo globalizado tudo o que fazemos, de um modo ou de outro, afeta muitas pessoas, às vezes no mundo todo, ainda que não nos demos conta desse fato.
Quero finalizar fazendo um convite a todos nós, inclusive a mim mesmo: Vamos repensar cada um de nossos atos? Vamos cuidar melhor daquilo que nos foi confiado, que nos pertence, durante o tempo em que estivermos vivos (nosso próprio corpo, casa, carro, alimentos, o meio ambiente...)?
Atualmente temos muitos problemas político, econômicos, ambientais e estruturais causados no mundo por conta do mau uso, ou mesmo má distribuição, que fazemos daquilo que possuímos. Isso vale para todos, sem exceção: do rico ao pobre, do crente ao ateu, do empresário ao operário. Repensemos nossas ações! Ainda é tempo da mudança.