O TEMPO ONTOLÓGICO E O MOVIMENTO, COMO CONDIÇÔES E ORGANIZAÇÃO, DA NATUREZA E DO HOMEM, EM PLATÃO
O TEMPO ONTOLÓGICO E O MOVIMENTO, COMO CONDIÇÔES E ORGANIZAÇÃO, DA NATUREZA E DO HOMEM, EM PLATÃO
Jhonatan dos Santos Oliveira
RESUMO
Como sabemos o tempo e o movimento estão presentes na vida de cada um de nós de forma direta ou indireta. Na maioria das vezes esquecemos e não compreendemos suas grandezas, dimensões e o impacto que o tempo/movimento provocam em nossa existência. Por vezes esquecemos que somos transformados por eles, em sua concepção, pois, eles passam e se transformam, nisso nós passamos e nos transformamos com eles. Nós usamos o relógio, seja ele analógico ou digital para organizar artificialmente a nossa vida, enquanto a natureza por sua vez, usa de seu relógio biológico por ser próprio de sua condição. Este artigo tem por objetivo analisar os conceitos de tempo e movimento tendo como base o diálogo de Platão com Timeu. Desta forma, espera-se contribuir para uma reflexão sobre os impactos que o tempo e o movimento influenciam ontologicamente na natureza e na ação do homem no mundo.
Palavras-chave:Tempo, Movimento, Condição, Organização e Ontologia.
Sumário
Sumário: Introdução. 1.Origem do tempo e do movimento no mundo Material. 2.Funções, condições e sentido do tempo/movimento da natureza e do homem. Conclusão. Referências.
Introdução
Este trabalho está baseado no pensamento de Platão, um grande filósofo clássico do século IV a.C, busco por meio deste analisar os conceitos de Platão no que diz respeito ao tempo e ao movimento que ele expõem no meio de Seu diálogo com Timeu.
Com essa obra Platão tenta estabelecer uma explicação do mundo num todo, englobando todos os detalhes do mesmo. Este trabalho buscará apresentar o conceito do filósofo de tempo e movimento no mundo, fazendo um caminho para que entendamos e compreendamos cada vez mais estas dimensões, não nos limitando a pensa-los apenas como um relógio.
Platão é um filósofo que assim como Sócrates e os outros do período clássico, buscam encontrar a essência, princípio e fim de todas as coisas. Na concepção de Platão, o tempo e o movimento participam efetivamente desta busca pelo princípio da vida. No entender do filósofo a vida é concebida a partir dos dois mundos (sensível e Inteligível), que se articulam para organizar o mundo incluindo a dinâmica do tempo e do movimento.
A maioria das pessoas nem sempre param para pensar no tempo e no movimento, não param pra pensar na relação de dependência de cada um, deixando pra lá cada detalhe na profundidade desse assunto. Contudo todo o tempo e o movimento tem fundamento em tudo, e principalmente nas leis que regem a natureza e cada um de nós. Nós vivemos nossa vida muitas vezes presos nas nossas rotinas e as vezes não aproveitamos nada. No entanto, com movimento, o tempo inevitavelmente passa num piscar de olhos e nós passamos com ele.
Platão, no diálogo com Timeu, possibilita analisar como se dá a organização da natureza e do homem no convívio com o tempo e o movimento. Deste diálogo nos interessa levantar pelo menos três questões que nos parece objetivar nosso artigo: Com as teorias e propostas de organização da natureza e do homem feitas por Platão, buscará uma iluminação para entendermos tal organização. Será que o homem tem o tempo e o movimento em seu favor? Pode o tempo e o movimento nos escravizar? E ainda, será que não passam de coisas superficiais?
1. Origem do tempo e do movimento no mundo material.
O filósofo Platão foi um revolucionário quando propõe o tão famoso mundo das ideias, pois até então, as ideias de Sócrates se prendiam apenas a este mundo, ao mundo sensível e material. Platão então se diferenciou em idealizar tudo como se fossem dois mundos distintos: o mundo sensível (material, das experiências e sensações) e o mundo inteligível (ideias, das formas e idealizações perfeitas de tudo). Ele afirma que tudo é preexistente, eterno e imutável, sendo por seu tempo transcendental (sem começo, sem meio e nem fim) dessa forma,
Como dissemos, a intervenção de Timeu versa sobre o processo de criação do mundo e de todas as coisas que o habitam: Homem, restantes animais, deuses e até as plantas. Trata-se, pois, de uma tentativa de estabelecer um modelo explicativo do mundo assente em axiomas e pressupostos sólidos: uma cosmologia. (PLATÃO, 2011, p. 31).
Platão refere-se ao mundo material sendo ele um caos, em que é todo desorganizado. Para dar resposta a atual organização e desaparecimento do caos, recorre ao mundo das ideias (sendo todas as coisas perfeitas) e ao mundo material sendo uma cópia imperfeita do outro mundo, organizado todo por demiurgo (inferior ao mundo das ideias e superior ao mundo material) que depois de ter contemplado o mundo Ideal, decidiu construir o universo material tendo como espelho o mundo das ideias, assim mesmo como nos afirma:
Como “construtor”, o demiurgo empreende uma actividade mimética. Ao criar o mundo sensível por meio da imitação do arquétipo, assemelha-se em grande medida a um artífice, que, antes de produzir alguma coisa, tem em conta uma forma da qual assimilará as propriedades que fará corresponder no material que trabalha. Assim, põe os olhos nas coisas que se mantêm sempre iguais (as Ideias). Partindo deste conhecimento prévio, age sobre o material de modo a dotá-lo de ordem, pois que antes estava desordenado (PLATÃO, 2011, p.39).
Demiurgo também foi responsável por construir os nossos corpos que são "carcaças" de nossas almas imortais, que por sua vez depois de cometerem certas falhas foram condenadas do mundo das ideias ao mundo material como forma de purificação, então as almas pelos corpos matérias (em que agora se encontram estão esquecidas do mundo das ideias), porém, ainda podem se purificar, lembrar do mundo das ideias por meio da razão e retornar ao mundo inteligível.
No mundo material já havendo antes espaço e matéria, demiurgo buscou deixá-lo o mais igual possível, pois a perfeição estaria não só no mundo das ideias mais também no mundo da matéria; porém, com suas limitações não conseguiu deixar o mundo material tão igual assim, sendo esse então o erro dele, deixando ambos diferentes; apelando assim, Platão deu início para o princípio de "causa errante", onde por um motor primeiro teria dado início no mundo material: o tempo ontológico (onde contem começo, meio e fim) e o movimento, mesmo ambos sendo imperfeitos já que não participam da perfeição do mundo das ideias. O motor primeiro também observado e sugerido por Platão (além da diferença desta imperfeição) precisa de dois motores: um corpóreo e o outro a alma, o corpo como um motor que precisa antes de um movimento, para ser movido antes de se mover, e a alma sendo o motor que tem em si o princípio de seu movimento.
Todo este tempo ontológico e este movimento têm um papel muito importante na vida da natureza e na vida do homem, pois desta forma buscam um tipo de organização (mesmo não sendo perfeito, não é mais o caos de antes, por causa do mesmo tempo ontológico e movimento!), sendo a própria organização feita por demiurgo.
A partir de tais considerações é possível analisar em que condições e sentido podem o tempo/movimento interferirem na natureza e no homem.
2. Funções, condições e sentido do tempo/movimento da natureza e do homem.
Para Platão, como afirmado, o tempo ontológico que contém começo, meio e fim e o movimento foram deixados por demiurgo na sua organização do mundo material, feitos com o máximo possível à imagem do mundo das ideias. Tal tempo e movimento deram início às leis da física neste mundo (universo, natureza) assim que foi aplicado ao mundo, tal como mais tarde Newton afirmaria: "[...] Primeira Lei: Todo corpo permanece em estado de repouso ou de movimento retilíneo uniforme, a menos que atuem sobre ele forças externas que alterem este estado [...]" (DARWIN apud OLIVEIRA, 2005, p.3). O movimento e tempo estão também relacionados a distância e velocidade, já que a velocidade é igual a distância dividida pelo tempo. Uma vez que as leis (organização) foram aplicadas à natureza, elas não funcionariam e não seriam as mesmas sem o tempo e sem o movimento.
Esta ordem natural das coisas acontece em tudo em que conhecemos, pois, a nossa volta está cheio de tempo ontológico e movimento (dando como na física também velocidade e distância). Assim nos astros também existem tais leis, como nos afirma Platão:
A partir do raciocínio e do desígnio de um deus em relação à geração do tempo, para que ele fosse engendrado, gerou o Sol, a Lua e cinco astros, que têm o nome “planetas”, para definirem e guardarem os números do tempo. Tendo construído os corpos de cada um deles – sete ao todo –, o deus estabeleceu-os nas órbitas que o percurso do Outro seguia, em número e sete delas: na primeira a Lua, à volta da Terra; na segunda o Sol, por cima da Terra; a Estrela da Manhã e o astro que dizem ser consagrado a Hermes na rota circular que tem a mesma velocidade que o Sol, ainda que lhes tenha cabido em sorte um ímpeto contrário ao dele (2011, p.111).
Para podermos também definir melhor a velocidade precisamos de alguns axiomas, e assim foi dado por meio do sol e da terra, dividindo primeiramente o dia da noite e depois disso saiu outros axiomas capazes de organizar o mês e o ano. Em Platão encontramos as razões de tais axiomas pois:
Para que houvesse uma medida evidente para a lentidão e para a rapidez com que se cumprissem as oito órbitas, o deus instalou uma luz na segunda órbita a contar da Terra, a que agora chamamos Sol, de modo a que o céu brilhasse ainda mais para todos e que os seres-vivos aos quais isso dissesse respeito participassem do número de modo a ficarem a conhecer a órbita do Mesmo e do Semelhante. Deste modo e por estas razões foram gerados a noite e o dia – o percurso circular uniforme e regular. Temos um mês quando a Lua, depois de ter percorrido o seu próprio círculo, alcança o Sol; temos um ano depois de o Sol ter percorrido o seu próprio círculo (PLATÃO, 2011, p.112-113).
O homem, assim como tudo, tem seu tempo oferecido pela natureza. Pode ele administrar seus horários; por exemplo: o homem maduro, vendo que é mais fácil viver e sobreviver à luz do sol (dia), deixa a sombra (noite) para descansar, tendo por isso que administrar o tempo propício para o trabalho, em que garante a sobrevivência do seu corpo, pois, nas suas condições ele se vê necessitado de alimento. Sem dizer também, de todo o tempo gasto para administrar sua vida social, pois, o mesmo nunca se encontra sozinho.
Outra verdade detectada nas horas do dia é a possibilidade de organizar o seu tempo. Percebemos que o dia possui climas e temperaturas diferentes que criam ambientes para diferentes tarefas. [...] É preciso doar tempo para a família. É preciso doar tempo para o trabalho. É preciso doar tempo para o descanso. Esses procedimentos geram qualidades de vida para quem os pratica. Usar o tempo com equilíbrio traz saúde para o corpo e para a alma (SOUZA, 2013, p.244).
A natureza pela "causa errante" está inteira em movimento, pois ela é uma imagem móvel da eternidade, não se cria algo novo do nada (precisa de matéria e energia para isso), por tanto, a natureza em si está a todo o tempo se transformando, assim como nosso corpo, em que agora "é" e no "amanha" "não será" mais. Podemos deduzir que para Platão há uma alma imortal que não pode ficar todo o tempo de purificação em apenas um corpo, pois tal corpo se degenera por doenças e/ou pelo próprio tempo, dando lugar a outra forma (outra transformação da natureza), e a alma transmigra-se para outro corpo, pois o corpo assim como tudo no mundo material tem um tempo ontológico, tem um começo, um meio e um término. Por fim, Platão nos afirma que
[...] os elos dos triângulos que estão unidos em torno da medula já não aguentam e são separados pelo esforço, desprendem os laços da alma, que, ao ser libertada de acordo com a natureza, desvanece-se de forma aprazível; é que tudo o que acontece em desacordo com a natureza é doloroso, mas o que se gera de forma natural é agradável. Por isso, de acordo com este pressuposto, a morte é dolorosa e violenta se for causada por ferimentos ou decorrente de doenças, e a morte que ocorre na sequência da velhice – de que é, por natureza, o culminar – é a menos penosa e tem mais prazer do que dor (PLATÃO, p.191, 2011).
Por tanto, Platão nos deixa bem claro o tempo e o movimento como condição nos deixada neste mundo; e com eles a natureza se transforma, desenvolve e não entra em caos. Já nós somos protagonistas para organizar nossa vida; suas principais funções só são alcançada quando vivemos com equilíbrio e de maneira boa, nos deixando saudáveis e em paz, conosco mesmo, com o outro e com a natureza. Por sua vez tudo isso dinamiza nossa vida, não nos deixando monótonos ou simplesmente parados. O tempo/movimento dá por sua vez sentido a tudo e a todos.
Conclusão
Tendo nós acompanhado todo o pensamento, raciocínio e caminho percorrido por Platão, nos dando a entender dois mundo diferentes, a princípio pode-se observar o tempo transcendental no mundo das ideias e a perfeição lá encontrada, já que o mundo das ideias é a plena idealização de mundo perfeito almejado por todos nós e dando sentido para nossa vida terrena e esperança para nossa vida futura no mundo das ideias. Platão deixa bem claro a organização do mundo material feita por demiurgo, em que assim pelo motor primeiro (encontrado no corpo e na alma) dá início ao tempo ontológico e o movimento. Cientes que somos participantes também disso, já que a alma do homem condenada agora foi colocada no corpo feita por demiurgo, que por meio da razão encontrada na alma pode-se por meio desta matéria espaço, tempo e movimento se purificar e voltar ao mundo das ideias.
Com tudo pode concluir que a partir de Platão, o tempo e movimento deixado por demiurgo vira um tipo uma condição e ajuda na organização da natureza e do homem, pois, uma vez que se dá o tempo ontológico e o movimento neste mundo, tudo a partir daí terá um começo, um meio e um fim e também tudo estará em movimento.
A natureza está condicionada e organizada por tais, já que sem o tempo e o movimento ela voltaria ao caos, não teria função nenhuma em nada, seria apenas matéria sem vida e inútil, pois de nada serve a matéria sem a forma, sem o movimento e sem o tempo pois e consequentemente não haveria a vida, seria ela toda fútil.
O próprio homem percebendo-se protagonista da sua própria alma e corpo, tem capacidade de organizar sua vida material: seu dia, sua noite, seu trabalho, suas relações, seu descanso e principalmente seu futuro. O movimento condicionado com o tempo fazendo com que tudo se modifique e põem tudo do mundo material em constante transformação, movimento e dinamismo, de acordo com o tempo de tudo, incluindo também nosso corpo que também se transforma deixando de ser corpo, fazendo nossa alma transmigrar para outro corpo ou para o mundo das ideias. Devemos aproveitar a vida, já que o tempo passa em um piscar de olhos e nós passamos com ele, o sofrimento do nosso trabalho (movimento) é sempre temporário, mas a recompensa é pra sempre! O passado já se foi, o futuro é inconstante mais o presente é um presente para cada um de nós.
Referências:
PLATÃO. Timeu-Crítias. Editora Abril. 3°ed. 2013.
OLIVEIRA, Ivan S. Física moderna para iniciados, interessado e aficionados. São Paulo: Editora livraria da física. 1°ed. 2005.
SOUZA, Maurício de Lino. El Olam e os viajantes do tempo. Editora Clube de Autores. 2009.