O perdão/gratidão/punição
"É natural que ninguém possa perdoar-se a si mesmo por coisa alguma.
O que se pode é deixar-se perdoar e aceitar o perdão.
O resultado disso é a gratidão.
E a gratidão é a forma de benevolência mais pura, e livre de todo perigo de uma Hybris oculta.
( A hybris é um conceito grego que significa desmedida, no sentido de cometer excessos. É o “pecado” daquele que se tem em altíssimo valor, que é orgulhoso, insolente, presunçoso, e isto tudo unido à falta de controle sobre seus próprios impulsos, paixões e emoções. Os sete pecados capitais são exemplos dessa hybris, e dentro da tradição cristã são os pecados merecedores de condenação.)
Retirado de: http://www.terapiaemdia.com.br/?p=1314
O perdão real pressupõe uma ofensa real.
A suspensão do julgamento é a forma mínima da benevolência, que, de fora, não se pode subtrair a ninguém.
A punição
O ponto de vista da reconstrução do ser humano como próprio-ser,
utilizado aqui para a análise do perdão, é o mesmo ponto de vista sob o qual a filosofia, desde o início, vem analisando o que parece ser o oposto do perdão: a punição.
A punição sempre foi entendida como reconstrução, como reconstrução de uma ordem, ou de um equilíbrio da justiça.
Para Platão, pela boca de Sócrates-que quem comete um crime tem de procurar a punição como "uma cura da alma".
O homem não pode reconstruir-se a si mesmo.
Depende do perdão.
Lévi-Strauss relata o caso de uma aldeia indígena que pune o assassino com a destruição da sua casa e de tudo o que ele possui; logo a seguir no entanto, tudo lhe é restituído pelos próprios companheiros da tribo.
Por assim dizer, ele passa a viver novamente pela graça dos outros, de quem se tornou devedor-sem ter, porém, a obrigação de reembolsá-los.
A primitividade de nossos sistemas penais é surpreendente, se os compararmos com um sistema como esse."
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Texto retirado do Livro
Felicidade e Benevolência - Ensaios sobre Ética.
Coleção Filosofia
Edições Loyola
Robert Spaemann, 1989.
Tradução: Paulo Astor Soethe