UMA HISTÓRIA SILENCIADA

"A África tem uma História” (Joseph Ki-Zerbo).

A África que poucos conhecem não se fecunda simplesmente no contexto árido e desértico. É preciso desmitificar o processo de socialização da História Africana ao longo da História Total; um contexto que foi bestializado, esquecido e que sobreviveu ao longo dos séculos através da oralidade.

Apresentemos a História Africana, eliminando as representações distorcidas sobre a mesma. “Desbestializando” uma história que até poucos anos era apagada.

O estudo da história das sociedades africanas é de suma importância, pois África é o berço da humanidade (CHARLES DARWIN, 1871), ela que propiciou a mestiçagem e o desenvolvimento da raça humana, não só a raça, mas a cultura que está presente em todo o planeta, através da oralidade, religiosidade, costumes, comportamentos etc.

Neste trabalho buscaremos descrever a África conhecida por poucos, eliminando os discursos de inferioridade, visando deletar a ideia de homogeneidade do continente africano, que erroneamente é classificado como um território desértico, distante da civilização.

A África, não é a civilização “extraterrestre” do planeta; como diz Eliesse dos Santos, para romper com os estereótipos, se faz necessário estudar a cultura dos povos que ali viveram e vivem; analisando as estruturas sociais, políticas, religiosas e econômicas.

A concepção que muitos têm sobre o continente africano é de guerras, de conflitos étnicos, de pobreza e de paisagens peculiares, como as florestas, savanas e grandes desertos. A África é uma massa de terra emersa contínua, com cerca de 30,2 milhões de km², o que corresponde a 22% das terras emersas do planeta. O território africano tem 8.050 km no sentido norte-sul e 7.560 km no sentido leste-oeste. Possui uma população de mais de 1 bilhão de habitantes, correspondente a 14% da população mundial (NATIONAL GEOGRAPHIC, 2008, p.6).

Segundo Adas (2011), o principal rio africano, o Nilo, com 6.671 quilômetros, é resultado da confluência de cursos de água que nascem em planaltos. “No Planalto vulcânico da Etiópia, nasce o Rio Nilo Azul, que se desloca em direção ao noroeste, desaguando no Rio Nilo Branco, cuja nascente está no lago Vitória”.

O Rio Nilo tem significativa importância para a civilização que se desenvolveu nessa região no passado até os dias atuais, de acordo com Vesentini e Vlach (2009, p.201) isso "explica porque a maioria da população das principais cidades do Egito (Cairo, Alexandria, El Giza) e do Sudão (Crtum e Ondurman), está situada às suas margens”.

O espaço geográfico africano em algumas regiões foi de suma importância para a ocupação e desenvolvimento econômico em relação a outras que por diversos elementos já citados acima são prejudicadas.

A migração e o deslocamento de povos é o contexto que circunda a história deste continente. As migrações internas e externas no continente africano é um dos grandes fatores que prejudicaram a economia dos países africanos.

Diversos historiadores citam a importância dos mulçumanos e europeus na construção do contexto africano. Os povos do Oriente Médio e Mediterrâneo levaram para a região norte da África seus costumes, crença, comida, enfim, o seu modo de vida. Mas é preciso ficar atento para não difundirmos “uma história única". Como afirma a romancista Chimamanda Adichie: “Uma história não autêntica culturalmente”, corremos o risco de um mal-entendido, promovendo o exílio da verdade.

O continente africano passou por diversas transições, tratados e conflitos que foram de grande importância para as drásticas transformações na organização política, econômica e cultural da maioria dos povos africanos. Divisões que causaram dor, conflitos, um ranço que marcou a história da África. Um movimento em prol do poder que resultou na reorganização do espaço africano de acordo com os interesses dos diversos colonizadores.

O Tratado de Berlim foi também um dos elementos de grande transformação na organização política, econômica e cultural da maioria dos povos africanos. O movimento europeu em prol do poder resultou na reorganização do espaço africano de acordo com seus interesses capitalista. Mas os chefes africanos não aceitaram esta reorganização desfavorável das suas comunidades, surgindo uma relação amistosa, partindo os europeus para o confronto militar, objetivando a dominação territorial.

A partir da análise do texto de Selma Pantoja, Angola e Brasil Nas Rotas do Atlântico Sul, percebesse o interesse dos comerciantes nos escravos africanos. O tráfico dos africanos se vinculava com o cultivo de cana-de-açúcar e mão-de-obra, ficando claro que o tráfico tornava-se possível graça a violência e o mercado de trocas entre os colonizadores e os militaristas africanos

A África do Sul foi uma região dominada por colonizadores ingleses e holandeses que logo após a Guerra dos Boeres (1902), definiram a política de segregação racial, objetivando o domínio sobre a população nativa. Regime de segregação racial, conhecido como apartheid, oficializando-se com a decretação do Ato de Terras Nativas e as Leis do Passe.

Precisamos desvincular a história das sociedades africanas da amplitude eurocêntrica, compreendendo sua história além do mercantilismo e do tráfico negreiro, ou, da colonização efetiva. Rompemos com o essencialismo e analisemos a pluralidade cultura em suas múltiplas dimensões.

Precisamos encontrar os elos “pedidos” da História Africana, analisando a origem, as ramificações e os processos de sedimentação de uma identidade etnocentricamente moldada diante do olhar do outro.

O prof. Edmilson aborda em sua tese A Introdução Conceitual Para a História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a importância da inclusão da História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nos currículos escolares. Concordo com Edmilson, em incluir a africanidade nos conteúdos programáticos das escolas brasileiras, mas surge uma necessidade da investigação, destacando os estereótipos, as falsas imagens sobre a África e as sociedades africanas; promovendo irreflexões das bibliografias estudas a visão de seus autores, e sua correlação com o movimento de luta pela igualdade com relação à legitimidade do negro enquanto sujeito do processo histórico.

A Coleção História Geral da África é um projeto que pragmaticamente reorganiza a história da África, promovendo temáticas polêmicas, dando ênfase ao grito de uma história até então bestializada, silenciada pelos estereótipos, pelo racismo camuflado. Um arcabouço literário e historiográfico, que ricamente resgata a história africana, absorvendo os diferentes fatos e discursos, caminhando para uma “história totalizante”.

“O fato de trazer uma história da África escrita em sua maior parte por autores africanos, numa obra de alcance internacional, também contribui para que se construa um olhar mais respeitoso sobre a produção de conhecimento no continente.” (Mônica Lima, 2012).

Em suma, digo que nós pesquisadores da História Africana possuímos as ferramentas necessárias para desbravar as barreiras impostas pelo etnocentrismo. A discussão só está começando, coloquemos em pauta o avanço dos debates e das ações a favor dos movimentos pela igualdade racial. “Enquanto a cor da pele for mais importante que o brilho dos olhos, haverá guerra”. (Bob Marley)

Referências

ADAS, M.; ADAS, S. Expedições geográficas. São Paulo: Moderna, 2011.

ATLAS National Geographic - África I. São Paulo: ATLAS National Geographic, abril,

2008. v. 9.

CHIMAMANDA, A. "Os perigos de uma única história", http://www.geledes.org.br/em-debate/colunistas/4902-chimamanda-adichie-o-perigo-de-uma-unica-historia (texto); "http://www.ted.com/talks/lang/pt/chimamanda_ adichie_ the_danger_of_a_single_story.htm (vídeo), acessados em 05/04/2012.

ENCICLOPÉDIA Barsa. São Paulo: Barsa Planeta Internacional Ltda, 2002. v. 01.

FAGE, J.D. História da África, Lisboa: Edições 70, 1995.

KI-ZERBO, J. História geral da África, I: Metologia e Pré-história da África/ editado por Joseph. Ki- Zerbo.2º Ed. Ver. Brasília: UNESCO, 2010.

LAMBERT, J-M. História da África Negra, Editora Kelps, 2001

Muryatan S. B. "Perspectiva africana na História Geral da África". Trabalho apresentado no Simpósio Temático de que África estamos falando: perspectivas da pesquisa histórica e do ensino de História da África , XXVI Simpósio Nacional de História da ANPUH, São Paulo, 17 a 22 de julho de 2011.

SILVA, A. Continente Africano. Minas Gerais, 2014

SILVA, A. S. O Memorial Antonieta de Barros: como veiculo de disseminação

da informação. 2004. 57 f. Trabalho de Conclusão de Curso – Centro de Ciências humanas e

da Educação, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2004.

THORNTON, J. A África e os africanos na formação do Mundo Atlântico, Rio de Janeiro & São Paulo: Campus Elsevier, 2003

VÁRIOS (um organizador por volume), História Geral da África, 8 volumes, Brasília: UNESCO/Ministério da Educação do Brasil/Universidade Federal de São Carlos, 2010.

WALDMAN, M. & SERRANO, C. Memória d'África: A Temática Africana em Sala de Aula, São Paulo: Cortez, 2007.

Dhiogo J Caetano
Enviado por Dhiogo J Caetano em 13/10/2018
Código do texto: T6475047
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.