Dia da Consciência Negra e um Experimento Social
Fiz um experimento nestes dias. Entrei em um grupo de ateus no Facebook e deixei que me vissem como um religioso evangélico. Fiz a defesa da Bíblia e rebati seus os argumentos, a maioria falaciosa e preconceituosa, contra a religião.
Muito interessante é que ao defender uma opinião contrária a do grupo me enquadrei dentro da tipologia deles. A religião seria um instrumento de fanatização dos ignorantes, que leva a intolerância e violência. Isto era muito obvio pra eles.
Eu como religioso, era o ignorante, bobo, inflexível, cabeça pequena, nas palavras deles. Alguém fácil de ser enganado e que provavelmente não teria inteligência para enxergar além das "amarras" religiosas. Como tal, eu já não deveria ser levado a sério e tudo o que eu diria serviria para deboche ou para reforçar o que eles já pensavam.
Tudo o que eu falasse já tinha uma razão que não era a que eu pretendia informar. Era contrária ao que eu pretendia e ao que estava fazendo. Eu era o crente alienado, que não sabia o que estava dizendo e que só falava aquilo por que tinha a cabeça feita pela igreja.
Tive o cuidado de rebater e apresentar os limites das colocações deles, por mais que estivesse argumentando dentro da lógica, o fato de me enquadrar como religioso já dava o tom de como ler e o que esperar do que eu escrevia.
Pude ver isto, por não ter um envolvimento emocional com o que estava defendendo, coloquei o que pensava de forma lógica e questionava coisas pouco claras.
O mais intrigante foi perceber que mesmo argumentando havia já uma confiança no que eles acreditavam e uma indisposição em aceitar o que eu apresentava.
O mais notável é que não perdi as discussões, não falei algo idiota que fosse facilmente rebatido e nem deixei questões sem resposta. Não era sobre ser o bobo do grupo, o ingenuo ou o fraco, mas sobre já estar enquadrado dentro de um estigma - e a partir disto a leitura do meu comportamento escapava do meu controle como agente social.
Penso que o mesmo ocorra em relação a certas minorias sociais como negros, mulheres e LGBT's. Quando temos grupos sociais cujos os valores predominam em uma sociedade, tudo que esta de fora ou que não pode ser inteiramente incluso dentro de seus valores e papeis respeitados sofrem com a mesma exclusão.
Se eu que tive a situação sobre controle, defendendo coisas que habitualmente não defendo, fiquei incomodado, imagina que não possa se defender e nem tem o distanciamento necessário para tal?
Este grupos que detêm o poder econômico e político tem também o poder de influenciar os valores nas esferas subalternas, e de repente sua forma de pensar, seus valores e visões de mundo se tornam a medida para avaliar todos os demais.
Por isto datas como o Dia da Consciência Negra são importantes para que os negros tenham reconhecida sua importância e seu direito. Por que a tendência é que eles como minorias sofram com valores e vivências que lhe são estranhas, mas nem por isto menos impositivas e violentas sobre suas identidades e maneiras de ser.
A questão colocada de forma mais simples é: é possível ser negro, identidade, valores e sua cor, e ao mesmo tempo ser aceito como tal? Sem ter que se explicar ou provar muito mais do que exigido ao outro sua competência? Ser colocado em teste, dúvida e subestimação o tempo todo por sua cor? Ou mesmo fazendo o seu melhor não ser reconhecido como alguém digno de voz?
Aqueles que acham que isto é vitimismo, deveria fazer uma experiência destas. Se apresente como uma minoria ou portador de uma doença em certos grupos, depois faça o mesmo se apresentando como um homem ou alguém sem estigmas. Compare a forma como será tratado e imagine sendo tratado assim o resto de sua vida. Como seria suas expectativas e como você se veria diante dos demais?
Ps.: Grupos de ateus tendem a ser mais críticos e menos dogmáticos do que outros, mesmo de religiosos, no entanto o comportamento deles repete aspectos típicos de qualquer grupo fechado.