O BRASIL NÃO É BRASIL

“Por que ninguém nos leva a sério? Só o nosso minério?” (Edimar Rocha)

Claudio Chaves

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Hoje, 19/12/2018, fazem 17 dias do desaparecimento do avião monomotor Minuano, prefixo PT-RDZ, com o piloto Jeziel Moura (o Moita) e cinco (ou sete) indígenas das etnias tiriyó e akurió.

Segundo declarações da família do piloto e informações da Imprensa, o avião fazia um voo de rotina para transportar índios da aldeia Mataware, localizada em alguma parte paraense do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, cuja maior parte fica no Estado do Amapá.

Ainda segundo a Imprensa regional, a Força Aérea Brasileira (FAB) e o Exército suspenderam as buscas, nesta segunda-feira, 17/12, depois de sobrevoar 12.550 km2, em 128 horas de voo, porém sem sucesso.

A família de Jeziel, principalmente os filhos, têm feito reiterados apelos para que buscas por terra sejam empreendidas. Também, desse início, apelaram às autoridades responsáveis que permitissem outros pilotos (particulares), que conhecem Jeziel e a área por onde ele sobrevoava quando perdeu a comunicação com o solo, participarem das buscas; o que fora, segundo a família, desautorizado.

Há informações de que o plano de voo, bem como a situação de registro da aeronave não respeitavam as determinações legais, o que não interfere nas buscas, em si; pelo contrário, deveria torná-las mais necessárias até.

O que salta aos olhos, porém, não é o insucesso, até agora, das missões de busca, mas o silêncio de Brasília e da Imprensa nacional.

Mais de 400 horas já se passaram. Nesse período, apenas rápidas inserções em telejornais nacionais foram exibidas no início do acontecido.

No mesmo período, no entanto, casos como de caça ilegal de animais, abandonos e maus-tratos de cachorros (que também são assuntos relevantes) têm sido manchete nesses telejornais, em horário nobre, merecendo cobertura ao vivo, investigação (jornalística e policial) e pronunciamento de autoridades, exatamente o contrário do caso Moita.

Por que tanta [in]diferença? Não se trata do mesmo país?

Não. Definitivamente não! Não estamos falando do mesmo país. O Brasil não é Brasil. O Brasil são vários Brasis.

Tem, por exemplo, o Brasil dos homens e mulheres civilizados, o Brasil urbanizado, industrializado e das cidades universitárias, dos grandes centros de pesquisas e dos shopping centers do Sul e do Sudeste – o brasil onde os médicos não se recusam a trabalhar, mesmo que o salário, por vezes, seja o de um técnico de nível médio – versus o Brasil ribeirinho, do caboclo, do índio, do quilombola, do garimpeiro, das cidades palafitas, da malária... Desse Brasil, via de regra, ao outro só interessa basicamente o seu subsolo, a mão-de-obra de seus moradores para extrair as riquezas da floresta e lhas transferirem in natura, sem nenhum valor agregado, para gerar empregos e riqueza em outras paragens. Ah, interessa também, o esforço destes miseráveis para manter a floresta em pé, para ser usada como vitrine na hora de vender este Brasil aos gringos, em troca de polpudas quantias de dólares, euros, ienes...

Há o Brasil dos mortais comuns (os ordinários), aqueles que podem, com um salário de menos de mil reais, alimentar a família, custear o ensino dos filhos, mantê-los saudáveis e, não raras vezes, pagar o aluguel do teto no qual se abrigam; e o Brasil dos seres supremos (os extraordinários), aqueles que ganhando entre 16 mil e 39 mil reais, necessitam, e por isso lhes são assegurados auxílios básicos e indispensáveis, como: moradia (ainda que possuam até imobiliária na cidade em que moram e trabalham), plano de saúde, bolsa de estudos para os filhos, mesmo maiores de idade, refeitório no trabalho e até academia para si e seus familiares.

Há o Brasil dos que lutam pelo direito de permanecer na terra de sua ancestralidade e nela plantar e colher pelo menos o suficiente para alimentar a própria família, porém são tratados por muitos, incluindo autoridades federais, como vagabundos, terroristas e criminosos; e o Brasil dos grandes latifundiários, que, com todo o apoio de autoridades legais, grilam imensas áreas de terra, expulsam ou (em caso de resistência) matam os habitantes originários para estabelecerem seus negócios; porém são considerados “tec, pop...tudo”.

E, por fim, há o Brasil da badalação, o Brasil da informação, da comunicação, aquele que concentra o monopólio desse tipo de serviço (garantido constitucionalmente como direito inalienável de todo brasileiro); o Brasil onde estão as grandes emissoras de televisão, os grandes jornais e toda a sorte de produção de mídia e conteúdo informativo para o mundo. E há o Brasil do silêncio, do esquecimento e da indiferença, tanto da poderosa e monopolizadora Imprensa nacional quanto dos cretinos, ambiciosos, egoístas e covardes representantes políticos desse Brasil miserável, onde, como bem afirmava o saudoso e sábio deputado Justo Veríssimo, a única coisa que interessa a esses homens bons da Política é o voto.

É claro que em tudo isso há as raras e justas exceções que, jamais, devemos deixar de reconhecer e valorizá-las. A regra, porém, não é outra:

quando se trata de Norte,

ao se se referir as suas riquezas naturais, usa se o S no lugar do N.

Porém, ao se tratar da vida de seus habitantes, emprega-se o M.

Resta-nos, por enquanto, além da quase imortal esperança (não apenas de esperar, mas de esperançar), essa característica de todo autêntico filho (nascido ou adotado) deste Brasil do lado de cá, o consolo, mesmo na forma de indignação da inspiração do poeta que, incrédulo, pergunta (e adverte aos desavisados): “Por que que todo mundo teme? Norte não é com ‘M’”.