Eu sou He-Man
Quando criança assistia a um desenho que lhe encantava, o jovem príncipe Adan levantava sua espada e dizia bem alto: "Eu sou He-Man", e como num passe de mágica, aquele jovem franzino se transformava num deus grego hercúleo bronzeado e salvava o dia. A criança cresceu, descobriu a vida e seus encantos e dentro desses encantos houve um encontro e desse encontro surgiu o amor.
O namoro era uma espécie de paraíso, cada momento era único, cada momento era céu e apaixonados viviam dia a dia aquela relação, o tempo foi passando e o jovem, agora homem, começa a passar por momentos turbulentos em sua relação, até o dia em que o inusitado, o que nunca achou que aconteceria - aconteceu: Ele broxou.
Ela estava fabulosa, tinha acabado de comprar um novo lingerie, pensou aquele dia em cada detalhe, o batom, a maquiagem, a camisinha com sabor, estava excitadíssima. Ela levou as crianças pra casa da mãe, a noite seria somente deles, foi quando ouviu abrindo a porta da sala esperou tomar seu banho e se preparou toda, a noite ia ser quentíssima.
Começaram a se beijar, a se tocar, ela excitada e ele... Ele broxa. Os dois chegam ao divã, ela magoada e ele envergonhado. A mulher tende a pensar que o problema é dela, esse é primeiro passo para se tornar menos atraente aos olhos de um homem, começa a reclamar do corpo e espera que o homem a elogie, mas neste momento é impossível. O ideal é manter a calma e tentar não dar muita atenção.
O homem, por sua vez, precisa entender que sexo é interação entre duas pessoas, se só a espada dele está ali, uma hora vai falhar, não era a espada do He-Man que fazia as coisas darem certo, era toda a magia que acontecia, a criança ficava encantado com a espada, meninos são assim, cedo descobrem suas espadas, pegam imagens fragmentadas de mulheres e assim vão compondo sua mente frágil, transformando mulheres inteiras em fragmentos de estímulos mentais precários. Acostumado com revistinhas e filmes pornô, que fragmentam as mulheres, coisificando-as, maltratando sua espada, não conseguem compreender a magia por completo, se depara com uma complexidade divina que é a mulher, fica perdido.
Não podemos esquecer também a ansiedade de alguém que não compreendeu que a magia nunca era pra si, He-Man evocava a magia pra outro, isso é o prazer, isso é o amor, na fala de Lacan: "O Amor é dar o que não se tem (a alguém que não o quer)", a espada não pode ser sozinha, não pode ser egocêntrica, ela tem que estar em sintonia com a mente do seu dono, pois não é um músculo como os outros, que reage pela força consciente, ereção tem muito a ver com desejo e paixão.
Muita cobrança em cima da espada não permite que a magia aconteça se autoafirmar por meio da sexualidade viril é fatal, quem fica centrado em si ainda não entendeu que sexo é interação. Da próxima vez que levantar sua espada e invocar os poderes de grayskull, lembre-se da magia, deixe acontecer, o jovem Adam continua o mesmo, frágil, com seus medos, mas de espada em pé, o gato "pacato" vira o gato "guerreiro". Estar com a pessoa amada, faz de você alguém especial, como diz o professor Freud: "Como fica forte uma pessoa quando está segura de ser amada", e assim, juntos, estejam prontos para descobrir caminhos que não têm trilha certa, o caminho do sexo e do amor.
Esta crônica faz parte do livro “Crônicas de um divã masculino” em construção...
Jairo Carioca, escritor e psicanalista, autor do livro “Crônicas de um divã feminino” pela editora Autografia.