PARA ENTENDER O PRESENTE: A PSIQUE DAS MULTIDÕES

Os trechos abaixo, de autoria de LE BON, foram transcritos por Sigmund Freud no estudo “A psicologia das massas e análise do eu”, (Editora L&PM, volume 1106, de maio/2017 – citados entre ás páginas 39 e 52).

Os estudiosos, mesmo nascidos no século retrasado, dizem muito sob o momento atual das mídias eletrônicas.

Hoje, ao contrário de antigamente, as “massas” ou “multidões” não se reúnem mais num espaço físico, mas num campo cibernético.

Mesmo assim, os comportamentos são iguais, como o leitor pode conferir:

"O que há de mais singular numa massa psicológica é o seguinte:

quaisquer que sejam os indivíduos que a compõem,

por mais semelhantes e dessemelhantes

que sejam seus modos de vida,

suas ocupações, seu caráter, ou sua inteligência,

a mera circunstância de sua transformação numa massa

lhes confere uma alma coletiva, graças à qual sentem,

pensam e agem de modo diferente do que cada um deles sentiria,

pensaria e agiria isoladamente.

Há idéias e sentimentos que só surgem

ou se transformam em ações nos indivíduos ligados numa massa.

A massa psicológica é um ser provisório

constituído por elementos heterogêneos

que por um momento se ligam entre si,

exatamente como por meio de sua união

as células do organismo formam um novo ser

com qualidades inteiramente diferentes das células individuais".

.....

“Na massa, apagam-se as aquisições dos indivíduos,

e com isso desaparecem suas singularidades.

A superestrutura psíquica,

que se desenvolveu de maneira tão diversa nos indivíduos,

é removida, enfraquecida, e o fundamento inconsciente,

semelhante em todos eles, se torna visível e ativo.

Desse modo se produz uma caráter novo nos indivíduos,

Novas qualidades que antes não possuíam.

O indivíduo na massa, pelo mero fato de quantidade,

adquire um sentimento de poder invencível,

que lhe permite entregar-se a instintos que,

sozinho, necessariamente teria refreado.

Ele terá ainda menos motivos para refrear

quando considera que,

Devido o caráter anônimo, e por conseguinte, irresponsável,

desaparece inteiramente o sentimento de cautela

que sempre detém os indivíduos.”

....

“O contágio, contribui igualmente para produzir nas massas

a manifestação de características especiais

e ao mesmo tempo a sua orientação.

Esse contágio é um fenômeno fácil de constatar,

mas inexplicável, do tipo hipnótico.

Na multidão, todo sentimento, todo ato é contagioso,

e isso em grau tão elevado que o indivíduo facilmente

sacrifica seu interesse pessoal em prol do interesse coletivo.

Essa é uma aptidão inteiramente contrária à sua natureza,

da qual o homem só é capaz

na condição de membro de uma multidão."

...

Uma terceira causa, e na verdade a mais importante,

determina nos indivíduos reunidos numa massa

qualidades especiais que são contrárias às do indivíduo isolado.

Falo aqui da sugestionabilidade, da qual o mencionado contágio,

Aliás, é apenas um efeito.

Para compreender esse fenômeno cabe ter presentes

certas descobertas recentes da fisiologia.

Sabemos agora que, mediante procedimentos variados,

um ser humano pode ser colocado num estado tal que,

depois de perder sua inteira personalidade consciente,

obedeça a todas as sugestões daquele que o privou dela

e cometa os atos mais contrários ao seu caráter

e a seus hábitos.

Um indivíduo mergulhado por algum tempo

no seio de uma massa ativa

Logo se encontra num estado particular

que muito se aproxima da fascinação

que comete o hipnotizado sob a influência do hipnotizador.

A personalidade consciente desaparece por inteiro,

A vontade e o discernimento estão ausentes,

todos os sentimentos e pensamentos se orientam

na direção estabelecida pelo hipnotizador.

....

O indivíduo não tem mais consciência dos seus atos.

Nele, como no hipnotizado,

enquanto certas faculdades estão suspensas,

outras podem ser levadas a um grau de intensidade extrema.

Sob a influência de uma sugestão, ele se lançará

com um impulso irresistível à execução de determinadas ações.

E esse ímpeto é ainda mais irresistível nas massas

do que no hipnotizado,

pois a sugestão, que é a mesma para todos os indivíduos,

aumenta devido à reciprocidade.”

...

Portanto, as principais características do individuo

que se encontra nas massas

são o desaparecimento da personalidade consciente,

predomínio da personalidade inconsciente,

e orientação dos pensamentos e sentimentos na mesma direção

por meio da sugestão e do contágio,

com tendência à execução das idéias sugeridas.

O indivíduo não é mais ele mesmo;

tornou-se um autômato desprovido de vontade.”

...

“Além disso, pelo mero fato de pertencer a uma massa organizada

o ser humano desce vários degraus na escala da civilização.

No seu isolamento era talvez um indivíduo culto;

Na massa é um bárbaro, isto é, um ser instintivo.

Possui a espontaneidade, a violência, a ferocidade

e também o entusiasmo e o heroísmo dos seres primitivos.

A massa é impulsiva, instável e irritável.

Ela é guiada quase que exclusivamente pelo inconsciente.

Os impulsos aos quais a massa obedece podem,

segundo as circunstâncias, ser nobres ou cruéis,

heroicos ou covardes,

mas em todo caso são tão imperiosos

que o interesse pessoal não se fará valer,

nem sequer o interesse da autoconservação.

Nada nela é premeditado.

Por mais que ela queira as coisas apaixonadamente,

nunca as quer por muito tempo;

ela é incapaz de uma vontade durável.

Não tolera nenhuma demora entre o seu desejo

e a realização do desejado.

Ela tem um sentimento de onipotência;

para o indivíduo na massa,

a noção de impossibilidade desaparece.

...

A massa é extraordinariamente influenciável e crédula;

É desprovida de crítica;

Para ela o improvável desaparece.

...

Os sentimentos da multidão são sempre muito simples

e exagerados.

Assim, ela não conhece nem a dúvida e nem a incerteza."

...

A suspeita logo se transforma em certeza irrefutável;

Um germe de antipatia se transforma em ódio selvagem.”

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Amigos, a internet facilitou a comunicação entre as pessoas; possibilitou o encontro de indivíduos que partilham interesses comuns; mas que, por parecer um campo de “anonimato”, como num baile de máscaras realizada no escuro, faz brotar toda sorte de sentimentos – uns bons, outros maus.

Daí a importância de estudar os grandes mestres;

àqueles que se debruçaram sobre a questão em estudo científico.

É importante conviver com as multidões;

É importante o avanço científico.

Mas, mais importante ainda, é continuar a pensar como indivíduo.

Nosso caráter individual é quem colocará freio aos excessos maléficos.

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Gustave LE BON, publicou “Psicologia das multidões”, em Paris, no ano de 1895.

LE BON, (07/05/1841 a 13/12/1931), foi físico, psicólogo social e sociólogo.

Foi o autor de várias obras nas quais expôs teorias de características humanas: superioridade racial, comportamento de manada e psicologia das massas.

Sua obra sobre psicologia de massas tornou-se importante e foiusada por pesquisadores das mídias, tais como Freud, Hadley Cantril e Blumer, para descrever as reações de grupos subordinados à mídia.

No Brasil, as ideias de Le Bon exerceram notável influência sobre o escritor brasileiro MONTEIRO LOBATO, em especial no romance “O Presidente Negro”, (publicado em 1927).

Se puder compre e leia as obras citadas.

Hoje são encontradas no formato “Pocket”

e custam uma merreca.

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Obrigado pela leitura.

Araçatuba/Baguaçu – outubro de 2015 + 3

SAJOB