Os pais não podem impor gostos
Sabemos muito bem que as pessoas têm gostos diferentes e, ainda que achemos que uma pessoa tem um gosto horrível, isso não nos dá o direito de criticá-la. E é preciso que os pais lembrem disso, porque, na tentativa de impor gostos e estilos aos filhos, eles podem, inclusive, causar traumas. Claro que, se os filhos forem crianças ou adolescentes, a gente deve orientá-los se achar que algo não é adequado, principalmente se o rapaz ou a moça quiser fazer algo como uma tatuagem. Mesmo assim, é bom tomar cuidado ao orientar. Não devemos fazê-lo baseando-nos em preconceitos,dizendo que tatuagem é coisa de marginal (essa ideia já se tornou absurda nos nossos tempos) mas usar o bom senso. Caso um garoto queira fazer uma tatuagem, diga que pense bem, porque pode ser que ele se arrependa e, afinal, caso mais tarde ele queira removê-la, terá que fazer um tratamento caro a laser e mesmo que remova, a pele nunca voltará ao que era. Já fazer coisas como pintar o cabelo de verde ou usar piercing ou roupas góticas não precisa proibir. Um dia, o adolescente poderá deixar essas coisas de lado e lembrar disso como uma fase. Ou então adotar um estilo permanente. Volta e meia, alguém pinta o cabelo de roxo ou rosa e isso não é problema. Apenas estilo. Se os pais aprovam ou não, devem deixar os filhos livres.
O problema é que, às vezes, os pais seguem um determinado estilo ou têm um certo gosto e querem impor aos filhos, esquecendo que eles são outras pessoas, têm outros conceitos do que seja bonito ou feio. Mesmo que os pais achem que fica bonito nos filhos, não está certo. Para a criança, ser obrigada a usar uma roupa que ela acha horrível ou cortar o cabelo de uma forma pode ser constrangedor. Não importa o que os pais acham, importa que ela não pode ser forçada a adotar um estilo que a faz se sentir ridícula.
Um caso que pode ser usado para dar uma ideia de como os pais não devem obrigar os filhos a adotar o mesmo estilo que o deles é o de uma moça que, quando criança, sonhava ter cabelos grandes, enormes como os das princesas dos contos de fadas. Ela queria poder fazer tranças, penteados elaborados e queria ter cabelo grande para parecer uma princesa. Porém, a mãe, gostava de cabelo curtinho, estilo joãozinho mesmo, e sempre queria que a cabeleireira cortasse o da filha bem curtinho. A menina reclamava que não gostava, que achava feio. E a mãe respondia:"Fica não, filha, fica lindo. Por que você quer tanto ter cabelo grande? Dá tanto trabalho."
Quando a mãe mandou cortar a primeira vez, a filha se sentiu desconfortável, especialmente depois que pegou o ônibus para ir à escola. Todos começaram a apontá-la e rir dela, chamando-a de "careca pelada". Para piorar, ela foi confundida com um menino na escola. Então, ela disse a mãe que não gostava de cabelo curto porque iria parecer um menino. A mãe só dizia que ela não ficava parecendo com um menino e que era besteira pensar nos que a chamavam de "pelada". Mas ela ficava tão constrangida que andava com a mochila atrás da cabeça.
Analisemos bem a situação. A mãe estava certa? Quando a filha dizia que não queria porque iriam rir dela e a mãe respondia que era besteira, ela possivelmente não estava com má intenção. Queria apenas dizer à filha para não ligar. Acontece que a criança enxerga tudo diferente. Quem tem sete ou oito anos quer ser aceito e sofrer tamanha zombaria é traumático. Para a filha, ficou parecendo que a mãe não ligava para o fato de que os outros iriam zombar dela. Soou insensível, como se a mãe houvesse dito que os outros fazerem troça dela era coisa de pouca importância. Não é. Na escola, a criança começa sua vida social e se sentir rejeitada e ridicularizada é danoso. Estudos psicológicos mostraram que muitos casos de depressão e baixa autoestima começaram por causa do bullying, problema que ainda hoje muitos veem como "coisa normal de jovem".
Assim sendo, os pais precisam lembrar que os filhos, ainda que muito jovens, têm outras noções do que seja feio e bonito. Mesmo que eu queira vestir uma filha como princesa porque acho que ela ficará linda, isso não me dá o direito de obrigá-la a fazê-lo. Eu vou achar que ela está linda, mas ela se sentirá ridícula.
No caso da moça que a mãe queria obrigar a usar cabelo curtinho, aliás, esta mãe havia sido criada por uma avó que não a deixava cortar os cabelos. Ela contou essa história à filha quando ela falou que odiava cabelo curto, dizendo: "É? Pois, enquanto você faz manha porque não quer cortar o cabelo, sua bisavó não me deixava cortar o meu. Tanto que, quando ela morreu, a primeira coisa que fiz foi cortar meu cabelo, sabia? Eu odiava ter trabalho com aquele cabelão!"
Engraçado que a mãe, que havia sofrido por causa da atitude da avó, teve uma atitude parecida em relação à filha. Mudou apenas o estilo. Tudo isto só mostra como, para uma criança, pode ser traumático quando aqueles que a criam a obrigam a fazer algo que detesta.