NOVA ZELÂNDIA: Polícia faz uso ilegal de centenas de registros bancários

Questionamentos com relação à quantidade de dados

consultados sem autorização surgiram após o jornalista Martyn Bradbury descobrir que policiais tiveram acesso a dados bancários em nome dele sem mandado judicial.

Jornal New Zealand Herald

Reportagem: David Fisher

31/07/2017

Investigadores, acredita-se, tiveram acesso a centenas de registros bancários de forma ilegal. Barrister Felix Geiriner, advogado, informou que ainda não tem ideia da quantidade, mas disse que é provável ser vasto o número de dados acessados desta forma, depois de uma opinião emitida pelo Comissário de Privacidade (2) ter chegado ao conhecimento do público. "Acreditamos que haja centenas de casos e que as vítimas nem saibam que aconteceu", explicou.

A polícia investigava a identidade do hacker Rawshark, fonte para o livro (1) bombástico Dirty Politics ("Política Suja", em tradução literal do inglês), e usou uma seção do Ato de Privacidade (tradução literal para Privacy Act) que permitia aos bancos a quebra do sigilo para fins jurídicos.

Bradbury, que nega qualquer relação ou mesmo conhecer o hacker, apresentou queixa ao comissário. Este descobriu que a polícia agiu ilegalmente, pois os investigadores precisariam de um mandado judicial para este tipo de consulta.

O advogado pesquisou esta prática da polícia quando soube deste recurso para a obtenção de informações pertencentes a seu cliente Nicky Hager, autor do livro. O comissário declarou que o acesso a estas informações pessoais foi ilegal.

Geiringer disse que a lei deveria conferir a todo o cidadão privacidade e proteção contra violação. Pode ter havido quebra de sigilo em outros casos em que a polícia fez uso de registros bancários, baseado na já citada exceção à lei sem existência de provas contra os clientes que tiveram suas informações expostas.

O advogado disse ainda que está muito claro já há muito tempo que informações bancárias devem ter seu sigilo garantido e que os bancos tem a obrigação de zelar por elas.

Bradbury levou o caso ao Tribunal de Direitos Humanos, assim como fez Hager, para reparos e indenizações.

Uma porta-voz da polícia informou que o impacto desta ação ainda seria analisado e que não existem sistemas que contabilizam o número de vezes que a polícia acessou tais registros. Isso porque não houve até então nenhuma situação que tornava a contagem necessária. Esta foi a mesma resposta dada em 2015, quando foi revelado outro acesso ilegal da polícia a registros bancários, informações sobre o uso de energia elétrica, viagens, entre outros, sem autorização da justiça. "A exceção ao Ato de privacidade pode ser usada como justificativa para acessar dados menos privativos, como detalhes básicos sobre contas bancárias, mas não para consulta a dados considerados de maior privacidade, que requerem processamento mais elaborado", explicou. Ela informou também que estes dados foram copiados para os computadores da polícia, que têm acesso restrito.

A Associação de Bancos da Nova Zelândia também não tem ideia de quantos registros foram obtidos desta forma, apesar da ligação de membros desta com a polícia. A diretora executiva da associação, Karen Scott-Howman, declarou: "existe uma carta de acordo entre os bancos e a polícia e que ambos trabalham juntos para combater o crime". Sustentou também que a posição dos bancos é de que a informação deve ser fornecida somente de forma legal. "Qualquer suspeita de conduta irregular deve ser investigada pelas autoridades".

Karen disse que o caso de Bradbury não pode ser considerado um precedente. "Cada caso é diferente, mas todos devem ser tratados de forma igual pela lei".

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:: Notas de tradução ::

1 - Dirty Politics: Livro que demonstra a relação próxima entre

Cameron Slater com a Ministra da Justiça Judith Collins e o Primeiro Ministro John Key. Slater, polêmico blogueiro neozelandês de direita, é acusado de receber dinheiro para escrever artigos com ataques a figuras públicas.

2 - Comissário de Privacidade: Tradução literal para "Privacy Commissioner", cargo criado com o Privacy Act, lei de 1993 que protege dados pessoais dos cidadãos neozelandeses. O comissário é responsável pela fiscalização do cumprimento da lei.

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. Link para matéria original, em inglês

http://www.nzherald.co.nz/nz/news/article.cfm?c_id=1&objectid=11914161