De prontidão
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De prontidão
A estupidez humana beira o ridículo. Que trote é crime, todos nós sabemos. Que é um dos grandes problemas enfrentados por telefonistas, policiais e bombeiros militares de plantão, talvez nem todos saibam. Imagine o que é estar de plantão, por vinte e quatro horas e, de cada 100 ligações, 95 estarem, de algum modo, relacionadas a piadas, brincadeiras, xingamentos...
Recentemente, numa tarde aparentemente dentro da normalidade dos plantões do nosso aquartelamento, recebemos, por volta das 14h30min, uma solicitação que nos obrigou, por dever de ofício e amor ao próximo, a enviar uma viatura de salvamento, com três bombeiros, até a localidade do Sítio Massapê, na Vila Morada Nova, perfazendo, acredite, um total de 233 km rodados, com trechos de estrada carroçal, inclusive, para atender a um falso alarme – o famigerado trote! Ocorrência: vítima presa às ferragens, com o agravante, segundo o solicitante, de uma das vítimas estar em óbito.
O que nos revolta é que fomos acionados pelo SAMU – que também foi vítima do mesmo trote. Cumprindo protocolo de atendimento, ligamos para o destacamento policial da cidade de Mombaça, objetivando confirmar a ocorrência. Os policiais, de pronto, deslocaram-se até a base do SAMU, mas a ambulância não estava. Com a informação policial, presumimos que o socorro médico se deslocara para a localidade já referida. Ou seja: o criminoso, numa única ação, ludibriou Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e SAMU.
O que nos revolta é que, enquanto insensatos ligam para os serviços essenciais de urgência e emergência, deslocando profissionais para ocorrências inexistentes, em viaturas que trafegam normalmente em alta velocidade, na expectativa de salvar e imaginando cenários críticos, por trabalharmos exatamente assim, sempre pautados pelo brocardo prevencionista do Acidente Máximo Postulado – doutrina que nos condiciona a imaginarmos, em qualquer panorama do teatro de operações, a pior situação possível. Atuamos, portanto, sempre sob elevado estresse e isso merece respeito!
O que nos revolta é que pessoas que efetivamente precisariam de atendimento deixam de ser atendidas em razão de as viaturas estarem indisponíveis. Na ocorrência em questão, por exemplo, nossa viatura permaneceu três horas e trinta minutos fora do quartel. Foram três horas e trinta minutos de indisponibilidade para qualquer outra chamada real. Se no mesmo intervalo de tempo, alguma família aflita nos procurasse, infelizmente não teria nenhum suporte e ficaria à mercê da própria sorte, pagando pelo erro intencional, leviano e criminoso de outrem.
O que nos revolta é que quase nada é feito. O que nos revolta é que raramente vi alguém ser punido por passar trote. Raramente vi alguém pagar por essa prática abominável que tanto nos incomoda. Fica, portanto, o nosso repúdio e o nosso apelo:
Parem de brincar com a vida dos outros!
Para quem cometeu tamanho contrassenso, deixo singela reflexão:
Hoje, você foi o algoz de todos nós. Amanhã, poderá ser a vítima. E tenha a certeza de que, independente de tudo, estaremos prontos e faremos o que for possível para ajudar e salvar você.
Nijair Araújo Pinto – Ten Cel QOBM
Cmt do 4º BBM – Iguatu
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Publicado no Jornal A Praça, em 30/03/2019.
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