Dia do Nascituro

DIA DO NASCITURO
Miguel Carqueija


Comemora-se em 8 de outubro, no Brasil, o Dia do Nascituro: o dia para lembrar o respeito e o amor que devemos ter para com os chamados nascituros, os bebês de ventre, ou seja a primeira das nossas faixas etáreas, a vida intra-uterina, nossos nove primeiros meses de existência.
Infelizmente, neste mundo moderno em que o aborto se pratica aos milhões e milhões por ano, a consciência moral da humanidade acha-se cada vez mais anestesiada. Podemos comparar a situação atual, em relação aos conceptos, semelhante à que havia para com os escravos negros, no Brasil do século XIX. Conhecem os romances de José de Alencar? Nesse autor, como em outros da época, os escravos aparecem como se fossem peças do mobiliário (peças ambulantes): não têm nome, nem família, nem vida particular; sequer produzem diálogos, falas, no texto. São apenas os leva-e-trás, os abre-e-fecha da história.
Naquele tempo julgava-se natural a existência de escravos da cor negra ou mestiça, pois convencionara-se tratar-se de raças inferiores. Hoje em dia a escravidão acabou (falo da escravidão específica da etnia negra, e oficial, pois é claro que casos de escravidão real para qualquer etnia ainda ocorrem no país e no mundo, em circunstâncias diversas, inclusive a escravidão sexual; mas isso já é outra história) mas os grandes discriminados passaram a ser os nascituros; pois julga-se natural — e a grande mídia busca inculcar tal perversão de toda a maneira, dando mesmo a entender que essa é a maneira “progressista” de pensar — matar essas crianças de ventre, abortá-las, sem levar em conta que elas sofrem ao ser trucidadas e, mesmo que sofrimento físico não houvesse, elas são seres humanos inocentes e indefesos. O aborto é a maior covardia que homens e mulheres podem praticar, mas é defendido furiosamente pelas ideologias, a começar pela ideologia machista.
Antigamente os negros eram excluídos do gozo dos direitos humanos; hoje os excluídos são os nascituros e todos nós fomos nascituros um dia.
Não ignoro que enxames de “razões” são aduzidas para “justificar” esse hediondo homicídio, por exemplo que a mulher é dona de seu próprio corpo. Milhões de vezes as pessoas sensatas vêm lembrando que o nascituro é outro corpo. Além disso ninguém possui direito absoluto sobre o próprio corpo, pois se assim fosse seria preciso encarcerar todos os policiais e bombeiro que impedem suicidas. E, enfim, em sua maioria as mulheres são contra tal argumento insensato, e são a favor da vida em gestação. O aborto é crime mais do homem que da mulher, pois homem também faz aborto (esse fato é evidente, o próprio “óbvio ululante” de Nelson Rodrigues, mas é raramente lembrado na mídia).
Note-se que todas as razões aludidas em favor do feticídio são de ordem pragmática. Ora, sempre que nos rendemos ao pragmatismo deixamos de ser éticos. Vocês já leram aquele grande clássico brasileiro de Sociologia, “Casa grande e senzala” de Gilberto Freyre? É sem dúvida um livro importante pela gama de informações, mas causa espécie o autor declarar que, reconhecendo embora a crueldade da escravidão, sem ela o Brasil não teria sido colonizado porque Portugal não possuía população que o fizesse, que levantasse o nosso país sem o braço escravo. Assim, recorrendo ao argumento pragmático, Freyre justifica a escravidão. Isso é algo perigosíssimo, pois entre justificar no passado e justificar no presente ou no futuro basta dar um passo ou dois. Vejam que no caso do aborto ocorre a mesma coisa: com argumentos pragmáticos esquece-se o lado ético da questão, pois o que se pretende é que bebês podem ser assassinados, mesmo pelos motivos mais fúteis e mesquinhos, o “aborto a pedido” como ocorre nos Estados Unidos, onde esse crime é permitido até na hora do parto.
Sabe-se que nos EUA ocorreu certa vez um difícil caso jurídico: um casal havia produzido e congelado alguns embriões (outra prática absurda), mas aí houve a separação; os dois então passaram a brigar na Justiça pela posse dos referidos embriões. Como não houvesse jurisprudência na questão a Justiça daquele país consultou o Dr. Jérôme Lejeune (foto), francês, o maior geneticista de seu tempo, descobridor da anomalia cromossômica produz a síndrome de Down. O que lhe foi indagado: aqueles seres eram simples coisas ou eram seres humanos? O eminente cientista foi taxativo, eram pessoas.

Rio de Janeiro, 8 de outubro de 2017.