LIMITES A LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO

II Congresso Latino-Americano de Direito

Brasil: Um Estado em reconstrução

Universidade Iguaçu – Campus V

TEMA: LIMITES A LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO: GARANTIA OU RETROCESSO?

Gabriel dos Santos Diniz

Auner Pereira Carneiro

Grupo de trabalho: GT 01 – Temáticas contemporâneas de Direitos Constitucional e Humanos e de Direito Penal.

Objetivo geral: O objetivo principal do presente artigo é desenvolver a temática a respeito da livre manifestação do pensamento, sua disposição constitucional no rol de direitos e garantias fundamentais e a possibilidade de imposição de limites ao exercício desse direito, passando por exemplos históricos de cerceamento até a problemática que atualmente surge a respeito de possíveis limites que devem ser impostos a produções artísticas.

Metodologia: O presente trabalho se submete a uma pesquisa exploratória onde se analisa junto ao tema, fatos históricos que ocorreram tanto no país quanto no mundo, chegando a atualidade. Na busca de base para o desenvolvimento do tema, foram realizadas pesquisas bibliográficas, legislativa e jurisprudencial a respeito, assim como pesquisa em sítios eletrônicos com o objetivo de demonstrar a importância do tópico.

A proposta é de que ao final do texto os leitores possam visualizar e entender a importância atual e histórica da livre manifestação do pensamento, direito constitucionalmente previsto e ao mesmo tempo fazer um contraponto entre o exercício deste e uma possível regulação do mesmo pelo Estado.

Considerações Iniciais:

A civilização desde o seu início sempre tentou se comunicar das mais variadas formas, na Grécia antiga, mais precisamente em Atenas temos os primeiros relatos de uma sociedade democrática, onde as pessoas em praça pública se reuniam para expor suas ideias, podendo persuadir seus semelhantes, sem perseguição do estado tal fato era considerado arte naquela época.

A livre manifestação do pensamento é de suma importância em Estados democráticos sendo disposto na Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, recebida pela maioria dos países atuais, além disso, demonstra-se sua importância observando as atitudes com relação a esse direito que governos autoritários tomam, uma das primeiras medidas adotadas quando da tomada do poder é a regulação dos sistemas de informação, objetivando com isso evitar que grupos opositores consigam influenciar um número indeterminado de pessoas, o que poderia gerar um oposição forte e eventual perda do poder.

O exercício deste direito sempre foi realizado das diversas formas, seja através de publicações em jornais e revistas, seja através de obras literárias e também através da arte.

A importância do tema ainda resiste aos dias atuais, em época de redes sociais e de extrema velocidade na transmissão de ideias, grupos conservadores se mostram insatisfeitos com certos tipos de produção artística e tentam vetar exposições e peças de teatro por serem consideradas de mal gosto, utilizando as redes sociais como principal forma de comunicação.

A arte sempre foi utilizada como forma de se expressar, grupos considerados minoritários, se valem da arte para pregar igualdade e respeito e como forma de divulgação de seus ideias e cultura, defensores da liberdade na produção artística entendem que a imposição de limites nos levaria a um retrocesso cultural podendo inclusive levar sociedade de volta a época de censura imposta pela ditadura.

Diante da celeuma faz-se analise da importância do direito constitucionalmente previsto, passando brevemente pela história do país que viveu por um regime ditatorial por vinte anos, até os dias atuais, com o objetivo de demonstrar que apesar de não ser absoluto, o direito a livre manifestação do pensamento só deve ser limitado em casos específicos, onde se ofenda algum outro tipo de direito fundamental tutelado.

DISCUSSÃO

I - Estado Democrático e comunicação

Conceituando a palavra Sociedade chegaremos ao denominador comum de que se trata de uma coletividade de indivíduos que, reunidos, buscam alcançar um objetivo comum.

O ser humano, como ser social que é, necessita de interações com seus semelhantes, partilhando de diversos sentimentos, emoções e realizando sempre uma troca, que, por conseguinte, acaba por desenvolver a sociedade como um todo, seja esse desenvolvimento cultural ou econômico. A troca de informação entre seres com pensamentos diferentes influencia na sociedade em geral, modelando inclusive as atitudes que o indivíduo irá tomar dentro do grupo em que está situado

Diversas transformações ocorreram para que a Sociedade alcançasse seu status atual, viver em uma sociedade democrática significa ser parte de um núcleo onde direitos e garantias são respeitados por aquele que detém o poder, o poder neste caso é uma representação da vontade da maioria daquela sociedade.

Em uma sociedade democrática há o respeito a diversidade de pensamento, ocorrendo assim a possibilidade de diversas ideias e teorias serem expostas a uma quantidade indeterminável de pessoas e de inúmeras formas, diferentemente do que ocorre em um Estado autoritário onde há cerceamento as liberdades individuais, e obediência irrestrita ao poder autoritário.

Democracia e respeito a diversidades andam lado a lado, são duas faces de uma moeda, não há sociedade democrática se por mera liberalidade de determinado grupo de pessoas sobrevir um cerceamento de direito de outro grupo com posição oposta, sem que haja justificativa ou razão plausível.

“A intolerância em si é uma forma de violência e um obstáculo ao desenvolvimento do verdadeiro espirito democrático” Gandhi

Importante salientar que, o argumento de liberdade, Democracia e Estado Democrático não pode ser utilizado inconsequentemente e muito menos significa que o Estado não pode intervir ou controlar tais liberdades, a fim de resguardar um bem, um direito ou liberdade que seja no caso concreto considerado de mais valia e priorizando assim o bem-estar social.

Com essa regulação realizada pelo Estado há o rompimento com o Estado Liberal passando então para uma nova fase, a do Estado Social, onde é possível a intervenção estatal como forma de proteção a Sociedade como um todo, tal fato por si só não é capaz de afastar a característica do Estado Democrático, a democracia não é uma formula exata, existindo várias espécies de Estado Democrático, entre eles os já citados, Estado Democrático Liberal e o Estado Democrático Social.

Nesse sentido diversos direitos passaram a sofrer regulação do Estado, que ao impor limites, e certas restrições ao exercício de um direito ao cidadão, indica que os direitos fundamentais não possuem caráter absoluto, não possuindo prevalência total principalmente sobre outro direito fundamental.

Como exemplo de um direito fundamental regulado pelo Estado e que sempre causa discussões das mais variadas formas está o Direito a liberdade de expressão.

A comunicação está presente na sociedade desde seu surgimento, variando a forma como é feita através do tempo, nos primórdios eram utilizadas pinturas rupestres, passando pela utilização de hieróglifos pelos egípcios até chegarmos as formas atuais de se comunicar.

A importância da linguagem, e dos meios que são utilizados para comunicação entre as pessoas é tão grande que em Estados autoritários os meios de comunicação e as formas de se expressar são regulados com o objetivo de impedir que a sociedade pense de forma contrária ao que lhe é imposto. Nesses Estados, obras de artes, peças de teatro e música passam por um controle prévio rigoroso antes de chegar diretamente a população, o próprio detentor do poder, decide o que pode ou não ir a público, além disso é comum nesses Estados que os meios de comunicação de massa, como rádio, televisão e internet sejam monopólio exclusivo do Estado, como ocorre atualmente por exemplo na Coreia Do Norte.

Há, portanto, uma diferença entre a regulação exercida nos Estados Democráticos e a exercida pelos Estados Autoritários, como já dito, em uma Sociedade democrática há regulação visa o bem comum, se impondo limites para que não haja abusos que possam a prejudicar outras pessoas daquele grupo, já nos Estados autoritários, o controle exerce a função de repressão, evitando que a informação chegue a Sociedade, trata-se portanto de um instrumento de controle utilizado pelo detentor do poder objetivando a sua permanecia neste.

II - Meios de comunicação e arte utilizada para burlar ditadura

De 1964 a 1985 o Brasil foi submetido a um regime ditatorial militar, onde militares contrários ao Governo de Joao Goulart destituíram o então Presidente e assumiram o poder por meio de um verdadeiro golpe de Estado.

Após a promulgação do Ato Institucional número 5, música, cinema, teatro, televisão e outros meios de comunicação passaram a ser submetidos a uma censura prévia, onde uma obra poderia ser vetada por qualquer motivo, bastava mera declaração de que seria contraria a moral ou bons costumes ou que a mesma fosse de caráter subversivo,

Opositores ao governo sofreram intensa perseguição e repressão, o direito de se expressar da forma que melhor lhe convir era tolhido, críticos do governo eram torturados e mortos, houve uma verdadeira negação aos direitos humanos onde se suprimia a própria cidadania.

A ideia de Estado Democrático, onde a liberdade de expressar seus ideias sejam eles contrários ou a favor de quem detém o poder no momento foi inviabilizada, passando o Estado Militar a regular o que poderia ou não ser publicado e levado ao público, a Constituição de 1967 condicionou a livre expressão de pensamento a parâmetros de ordem pública e bons costumes objetivando dessa forma calar os opositores ao regime.

Apesar da censura e das prisões efetuadas durante o período, parcela da sociedade encontrou uma forma de resistência aos abusos praticados, a cultura, literatura, a música, a arte, o teatro e o cinema foram utilizados como instrumentos de defesa, onde burlava-se o sistema imposto, muitas vezes mascarando o real objetivo do que era publicado.

Exemplificando, músicos como Chico Buarque de Holanda, que compôs “Cálice”, fazendo alusão ao Santo Cálice e ao mesmo tempo um alusão ao verbo calar, denunciando a censura que estava sendo imposta ao Pais naquela época, e Geraldo Vandré que compôs “Pra não dizer que não falei das flores” e assim como diversos outras músicas e artistas de outros seguimentos que utilizaram da arte para transmitir usa mensagem a população e se esquivando da censura imposta.

Desta forma a cultura se mostrou como a principal forma de oposição ao sistema imposto, principalmente pelo fato do alcance e proporção que tais manifestações tomavam a época.

III - A Redemocratização do Brasil - Direitos e garantias fundamentais na CRFB/88

Após 20 anos de período ditatorial e ainda sobre a sombra de um regime autoritário que restringiu liberdades e direitos no País, a democracia começa a ser restaurada no Brasil.

A partir de 1984 intensifica-se a luta por eleições diretas para Presidente da República e também para a criação de uma nova Constituição, que reestruturaria a democracia, reestabelecendo liberdades que foram cerceadas pelo regime anterior.

Após eleições diretas o então Presidente da República Jose Sarney convoca um verdadeiro Congresso Constituinte que se reuniram em 01 de fevereiro de 1987 para elaboração da nova Constituição do País.

Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, reestrutura-se direitos e garantias fundamentais, direitos civis e políticos, passando o País novamente a viver em um Estado Democrático de Direito, em seu preâmbulo a nova Carta Magna já é clara dispondo a respeito de um Estado Democrático onde os direitos e liberdades estariam assegurados.

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”

Conhecida como Constituição cidadã, a nova Constituição era considerada extremamente avançada para a época , principalmente por garantir direitos que foram reprimidos durante os 20 anos de ditadura, entre eles podemos citar a garantia a independência entre os poderes, passando Presidente, Governadores e prefeitos serem eleitos diretamente pelo povo, a tortura e demais penas cruéis passaram a ser banidas , e o o fim da censura prévia a emissoras de rádio e televisão, filmes, peças de teatro, música, jornais e revistas.

O direito a liberdade de expressão passou a ser garantido constitucionalmente no rol de direitos e garantias individuais, disposto no artigo 5 da Constituição em seu inciso IV que dispõe: “ é livre a manifestação do pensamento sendo vedado o anonimato”, A conquista da livre expressão do pensamento foi das mais comemoradas, principalmente pela classe política e artística que durante o regime militar sofreram com prisões arbitrárias, tortura e exilio, sendo impedidos de manifestar sua posição contraria ao regime instalado.

A inserção da livre manifestação do pensamento na Constituição e sua disposição no rol de direitos e garantias fundamentais é de suma importância não somente para caracterizar um rompimento com o sistema anterior, mas se porta como uma evolução, demonstrando a importância que a liberdade de se manifestar sem medo de retaliações tem em um Sociedade Democrática, nesse sentido discursa JUNIOR,2013, p.541:

“ É inegável que o grau de democracia em um país mede-se precisamente pela expansão dos direitos fundamentais e por sua afirmação em juízo, não há falar em democracia sem o reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais”

Os direitos fundamentais traduzem os diretos do ser humano enquanto pessoa, enquanto cidadão inserido em uma determinada sociedade, vinculam a atuação estatal impondo ao Estado o dever de não se opor ao exercício de um direito, e o dever de atuar, garantindo efetividade ao direito.

Conceituados por Jellineck, filosofo e jurista alemão, a partir da Teoria dos 4 status, onde a pessoa além de ter garantida sua atuação na esfera privada, ao fazer parte de um grupo social passa a ter uma atuação publica, vinculando-se ao Estado em que se encontra.

A teoria dos 4 status indica as múltiplas funções exercidas pelos direitos fundamentais, não somente como função de defesa as arbitrariedades do Estado, como também no sentido da realização por parte deste, No status passivo, o sujeito enquanto individuo encontra-se limitado aos poderes estatais estando subordinado aos poderes públicos, o status negativo garante ao indivíduo um espaço de liberdade não ficando sujeito aqui a intervenção estatal, já o status positivo confere ao cidadão o direito de exigir que o Estado prestações materiais para que se efetive a prestação dos direitos e das garantias fundamentais e pelo status ativo, confere-se ao indivíduo o direito de participar das decisões políticas fundamentais do Estado. Para o jurista, cada direito fundamental corresponde a um determinado status.

Exercendo a função de defesa ou de liberdade, os direitos fundamentais são de suma importância para que se impeça o Estado de proibir, ou de limitar o exercício de certas liberdades como o direito a livre manifestação do pensamento, vedando-se dessa forma qualquer tipo de censura previa a manifestações políticas ou artísticas.

Os direitos fundamentais se inserem como categoria jurídico fundamental, essencial em um Estado Democrático de direito, onde se reconhece a dignidade da Pessoa humana, garantindo a sociedade daquele grupo uma vida digna, surgindo assim uma sociedade livre que possa se manifestar e desenvolver sem limitação do Estado. São características do direito fundamentais:

1- Historicidade – possuem caráter histórico, são frutos de todo o processo de formação da sociedade, evoluindo com o passar dos anos e desenvolvendo-se de acordo com as necessidades da sociedade em determinado momento

2- Universalidade - destinam-se de modo indiscriminado a todos os seres humanos

3- Irrenunciabilidade - conferidos a todos os cidadãos, pode ocorrer o não exercício, mas não a sua renuncia

4- Inalienabilidade – são indisponíveis, não possuem conteúdo econômico patrimonial

5- Imprescritibilidade – não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição.

6- Limitabilidade – não são absolutos, havendo muitas vezes um confronto, conflito de interesse

Com relação a última característica apontada, a limitabilidade dos direitos fundamentais, surge na sociedade atual a discussão no que diz respeito a livre manifestação do pensamento, e quais os limites que eles podem sofrer por parte do Estado.

IV - LIMITES A LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO – GARANTIA OU RETROCESSO?

Direitos e garantias fundamentais como já dito não são absolutos, havendo colisão entre algum desses o interprete ou aplicador do direito deve se valer da máxima da proporcionalidade/relatividade objetivando no caso concreto a ponderação de um sobre o outro, definindo-se assim qual irá prevalecer.

Esses limites não são, e não podem ser impostos de maneira autocrática pelo estado, se encontram na verdade positivados no próprio sistema constitucional, no próprio rol de direitos e garantias fundamentai e em outros dispositivos da Carta Magna.

Passados quase 30 anos da promulgação da Constituição de 1988 o tema liberdade de expressão ainda se faz presente na sociedade brasileira que parece ainda se encontrar sob o fantasma do período ditatorial, onde o direito a livre manifestação de pensamento era cerceado de forma abrupta e arbitraria.

Talvez devido a esse trauma sofrido em tempos não muito remotos, tal temática tem sido recorrentemente discutida pelo Supremo Tribunal Federal, e não somente pelo Pretório excelso, a temática tem sido discutida por todos os setores da Sociedade, que utilizam a internet com suas redes sociais para propor um verdadeiro debate acerca do tema.

O STF em 2011 abordou o tema no julgamento da ADPF 187, referente a chamada “marcha da maconha”, evento que reúne milhares de pessoas em uma manifestação favorável a mudanças nas leis relacionadas a Cannabis, a favor da legalização e regulamentação do comercio e do uso da maconha.

No voto da ADPF e por decisão unânime o STF liberou a realização dos eventos tendo como base a proteção constitucional ao direito de reunião e de livre expressão do pensamento garantem a constitucionalidade da realização do evento.

Grupos contrários a realização do evento utilizavam o argumento de contraponto o artigo 287 do Código Penal, indicando que a marcha faria apologia a utilização de uma substancia proibida, incorrendo dessa forma no crime disposto

Artigo 287 – fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime

Pena- detenção, de três a seis meses, ou multa

Observa-se que nesse ponto o STF se mostrou favorável ao pleno exercício de dois direitos fundamentais que na época do regime militar eram limitados, em seu voto o relator Celso de Mello dispôs:

VIII. A liberdade de manifestação do pensamento: um dos mais preciosos privilégios dos cidadãos Tenho sempre enfatizado, nesta Corte, Senhor Presidente, que nada se revela mais nocivo e mais perigoso do que a pretensão do Estado de reprimir a liberdade de expressão, mesmo que se objetive, com apoio nesse direito fundamental, expor idéias ou formular propostas que a maioria da coletividade repudie, pois, nesse tema, guardo a convicção de que o pensamento há de ser livre, sempre livre, permanentemente livre, essencialmente livre. Torna-se extremamente importante reconhecer, desde logo, que, sob a égide da vigente Constituição da República, intensificou-se, em face de seu inquestionável sentido de fundamentalidade, a liberdade de manifestação do pensamento. Ninguém desconhece que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento.

A liberdade de expressão representa, dentro desse contexto, uma projeção significativa do direito, que a todos assiste, de manifestar, sem qualquer possibilidade de intervenção estatal “a priori”, as suas convicções, expondo as suas idéias e fazendo veicular as suas mensagens doutrinárias, ainda que impopulares, contrárias ao pensamento dominante ou representativas de concepções peculiares a grupos minoritários.

É preciso reconhecer que a vedação dos comportamentos estatais que afetam tão gravemente a livre expressão e comunicação de idéias significou um notável avanço nas relações entre a sociedade civil e o Estado. Nenhum diktat, emanado do Estado, pode ser aceito ou tolerado, na medida em que venha a comprometer o pleno exercício da liberdade de expressão. A Constituição, ao subtrair, da interferência do Poder Público, o processo de comunicação e de livre expressão das idéias, ainda que estas sejam rejeitadas por grupos majoritários, mostrou-se atenta à grave advertência de que o Estado não pode dispor de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre os modos de sua manifestação.

É certo que o direito à livre expressão do pensamento não se reveste de caráter absoluto, pois sofre limitações de natureza ética e de caráter jurídico.

É por tal razão que a incitação ao ódio público contra qualquer pessoa, povo ou grupo social não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão. Cabe relembrar, neste ponto, a própria Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), cujo Art. 13, § 5º, exclui, do âmbito de proteção da liberdade de manifestação do pensamento, “toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência”.

Recentemente a discussão com respeito a liberdade de manifestação do pensamento voltou à tona, tendo as redes sociais exercido um papel de extrema importância na divulgação de ideias a favor ou contrarias a regulação de produções artísticas, mostrando um verdadeiro contraponto de uma sociedade plúrima, livre e democrática,

A exposição de arte intitulada “Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte” reascendeu a discussão a respeito dos limites sobre a arte, e logico refletindo diretamente sobre limites a livre manifestação do pensamento.

De acordo com os criadores e curadores da exposição, o objetivo principal desta era promover a discussão a respeito da diversidade sexual através da arte, no entanto a exposição não foi bem recebida por grupos conservadores que acusaram a mesma de promover pedofilia, zoofilia assim como ser desrespeitoso com símbolos religiosos, propondo que haja controle sobre obras de arte que possivelmente ofendam crianças ou grupo de pessoas

Sofrendo com as críticas divulgadas através das redes sociais, o Banco Santander apoiador da exposição resolveu finalizar esta, tendo em vista as ameaças de boicote a instituição capitaneada pelos grupos conservadores.

Após o cancelamento da exposição no Rio Grande do Sul e com a grande repercussão que o tema gerou, grupos a favor desta organizaram uma manifestação em defesa da liberdade de manifestação artística, culminando no movimento intitulado “#342Artes- contra a censura e a difamação”

Argumentam os apoiadores da exposição, que a arte não pode sofrer limites, o cerceamento do direito de se manifestar livremente atrás da arte não pode ser limitado, o controle poderia nos levar novamente ao que ocorria na época do regime ditatorial, nos levando a um verdadeiro retrocesso no que diz respeito ao direito conquistado.

A respeito do tema liberdade de manifestação do pensamento, JUNIOR,2013,P.673 dispõe: “a ideia é garantir a todos a liberdade de produzir e revelar as suas realizações intelectuais, artísticas e cientificas, independentemente de censura ou licença”.

Mesmo não revestido de caráter absoluto, assim como todos os direitos fundamentais, impor limites a livre manifestação do pensamento, exercida através de produções artísticas ou culturais nos leva novamente a uma linha tênue, a um embate sobre Estado Democrático e Estado Autocrático/autoritário.

CONCLUSÃO

A arte sempre foi utilizada como forma de manifestação cultural, uma forma de manifestar opinião sobre variados temas, e historicamente foi e é utilizada como instrumento de crítica ao governo, seus limites não podem ser regulados pelo próprio Estado ou por determinado grupo de pessoas.

De fato, existem certos limites que devem ser observados quando do exercício da manifestação do pensamento, os limites estão expostos na própria Constituição, no Código Penal e em legislações extravagantes, vedando-se por exemplo atos atentatórios a dignidade humana e preconceituosos que atentem contra raça ou credo, no entanto conclui-se que os limites impostos não podem ser capazes de gerar o cerceamento do direito, nesse contexto deve sempre dar preferência ao direito já adquirido, evitando-se que se ofenda o disposto na Constituição, este vem sendo o entendimento jurisprudencial a respeito do tema.

Palavras chaves – constituição-liberdade de expressão-limites-direitos e garantias individuais.

REFERÊNCIAS:

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_______. DECRETO-LEI.2.848 de 07 de Dezembro de 1940- Código Penal. http//:www.planalto.gov.br. Acesso em: 07/10/2017

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JÚNIOR. Dirley da Cunha. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. Bahia: Juspodivm, 2009.

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Gabriel S Diniz e Auner Pereira Carneiro
Enviado por Gabriel S Diniz em 26/03/2019
Código do texto: T6608461
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