A carroça e Dandara

Em 15 de fevereiro 2017 a travesti Dandara, uma cabeleireira de 42 anos, foi espancada, brutalmente torturada, humilhada e morta por oito jovens, no bairro Bom Jardim, em Fortaleza (CE).

E depois de levar diversos pontapés na cabeça e ser espancada por um enorme pedaço de madeira e agredida verbalmente, Dandara foi levada por um carrinho de mão como se fosse um saco de lixo para a sua morte, completamente ensanguentada. Todo o episódio foi registrado em vídeo e veiculado na internet.

Não houve uma comoção de massa por partes dos movimentos sociais em prol dos direitos humanos, nenhum clamor por parte das instituições religiosas, a mídia frisou muito sorrateiramente o caso à polícia que foi acionada muito tempo depois do ocorrido.

E é gritante a ausência de políticas públicas em um país que bate recordes de assassinato de travestis e transexuais. Os únicos direitos que lhe são assegurados são o de pagar impostos. Por que viver não é privilégio, e sim um direito.

Eventualmente, parte da população considerada como “minorias” são espancadas, pela influência da falta de cultura, de educação, de respeito, de ética, e boa parte disso irrigadas pela insuficiência da ação pública. E não é sempre que temos um carrinho de mão, para conduzir os nossos restos e depositar em alguma lata de lixo ou lote baldio. Somos descartados em qualquer lugar em qualquer esgoto e mesmo assim continuamos com a cega visão de acreditar que o problema não é nosso.

Sendo assim, atribuímos desculpas tentando culpabilizar as vítimas pelo próprio assassinato e justificar os crimes cometidos, pois afinal era apenas mais um “veado”, um negro, uma prostituta, um mendigo, um índio.

Na espiral do silêncio a sociedade segue no descompasso da intolerância e de irresponsabilidade. Se tornando coadjuvante dos crimes em séries. Apenas, meros espectadores de mais uma cena ou um vídeo de horror.

E pergunto, com certa mágoa, quantas “Dandaras” precisam morrer para reconhecermos que o problema é de todos nós em suma sociedade? Essa questão perpassa homofobia, transfobia. Esses jovens que mataram a travesti especificamente não são doentes, transtornados, anormais como fez crer algumas vertentes da psicologia.

Eles são resultado de um projeto social onde todos nós participamos como produtores e indutores. Precisamos ser uma sociedade que tenha alma, que valorize e respeite o ser humano, não pela ótica de seus critérios morais, econômicos ou religiosos, mas sim como pessoa comum, rara e independente de sua orientação sexual.

jessicarosanne.to@gmail.com

JESSICA ROSANNE
Enviado por JESSICA ROSANNE em 06/09/2017
Código do texto: T6106082
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