SINOPSE SOBRE CAMARAGIBE

*P R Ó L O G O

   A publicação deste trabalho resultou em primeiro plano, do propósito inicial de divulgar um conjunto de observações e registros escritos, construídos durante a vida em curso,  bem como, pelo desejo de compartilhar experiências adquiridas em diferentes fases de vida. Buscamos registrar uma diversidade de cenários vivenciados, enquanto profissional ligado a área de ensino e direção de escola formal pautado pelas experiências em vários outros setores que o simples ato de viver enseja e a formação acadêmica oferece como matriz em termos de conhecimento e experiências.

Além do mais, desenvolveu-se um certo grau considerável de esforço, através do subjetivismo teórico implícito, em se construir uma obra imune às inserções de outras linhas de pensamento, a não ser, por meio de citações consagradas no âmbito literário que enriqueceram o preâmbulo de determinados textos. 

A leitura e o consequente desvendamento da obra implicam num deparar-se com um trabalho diversificado em conteúdos, segmentado nas mais variadas linhas do conhecimento, em que pese os limites impostos pela profundidade de cada um, mas dotados de uma primazia "sui generis" na constituição de uma espécie de bússola norteadora, orientando, corrigindo, e refazendo um navegar constante, em mares emocionais desconhecidos, às vezes, revoltos e turbulentos, dependendo do rumo a ser seguido. As  tempestades e as batalhas emocionais surgidas no desenrolar dos acontecimentos consagraram-se mentalmente por terem estimulado, cada vez mais, a conclusão dos resultados. 

Render-se ao reconhecimento, pela inserção de lampejos de  calmaria aparente, faz-se plenamente necessário. Até por uma questão de querer sublimar a “sinceridade” como um dos valores supremos a que se deva revelar em tudo aquilo que se pretenda realizar. Todavia, é verdadeiro também afirmar-se que foram poucos os instantes de harmonia prazerosa obtida durante a instalação com exatidão desses lampejos. Se de um lado representavam um certo contentamento lançado ao interior do ser, por outro lado, não difundiam-se de forma significativa ao ponto de ecoarem-se como “animus” de satisfação em sua plenitude maior. Mesmo assim, por menor intensidade com que puderam se expressar, serviram de suporte emocional positivo, no sentido de  afastarem o sofrimento borbulhante que circunscrevia o ambiente de execução do trabalho, na tentativa, quase sempre, de obscurecer o rumo correto a ser trilhado ou afastar teoricamente do caminho ideal ao equilíbrio das incertezas que normalmente apareciam em prol das deliberações poéticas originais.  

        Sabe-se que a grande meta de todos é a conquista inatingível da felicidade eterna e total. Por sinal, a busca pela felicidade tem sido ao longo da vida de cada ser humano, a “nau capitânea” de quase todo o seu empreendimento emocional. Não raramente, o ser é levado a rebuscar incessantemente   nos mais escarpados obstáculos e meandros irrestritos que a vida possa oferecer, a satisfação plena desse pleito, ora pela tentativa da supressão total de todos os sentimentos negativos, ora através da reconciliação e crença num mundo melhor  após a morte. Contudo, constitui-se de extremada elegância,  reconhecer-se também, a existência de um certo grau de ação prazerosa na liberdade de sair-se em busca de conquistas por mais remotas e difíceis que possam parecer. Buscar sempre e cada vez mais, sem perder de vista o preciosismo oriundo da sensação prazerosa do conseguir.  

  Assim, permeia-se e estrutura-se este simples e modesto trabalho ligado a arte literária. Através de uma firme, clara e preciosa compreensão de que se trata de algo inacabado, como a própria necessidade de atingir-se a perfeição.  Mesmo ousando-se usar a semente do fazer brotar interminavelmente. Haverá  sempre um pouco mais, uma tentativa a mais e buscas constantes, além de qualquer outra pretensão, para se chegar a um bom resultado. Por esta razão e outras r, a obra também é fruto de uma coletânea de textos de natureza poética, escritos de forma sucinta e ao despertar do “debrus inspiratório”, instalado em determinados momentos na vida do autor.

A culminância da ação de desenvolver o trabalho,  ocorreu no exato momento de indecisão do autor em decidir entre a sequência lógica de raciocínios observados ou pensados que gotejavam perenemente, e a velocidade com que se transcrevia esses registros de forma eminentemente escrita. Movido pela preocupação substancial de não  deixar esvair o mínimo detalhe durante tal reprodução. Noutros instantes, buscou-se de forma imediata a reconstrução de ideias de cunho meramente especulativo, quase sempre dotados de vieses analógicos, mas, sobretudo, de forma a estimular procedimentos e atitudes positivas, com direito ao uso de lenços de papel queimando os atestados de óbitos de inúmeras idealizações mentais que se formavam diante das trovejadas assistidas e suportadas com frequência. Tais instantes, se fazem representar pela porção  mais criativa da publicação, gerando contextos utópicos sobre diversos temas, recriando novas possibilidades de respostas do ser diante de paradigmas desconhecidos, além da inserção, mesmo que de forma superficial, em abordagens de cunho essencialmente filosófico. Porém, por razões de falhas corriqueiras e naturais de memória, abrevia-se de passagem, que é comum ao escritor deixar-se subtrair por alguns resquícios de detalhes, às vezes, não menos importantes, repetindo tudo o que se fez para desfazer-se logo em seguida, como a própria Fênix ressurgindo das cinzas para transformar-se em cinzas novamente.

Dialeticamente, novos argumentos surgirão e serão esquecidos de forma  esparadrápica e evasiva as rachaduras da área em exposição. O saldo da ação resulta no ganho ou reparo, talvez, de um adorno, muitas vezes inócuo, representado por uma tira adesiva encobrindo apenas um espaço que continua aberto. Melhor assim que antes, por estar visivelmente à esmo e à deriva das imprecações oriundas pela vida afora ou pela falta de proteção aos danos iminentes.  

CAMARAGIBE

“Tempo de criança é tempo de esperança, conduzindo o ser a um mundo de eternas lembranças, eivadas pelo frescor de um momento que não volta mais... a não ser, através do pensamento, capaz de rebuscar e transpor qualquer anteparo que vise a limitação do irreal”

Prof. Paulo Carneiro

INTRODUÇÃO

No dia 10 de março de 1534, Duarte Coelho recebeu de D. João III, rei de Portugal, a capitania de Pernambuco, em regime de sesmarias. A Capitania de Pernambuco ou Nova Lusitânia tinha 60 léguas de costa no Brasil e abrangia os territórios dos atuais estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Alagoas, a porção ocidental da Bahia, possuindo, deste modo, fronteira ao sul/sudoeste com Minas Gerais (o extremo noroeste de Minas era a parte final da comarca do São Francisco: a capitania/província de Pernambuco avançava um pouco mais adentro do território norte/noroeste-mineiro do que a Bahia). O nome Pernambuco vem de paranambuca que significa pedra furada em tupi, usada pelos índios quando se referiam a abertura meridional da barra do Capibaribe. Em 1539, o donatário fundou o Engenho Camaragibe.

Em 1549, após a instalação do Governo Geral do Brasil, o donatário da Capitania de Pernambuco, Duarte Coelho, preocupado com os frequentes ataques indígenas e as sesmarias ociosas, manda chamar Diogo Fernandes, e pede que se recolha em sua casa de Olinda, pois não tinha homens suficientes para defender seu engenho San Thiago dos sucessivos ataques indígenas que vinham acontecendo no seu engenho.

Por volta de 1555, os índios Tupinambás destroem todo o canavial do engenho e suas edificações, inclusive a casa-grande. Prendem Pedro Álvares Madeira, depois o devoram em rituais antropofágicos, que pressupunham uma troca entre o inimigo capturado e a comunidade que o aprisionou.

O engenho depois do ataque indígena fica de fogo morto e Diogo e Branca Dias arruinados, sendo inclusive, objeto de uma carta escrita por Jerônimo de Albuquerque, o Torto, cunhado de Duarte Coelho, ao rei de Portugal, na qual pede auxílio para o casal, "gente pobre de Viana", com muitos filhos: “Dois engenhos se perderam ou quase três no tempo desta guerra, nos quais se fazia muitos açúcares; um deles é o de (...) Santiago de Olinda, que por estar fracamente provido nele um Diogo Fernandes, que o fez com outros companheiros de Vianna, por ser gente pobre mandei recolher a esta vila, por achar não tinha escravaria, armas, nem artilharia com que se pudesse defender, no qual tempo os Indios o queimaram e roubaram, pelo que este engenho ficou deserto e si tivera cem peças de escravos não se despovoaria (...) [neste engenho] se podem assentar dentro da cerca dois engenhos d’açúcar e tem boas terras e muitas madeiras, e lenhas e outras cousas necessárias; os quais, andando bem providos do necessário e escravaria, como cumpre, se farão neles cada ano dez mil arrobas d’açúcar, e porque isto é cousa do serviço de Deus e de Vossa Alteza (...) Folgue Vossa Alteza de favorecer nisto o dito Diogo Fernandes, que está muito pobre, com seis ou sete filhas e dois filhos, sem ter com que os possa manter pela dita perda que recebeu, e ele é homem que para negociar o ditos engenhos outro mais suficiente na terra que ele não se achará, e que com menos dinheiro e tempo isto acabe ponha no estado que cumpre, dando-lhe um quinhão como ele soia ter no dito engenho”. Infelizmente, a carta não surtiu efeito junto à Coroa, e no mesmo ano o Ouvidor da Capitania notificou Fernandes, dando prazo para que o engenho voltasse a funcionar.

Como não cessassem os contratempos com os índios em toda a Capitania, o novo donatário, Duarte de Albuquerque Coelho, ordenou que toda a gente válida da capitania se afastasse dos nativos (1560), cuja campanha foi liderada pelo judeu converso português e homem muito rico, Bento Dias de Santiago.

Com o sucesso da campanha Bento Dias solicitou ao Donatário a compra de grande parte do engenho Camaragibe, ficando para Diogo Fernandes 1/4 da propriedade, quinhão que administrou até o seu falecimento. Em 1563 o acordo foi finalmente assinado, tendo certamente pesado na decisão, além da vitória da campanha contra os indígenas na região do Cabo de Santo Agostinho, o fato de que Diogo Fernandes não cumprira a condição pela qual lhe fora concedida a terra. Logo Bento Dias Santiago recupera os canaviais e constrói a fábrica cuja moenda era movia a bois.

SÃO LOURENÇO DA MATA

Até 1775, São Lourenço da Mata era apenas um distrito subordinado aos municípios de Recife e Paudalho. Em seguida através da Lei Provincial N° 1805, foi elevado em 13 de junho 1804, à categoria de Vila, tendo sido conduzido a categoria de Município em 10 de janeiro de 1890.

A Lei nº 1805 teve execução no regime republicano e de acordo com o decreto de 9 de janeiro de 1892 foi eleito em 21 de fevereiro e tomou posse em 25 de março do mesmo ano, o primeiro governo do município, formado pelo prefeito Temolião Duarte de Albuquerque Maranhão. Devido as instabilidades dos primeiros tempos da República, o primeiro governo foi dissolvido e já em 8 de novembro de 1892, o Dr. Francisco de Paulo Corrêa de Araújo assumiu a segunda administração municipal, passados apenas oito meses da primeira gestão. São Lourenço da Mata teve anexado o distrito de Nossa Senhora da Luz (1854), e ao de Camaragibe em 1908.

Pelo decreto-lei estadual nº 235, de 09 de dezembro de 1938, o município de São Lourenço da Mata passou a denominar-se São Lourenço, voltando a antiga denominação apenas em 1943, pelo decreto-lei estadual nº 952.

*A ESTAÇÃO

A estação de São Lourenço da Mata foi aberta em 1881.

*UMA VISÃO DIFERENTE DE MUNDO

No além mar, o Cientista Polaco, Nicolau Copérnico, lançou a Teoria Heliocêntrica, em meio à hegemonia da Igreja Católica, totalmente contrária a qualquer tipo de mudança que viesse de encontro à realidade de mundo por ela pregada e assumida. Com isso, a semente de um novo mundo germinara-se através de uma nova ideia de se conceber o Universo, em detrimento a mentalidade vigente na época, segundo a qual, tudo deveria ser compreendido com naturalidade e resignação. Onde a terra ocupava fixamente o centro do sistema solar, portanto, destituída de quaisquer movimentos. Quaisquer ideias contrárias a essa linha de pensamento seriam consideradas heresias, sendo julgadas e punidas pelos Tribunais da Inquisição. Todavia, as ideias foram gradativamente brotando da luz de outros pensamentos, espalhando-se como se fossem ondas nas praias a lavarem os pés encharcados de lama daqueles que durante muito tempo, foram responsáveis pela construção de cemitérios ambulantes onde deveriam ser enterradas as novas formas de compreender a realidade concreta. Nesse contexto, arfava-se uma atmosfera contaminada de mitos e pecados, resultando em agonias sofridas pelos seus protagonistas, na busca da concessão de perdões aos pés do altar santificado por eles criados. A cada avanço dos cientistas, filósofos, contestadores em geral, diagnosticava-se a preparação da Igreja para um novo alçar de rumo assentado na fé e a esperança de manter-se dominando sob os acordes de sua doutrina, hermeticamente, enclausurada na redoma de seu corporativismo religioso. Surgiram vários pensadores, cientistas, poetas, artistas, visionários de uma nova mentalidade de mundo. Jan Amós Comennius (1592 a 1670), protestante Tcheco, fazendo uso da Revolução escrita, inventou a cartilha e o livro texto para beneficiar seus discípulos na aprendizagem da leitura da Bíblia, tendo também revelado sua preocupação com a Educação de Crianças na obra chamada “Carta Magna”. Surgiu, Galileu Galilei, demonstrando através de seus experimentos, a veracidade da teoria de Copérnico. Ao mesmo tempo, crescia no Ocidente uma nova corrente filosófica do pensamento, batizada sob o título de “Iluminismo”, visceralmente contrária às imposições e cenários da época, buscando refutar a qualquer custo o período das trevas imposto pela Igreja. Dentre os iluministas, o suíço Jean Jacques Rousseau (1712 a 1778), advogava que o princípio fundamental de um melhor tipo de educação seria o de estimular na criança os prazeres de amar as ciências e seus métodos. Também propunha que a criança através da brincadeira e o canto, pudesse desenvolver a criação de princípios para a construção de sua própria identidade. “O “homem nasce bom, a sociedade é quem o corrompe”. Contudo, a força do poder ainda que morta foi embalsamada e refletiu por muito tempo o odor de sua presença. A Igreja católica manteve seus costumes e tradição em certos lugares da civilização Ocidental. No Brasil, a escola Jesuítica trazida pelos padres, não foi exitosa quanto a perspectiva maior de religar o índio a outros costumes e falas.

O ALÉM MAR

No “além mar”, a Arte e a Literatura ganharam expressões mundiais através das obras de Leonardo da Vinci, Michelangelo, Rafael, Shakespeare, Cervantes, Camões. Enquanto isso, a criança da época sofria os dissabores do pensamento em voga. Um tratado sobre educação de 1646, afirmava: “Só o tempo pode curar o homem da infância e da adolescência, idades consideradas imperfeitas sob todos os pontos de vista”. Por outro lado, pouquíssimas mulheres do século XVII e XVIII amamentavam seus filhos, alegando motivos diversos como: fraqueza de constituição física, perda da beleza, além da ordem moral e social que as apoiavam quanto a essas justificativas. O filho era um empecilho à vida da mulher no passado. Surgiu então, a figura das “amas de leite” que permaneceram na cena familiar durante séculos, até que as mães começaram a desenvolver um sentimento de revolta em relação ao tratamento degradante com que eram tratados seus filhos. No ramo das Ciências o conhecimento científico foi intensificado com a adaptação e invenção de instrumentos de pesquisas. Surgiu o microscópio composto e a “célula morta” foi descoberta (Robert Hooke), estabeleceu-se a Teoria celular (Schwann e Schleiden), o homem enveredou-se na pesquisa de suas origens e evolução dos seres (Jean Baptiste Lamarck, Charles Darwin), a máquina a vapor foi inventada ( James Watt ), o Capital foi publicado (Karl Marx), a Psicanálise ( Sigmund Freud) tornou-se um referencial metodológico no enfrentamento de problemas ligados ao abstrato emocional e, o termo Educação, em tese, passou a ser usado como instrumento invisível a manter regalias nas mãos dos poderosos, que se aproveitam da visão desarticulada de mundo da grande maioria das pessoas, e a creditarem os desmazelos e improbidades do homem, a falta de educação, sem tirarem as mãos dos bolsos da nação. Importante salientar que após a Revolução Francesa, seus ideários foram fragmentados entre o Capitalismo, o Socialismo as Religiões e Seitas. A “Liberdade” passou a ser patrimônio dos Americanos do Norte, a “Igualdade” foi abraçada como rito final pelos Russos, e a “Fraternidade” coloriu o pensamento das Doutrinas e Seitas Religiosas. No Brasil, na tentativa de justificar os desmembramentos decorrentes das grandes concepções ideológicas, criou-se uma escola gratuita, universal, laica, leiga, lisa e abandonada.

EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

A educação superior no Brasil teve desenvolvimento diferente do restante do continente sul-americano. Assim, a

colonização espanhola incluiu as universidades, dentre as instituições que reproduziu na América, criando a primeira

delas em 1538.

Os primórdios da educação superior no Brasil começaram em 1572 com a criação dos cursos de Artes e Teologia

no Colégio dos Jesuítas da Bahia. Depois da expulsão dessa ordem religiosa, em 1759, houve a abertura de aulas

de matérias isoladas até que, em 1776, uma faculdade foi criada no Seminário dos franciscanos no Rio de Janeiro

e, em 1798, no Seminário de Olinda (CUNHA, 1980).

O ENGENHO CAMARAGIBE

No século XIX Affonso Pereira Carneiro compra parte das terras do engenho Camaragibe e com outros acionistas fundam a Companhia Industrial Pernambucana – CIP, integrando Camaragibe na área urbana de Recife. (Colaboração de Enock engenhos enviada em 15/07/2014). Em 1893 a Companhia desenvolve um programa social para seus operários através da construção de uma vila operária, a primeira do gênero na América Latina. E tudo isso, deveu-se à coragem e a perspicácia de Carlos Alberto de Menezes, nascido na Província do Rio de janeiro em 1855, tendo estudado no Colégio D. Pedro II e na Escola Politécnica. Foi o pioneiro nesse tipo de obra no Brasil. Pôs em prática nas suas unidades fabris de Camaragibe e Goiana, o seu denotado projeto, criando à primeira “Corporação Operária”.

Aos poucos surgiram as fábricas e as casas operárias com altos padrões higiênicos para a época. Surgindo assim a primeira Vila Operária da América Latina. Mais tarde em 06/1900, fundou a Corporação Operária de Camaragibe, onde era diretor. A Corporação surgiu forte e independente da vontade dos patrões, garantida por si e pela lei. Todos os operários de Camaragibe faziam parte dela, que tinha uma função moral, pois desenvolveria toda a sorte de benefício moral, material, espiritual e intelectual para eles e suas famílias. Educar o operário pela prática da associação, desenvolvendo o espírito da união, solidariedade e fraternidade. Em 1987, a fábrica foi adquirida pelo grupo BRASPÉROLA, desativada e logo depois revendida ao grupo VIVABRÁS.

A casa grande do engenho Camaragibe conhecida como "casa de Maria Amazonas" por ter pertencido a Maria Anita Amazonas Mac Dowell, fica hoje localizada em uma elevação entre a BR-408 e a estrada que liga o Recife à região de Aldeia, ao lado do Parque Camaragibe, a cerca de 10 km da capital pernambucana. Foi ao longo dos séculos completamente reformada sofrendo sucessivas alterações, mudando inclusive a fachada frontal. A casa atual mantém um porte majestoso, presente nas suas fachadas de características neoclássicas dos fins do século XIX, possui: 02 pavimentos, 07 salas, 11 quartos e uma capela sob a invocação de São Tiago. De linhas barrocas, o orago tem um rico alto-mar com uma grande imagem de seu padroeiro, consolos ao estilo Brenguer, além de um belíssimo lampadário de prata. Todo este acervo foi trazido de Portugal. Hoje a fábrica (moita) e uma vila de casas, são as únicas edificações que restaram do antigo engenho.

*O AREEIRO

Na década de 50 do século XX, a senhora Maria Anita Amazonas Mac Dowell, detentora naquele período do maior aporte de terras do distrito, resolveu promover loteamentos em vários pontos da região. Nascendo assim, um lugarejo batizado sob a denominação de Areeiro. Foi através da compra de um terreno localizado na Rua São Roberto, vendido pelo corretor de imóveis que atendia pelo apelido de Dodô, que chegamos ao “Areeiro’ durante o período. Um olhar despretensioso demonstrava tacitamente as prováveis dificuldades que iríamos enfrentar a partir daquela data juntamente com os demais moradores. Infraestrutura zero. A Geografia Física do loteamento demonstrava a presença de vários morros que circunscreviam um bosque prolongando-se por quase toda extensão do terreno. Tinha o formato espiralado, exceto na extremidade onde se abria uma clareira e aonde desembocava um grande volume d’água nos dias chuvosos. A Foz das enxurradas se concentrava ali... trazendo consigo os grãos de areia erodidos e arrastados dos morros. A performance ambiental seria digna de preservação e conservação. Tinha-se a impressão de estar-se adentrando a um bosque virgem e livre da predação humana.

O Areeiro era uma ilha de areia de enxurrada cercada de “mato e morro” por todos os lados... Pois é! A geografia do Areeiro desmistificava a ideia única do “mato e morro” como objetos de coragem para prática de delitos. Ainda assim, a aquisição de um lote representava o velho e conhecido sonho da propriedade, e que ainda hoje perdura, por sinal, em maior escala entre a população brasileira. Tal sonho, tirou o sono de muitos que se predispuseram a enfrentar o desafio... um verdadeiro holocausto à capacidade de sobrevivência humana num ambiente sem água apropriada para o uso doméstico, sem energia elétrica, sem saneamento, transporte coletivo... além dos insetos e outros seres que habitavam no recinto como cobras, sapos, cigarras, morcegos, lagartos, pássaros diversos. As muriçocas hematófagas adoravam "cantarolar" enquanto sorviam o sangue de quem se aventurasse a dormir à noite, além da ação de outros seres inconformados com a invasão de seu “habitat” natural.

Noites escuras, vultos no caminho, silhuetas de gente cansada voltando aos seus abrigos e o aconchego dos seus...Porém, nas manhãs seguintes as folhas das árvores balançavam ao ballet dos pássaros, pulando de galho em galho, emitindo seus cantos naturais, polinizando às flores, em reverência à luz do sol que ia lentamente se debruçando sobre o manto verde da paisagem. Canto coral dos passarinhos inebriando mentes sofridas e aguerridas, assolapando ao vento a terra que escolhera pra morar, construindo seus abrigos, envidando esforços sincronizados, prazer refletido na fronte, o alçar de um novo horizonte, a certeza na vida, emoção incontida, de cedo ou mais tarde, quem sabe, amanhã talvez, mas um dia chegar...Realidade se faz através de sonhos !

E a vida repetida ganhava contornos de tristeza quando as larvas das cigarras anunciavam o cair da tarde, com todo alarde e rara beleza em forma de sons percussivos e alternados, o ninar de mais um dia que dormiu...Augusto Calheiros tocava no rádio movido a manivela de Sr. Júlio : Cai a tarde, tristonha e serena, no mais triste e suave langor...

*O ENCANTO DAS CRIANÇAS

Em contrapartida, entravam em cena as crianças a energizarem o que sobrara no relógio do tempo para a dissipação de mais um dia... com suas brincadeiras, seus gestos, seus afetos, seus segredos, seus sorrisos, seus gritos, alguns aflitos, outros de surpresa e satisfação, sem darem-se conta das intempéries do dia-a-dia e acreditando nas fantasias da juventude como forma única e plena, além de descomprometida em superar atropelos, com desvê-los, em direção a um novo amanhã. Tempo de criança é tempo de esperança, tempo de descoberta, tempo de plantar, tempo de sonhar por maior que sejam as atrocidades da vida. Há sempre uma nova esperança ! Há sempre um novo lugar! Vale a pena sonhar. Sonhar na perspectiva de transformação e também em busca do melhor para o seu coração!

Assim, "quando chove e o vento bate ao peito, a saudade vem sem jeito relembrar do meu lugar. Terra cheia de areia de enxurrada, que a saudade revelava no perfil de seu postal". Lembranças reveladas, transportadas pelo tempo, como um alento, ao que não existe mais.

Ver por dentro, sonhar com o passado, redesenhar o presente, ser a fuga alegre e imaginária do real. Areeiro, meu portal dos sonhos de criança.

Ao cair da tarde as cigarras com seu canto lírico anunciavam, mais um dia que dormiu. Noite escura, vultos no caminho, de manhã os passarinhos festejavam a luz do sol. Areeiro, meu portal dos sonhos de criança.Reminiscencias de um tempo tão bom. Um paraíso da felicidade.

Brincando e crescendo na sua rotina, saiba que nunca esqueci... de você !

Na verdade tratava-se de uma região nativa, com pouquíssimas habitações e com projetos de rua desenhados no papel, mas, que na realidade representava verdadeiras trilhas espiraladas e margeadas por vegetação rasteira e de pequeno porte que se estendia sobre chapiscos de areias, por onde as poucas pessoas ali residentes, além de alguns caçadores e pescadores tinham acesso ao centro de Camaragibe. Em geral, a vegetação era abundante, com bastante fruteiras como: Jaqueiras, cajueiros, mangueiras, abacateiros, coqueiros, O cafezal do Sr. Luís, pés de araçá, carambola, pitanga, fruta-pão, além de outros. Todos produzindo frutos, e usados por alguns moradores nativos e recém chegados, para desenvolverem a prática do comércio local, que acontecia , geralmente, nas feiras livres e Mercado Público de Camaragibe. A fauna restringia-se a animais de espécies variadas, com a predominância de insetos.

*CONTEXTO COMERCIAL

A grande vocação comercial do Areeiro do início, era a de fornecer areia de enxurrada como matéria prima utilizada nas construções em geral. A “areia de enxurrada” era depositada pelas águas que escorriam dos morros até a região do vale, em bastante abundância durante as chuvas em geral , principalmente as de inverno. A chuva representava sinal de ganho financeiro, dinheiro certo para muitos que também viviam da exploração da areia remanescente das enxurradas. O “modus operandi” dos envolvidos no negócio consistia em coletá-la do vale e formar lotes de areia, usando pás e enxadas como instrumentos de trabalho, inclusive à noite, onde provocavam um sibilar alternante entre o recorte dos grãos de areia e o esvoaçar do conteúdo amealhado pelos instrumentos, na direção dos montes em formação. Tais montes de areias formados eram protegidos com lonas, galhos de árvores, palhas do coqueiro, prevenindo-se do deslizamento a ser provocado por novas chuvas que devolveria os grãos de areia de volta ao vale. Preservados os montes, o momento seguinte, seria de espera, até que um comprador pudesse interessar-se pelo(s) lote(s). O que rapidamente seria feito em função do processo acelerado de ocupação dos loteamentos " Até as areias do chão do Areeiro ...contribuíram com a vida . Areias da Vida".

Geralmente, os Armazéns de construção existentes no centro, enviavam seus representantes para a compra desses lotes de areia. Uma vez consumada a transferência para seus depósitos, arquitetava-se sua revenda por preços muito além daqueles adquiridos na fonte. A compra de areia também dava-se individualmente por meio de pretensos moradores que acorriam ao Areeiro, buscando a matéria prima necessária para efetivarem suas construções. Neste caso, o transporte era feito por meio de carros de mão e/ou jumentos adornados de “cangalhas” usadas no acondicionamento desse material, movidos a cipoadas no traseiro quando a marcha tornava-se lenta. Assim, grande parte das residências em Camaragibe guardam ainda hoje em suas paredes, ingredientes de vida passada, adornadas pela lembrança de um período de muito trabalho e perseverança durante a ocupação do Areeiro e a extração de sua principal fonte de renda...As Areias de enxurradas.

COMÉRCIO D'ÁGUA

Com o tempo, gradativamente as ruas foram assumindo seu traçado projetado na planta do loteamento, mas, apesar do acesso agora facilitado, havia um problema mais sério afligindo a vida dos moradores.”A falta d’água” para uso doméstico. A grande alternativa consistia na produção de “cacimbas”. Daí reservar-se na planta do terreno um espaço específico para sua construção. Os moradores situados em regiões mais altas enfrentavam dificuldades maiores na construção de suas cacimbas pela profundidade dos veios d’água a serem encontrados. Uma alternativa freqüente era beneficiar-se da amizade de outros moradores portadores de cacimba ou então, submeter-se a compra de galões d’água aos ‘Capitães das Águas’.

Um galão tem 3,6 litros e uma lata contém 18 litros. Logo, os fornecedores de água de ganho que utilizavam-se das latas de 18 litros para transportarem seus produtos e atenderem aos seus pedidos, estavam remando contra a maré, ou seja, trocando coelho por lebre. A condução dos galões d’água era feita de diversas formas:

I-À pé, usando os braços como alavancas e as mãos para sustentar o produto. Neste caso, as mãos avermelhavam e eram vítimas de calos constantes. Ainda com relação a esta forma de transporte , o melhor seria transportar duas latas de iguais volumes e conteúdo para não lesionar a coluna vertebral. Aqueles que transportavam uma lata apenas, deslocavam o ponto de equilíbrio para um dos lados, sendo acometidos de dores lombares e da coluna, se fosse frequente o procedimento. Era freqüente o ballet de pessoas comprometidas nessa operação.

II-À pé, utilizando uma madeira roliça disposta transversalmente sobre os ombros e, dotadas em cada extremidade, de cordas usadas para amarrar as latas.

III- À pé, usando como apoio o teto da cabeça, protegida ou não por uma tira de tecido em forma de rosca ( rodilha ), onde se assentava o fundo da lata. A preocupação agora seria com o pescoço no sentido de equilibrá-lo de modo a não sofrer danos na coluna cervical. Vez em quando aparecia um “malabarista de cabeça” que além do transporte do produto, dava-se ao luxo de parar, conversar, sorrir, subir, descer, como se a lata fizesse parte de sua anatomia. Em passos sincronizados, existia um ceguinho tio de Geraldo, que muitas vezes fora encontrado caminhando pelas ruas, desenvolvendo esse tipo de malabarismo sem enxergar.

IV - Usando animais como o burro e o cavalo. Mais freqüente era o uso de um burrinho, adornado de cangalhas onde as latas eram colocadas. Tais cangalhas diferiam das usadas no transporte de areias, por algumas apresentarem uma portinhola frontal com ferrolhos laterais que se fechavam na própria madeira utilizada em sua construção. Quando a entrega era feita em locais relativamente altos , ainda amarrava-se a carga com cordas transpassando toda carga. Vale lembrar que o "Capitão das águas", também assumia o posto de ‘Capitão das areias’ quando possível.

Lembranças são como cenas repetidas de um filme que você já assistiu. Vez em quando abre-se a porta do passado e novamente você se vê, ali do lado, assistindo tudo outra vez. E assim aconteceu em relação a uma figura feminina com mestrado e doutorado na arte de sustentar sua família fazendo uso do transporte de água. “ Pastora” era assim mesmo como o povo a chamava. Entendia de tudo sobre coleta, transporte e venda d’água. Usando seu burrinho acompanhando seus passos, indo e vindo do cacimbão público existente na entrada do Areeiro, até o destino previamente traçado, cumprindo à risca com suas tarefas e contando com o auxílio de uma filha menor, esta, ocupada em preencher os vasilhames de reserva, durante todos os dias, sob a luz do sol e os olhares curiosos de quem passava.

A água utilizada no dia a dia para fins diversos, inclusive aquela coletada dos cacimbões era tratada à base de cloro que combatia os germes patogênicos e o gesso que promovia uma melhor clarificação do líquido. A utilização da água também gerava outro tipo de sustento à certas pessoas. A lavagem de roupas. As lavadeiras de roupas buscavam os riachos, como o “Viana” para se desincumbirem de suas tarefas. Interessante mencionar que nesses mesmos locais, os proprietários de cavalos, além dos cachorros que os acompanhavam eram banhados. Comum eram os dejetos de animais encontrados na mesma água utilizada para o homem nadar e tomar banho. Comum também ouvir-se dizer que durante e/ou após o banho sentia-se uma coceira irresistível na pele. Pois bem, as larvas ( cercárias ) do Schistosoma mansoni , agente etiológico da Esquistossomose, tendem a penetrar na pele do indivíduo para completarem o seu ciclo . Tendo no homem o seu hospedeiro final ou definitivo e no Caramujo da espécie Biomphalaria glabrata, seu hospedeiro intermediário. Portanto, a penetração das cercárias no homem, provocam irritação de pele culminando com o aparecimento de coceiras.

A EDUCAÇÃO NO ESCURO

Três anos após termos chegado em Camaragibe a primeira LDB brasileira foi sancionada pelo então Presidente João Goulart. Foram 10 anos na UTI do Congresso Nacional, embora tenha passado pouco tempo fora do útero materno, para só atestarem o óbito e incinerá-la definitivamente em 1971. Veio a segunda LDB puramente Tecnicista de Nº 5692/71. Em tempo, durante o ano de 1968, as Universidades sofreram uma crise pandêmica de reestruturação curricular desenhada na França por meio, inicialmente, dos estudantes universitários franceses, que clamavam por adequação dos currículos universitários ao mercado de trabalho. Ainda assim, no tocante a 4021/61 brasileira, apesar de todos atropelos subsequentes, criou-se um referencial legal por onde a Educação brasileira deveria se espelhar por meio de seus atores diversos. Procurou-se organizar o Sistema de Ensino Brasileiro, através da lei em apreço. A educação brasileira, ganhou uma primeira bússola norteadora de suas ações, em que pesem, determinadas intolerâncias um tanto quanto paradoxais ou descabidas, tal como, exigirem de imediato que o acesso a determinados níveis de ensino devesse ocorrer através de comprovação satisfatória precedente, em termos de aprendizagem.

A opção em voga , a partir da 4021/61 ( LDB ), era a de se fazer o exame de admissão ao ginásio, desde que o primário tivesse sido bem feito. O Art. 36 da lei dizia:... "_O ingresso na primeira série do 1º ciclo dos cursos de ensino médio depende da "aprovação em exame de admissão", em que fique demonstrada satisfatória educação primária, desde que o educando tenha 11 anos completos ou venha a alcançar essa idade no correr do ano letivo"....À época, a nova Lei determinou o curso primário com 4 anos de duração e o ensino médio composto de 2 ciclos. No 1º ciclo compunha-se do Ginasial com 4 séries e o 2º ciclo, o Colegial com 3 séries.

A mudança repentina provocou o enterro vivo de todos que não acessaram a um ensino, ao menos, satisfatório! É certo que alguns lá na frente ressuscitaram. Qual seria então, o padrão para o "satisfatório" implícito na lei ? Muitos tentaram e não conseguiram, outros nem tentaram e, uma certa parcela meteu a cara nos livros: "Programa de Admissão" dos autores : Arnold de Azevedo, Domingos Paschoal Cegalla, Joaquim Silva e Osvaldo Sangiorgi, com direito a um passeio pelo "Ary Quintella", e gradativamente conseguiu!....O Livro de Ary Quintella trazia uma série de exercícios de Aritmética para a preparação de candidatos aos exames de admissão ao ginasial. "Ouvia-se nos subterrâneos da discriminação racial e social a "chacota" de que estudar, não é coisa para todo mundo". Realmente ! Só para os mais dotados, é claro ! Não de inteligência geral em termos de amplitudes de habilidades cognitivas, mas, os dotados de um maior e melhor poder aquisitivo. Na época, talvez por uma mera questão de semântica preconizada por alguns artigos da lei, o Ginásio Pernambucano ( GP ), passou a ser apelidado de Colégio Estadual Pernambucano ( CEP ), como se os demais Colégios Estaduais em Pernambuco também não o fossem...E frequentado pela "nata" da sociedade pernambucana, sobretudo, em termos de poder aquisitivo, restando aos desafortunados que lá fizeram parte, a honradez advinda de sua competência nítida, límpida e transparente nos estudos. Nem todos que ali estiveram eram ricos, nem todos que eram "inteligentes" estavam ali. Mas, todos que por ali passaram demonstrarem competência naquilo que se predispuseram fazer na vida social. Bedéis, chefes de disciplina, agentes da administração em geral, Diretores e principalmente os professores, eram de se tirar o chapéu e agradecer. Dentre os quais são comumente citados; Hilton Sette, Waldemar de Oliveira ( Sim ! Aquele do Teatro ), José Lourenço, José Brasileiro Vila Nova, Manoel Correia, Manoel Heleno...

Voltando-se ao tema central, uma visão superficial, mas, não menos importante das crianças que estudavam no Areeiro da época , levava-nos a índices negativos alarmantes. O quadro era mais escuro que os próprios quadros de escrever contidos nas salas de aulas do período...Na verdade, chamava-se de "quadro negro ". O Negro não é cor...é raça ! E o escuro do quadro estatístico lá no Areeiro, prendia-se ao fato da maioria viver nas trevas da Educação. A própria Educação assim se comportara. O desmantelamento das escolas públicas e a insipiência do Processo Educativo eram notórias. Que pensar de uma Educação visceralmente mergulhada em meio à conflitos políticos frequentes ?

Quando muito, as crianças do Areeiro completavam apenas o primário. Outros, na faixa etária apropriada, nem sequer chegavam a completar o primário. Razões de cunho social eram apontadas com certeza como causas principais...Quanto aos adultos, o índice de Analfabetismo também era assustador...Nenhuma novidade então !

Não haviam Escolas na época, localizadas no Areeiro, nem tampouco as existentes em Camaragibe no início da década de 60, do séc. XX , em sua maioria particulares, atenderiam a demanda da população estudantil caso a educação realmente fosse prioridade Nacional. As pessoas têm por si, suas próprias prioridades, algumas divergentes e outras comuns a todas. A prioridade maior de qualquer pessoa é viver bem ! Particularmente, não acredito em que se viva bem através de uma visão desarticulada de mundo. Às vezes, só comendo e dormindo todos dias e repetindo tudo isso indefinidamente e com o auxílio apenas de outros afazeres peculiares ao dia a dia, destituídos de direção.

Sentar-se ao trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar , também é metafórico. Pode-se fazer tudo isso em movimento contínuo e repetido , sem nenhuma variação, sem nenhum sentido maior para a vida. A vida ganha contornos multicores quando ocorre em relação simbiótica e vinculada a uma concepção melhor de mundo, a uma percepção mais ampla de valores hierarquicamente considerados supremos, surgindo como um telescópio, dentro do Universo do maior laboratório humano chamado "Cérebro".

CEGUEIRA IMPOSTA

E nos lares à noite, entrava em cena os apagões e a tosca claridade dos candeeiros a querosene, coadjuvados pelo bruxulear compulsivo das chamas acesas, refrescadas e apagadas, quase sempre, pelo vento que se esmerava em entrar às casas por debaixo da porta e frestas das janelas. As crianças do Areeiro que estudavam à época, sofriam todo tipo de obstáculo quanto a sua formação. Os índices de evasão e repetência eram alarmantes. O quadro era mais escuro que os próprios quadros de escrever contidos nas salas de aulas do período...Na verdade, chamava-se de "quadro negro ". O Negro não é cor...é raça ! E o escuro do quadro estatístico lá no Areeiro, prendia-se ao fato da maioria viver nas trevas da Educação. A própria Educação assim se comportava. O desmantelamento das escolas públicas e a insipiência do Processo Educativo eram notórias. Que pensar de uma Educação visceralmente mergulhada em meio à conflitos políticos frequentes ? Conflitos de tendências pedagógicas (escolanovismo x educação tradicional), greves diversas, ditadura, pobreza material, assassinatos de líderes nacionais e internacionais.

No Brasil, na tentativa de justificar os desmembramentos decorrentes das grandes concepções ideológicas, criou-se uma escola gratuita, universal, laica, leiga, lisa e abandonada. Em termos comparativos, a história da educação brasileira reside num quarto escuro repleto de cadáveres embalsamados representados por leis, resoluções, planos, propostas, programas, documentos diversos, impostos a população estudantil.

Após a expulsão dos jesuítas em 1759, pelo Marquês de Pombal, pouco ou nada se fez até a primeira lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional em 1961(LDB).

*AS ESCOLAS

Quando muito, as crianças do Areeiro completavam apenas o primário. Outros, na faixa etária apropriada, nem sequer chegavam a completar o primário. Razões de cunho social eram apontadas com certeza como causas principais...Quanto aos adultos, o índice de analfabetismo também era assustador...Nenhuma novidade então !

Não havia Escolas na época localizadas no Areeiro, (...surgiu depois de um certo tempo, na casa de Pedro Gordo (Presidente da Associação de moradores), um embrião de escola de adultos visando alfabetizar os mais velhos). As escolas existentes em Camaragibe no início da década de 60 durante o séc. XX , por sinal, em sua maioria particulares, não atenderiam a demanda da população estudantil, em termos de vagas, caso a educação realmente fosse considerada uma prioridade Nacional. É um fato que as pessoas têm por si, suas próprias prioridades, algumas particulares e outras comuns a todas, bem como, a percepção de mundo de cada uma atua como instrumento principal na consecução do melhor. Entretanto, a prioridade maior de qualquer pessoa é viver bem, é viver com qualidade, é ter sua cidadania atendida de forma plena e duradoura.

ROTINA

Particularmente, não acredito que se viva bem através de uma visão desarticulada de mundo. Às vezes, só comendo e dormindo todos os dias e repetindo tudo indefinidamente com o auxílio, às vezes, de outros afazeres peculiares ao dia a dia, como ver o sol nascer, ver a lua aparecer e nada de bom acontecer a não ser mergulhar numa vida de sucesso "post-mortem" e de destino incerto. Seria um viver e não ter a vergonha de ser feliz ou não ter a oportunidade por toda maldade que se aplica ao homem comum destituído de conhecimentos ? Mesmo assim, muita criança aprendeu a ler, a contar, e a escrever heroicamente, também pelo uso constante de uma nova escrita ! "Sua própria história de vida"... refletida na tela da memória e nos sonhos de cada uma. Apesar dos abalos frequentes, no tocante as dificuldades. o Areeiro serviu de palco e cenário dinâmico e riquíssimo em cores, atores e ações, sob o fundo musical do mais amplo coral da natureza, “o cantar dos passarinhos, o estrilar das cigarras, o roncar das enxurradas aplaudidas pelas chuvas e o vociferar das rodas e motores nas estradas”, contemplando à execução de verdadeiras peças teatrais ao ar livre, sem roteiros nem final de chegada, repetindo e construindo valores inerentes à consecução de uma nova vida, impregnada de inúmeras tentativas na materialização de sonhos em comum. Sonhos recheados de paciência e aliados a resistência, a perseverança nos embates mais frequentes, o enfrentamento resoluto da natureza das ações, mescladas à dores, dissabores e amores indeléveis. Os seres vivos ali presentes, faziam parte de um elenco diversificado de atores, protagonizando cenas de uma peça reconhecida e cultuada universalmente, chamada vida. Vida na linguagem de certos estudiosos é a tentativa de um equilíbrio dinâmico, ou seja, uma tentativa de chegar-se a um equilíbrio que representa o seu próprio fim. Definitivamente, isto só se consegue, quando se morre. Não há mais nada o que fazer, trocar, almejar, buscar, pensar, sonhar, mover-se, amar. Seria um alcançar paradoxal à manutenção da vida, já que se trata de uma tentativa...Travar-se-ia então, uma luta frequente entre o fazer e o desfazer imediatamente, para se tentar fazer mais uma vez e assim, manter-se vivo através de um dialetismo constante. Manter-se vivo sem ter que passar pela inconstância do equilíbrio é um martírio só evitado no paraíso bíblico chamado Éden escrito pelos sacerdotes hebreus. No Areeiro não ! Lá se tinha motivos de sobra para a assunção à eternidade, segundo aquele conceito explicitado sobre vida. E a vida no Areeiro ultrapassava aos limites meramente biológico, para atender a ousadia irracional de buscar-se no extraordinário e no incompreensível, no desequilíbrio gerado pelos contratempos, irremediavelmente, perseguidos como busca do inatingível, a razão maior do "ser e o tentar". Na nossa visão "O tentar ser refletia-se, ao final, na razão total de toda existência viva"... A maioria dos problemas atinentes a outras regiões de Camaragibe, apresentava um umbral de tolerância quase que semelhante ao do Areeiro. Poucas diferenças ficavam por conta da discriminação de pobres contra os mais pobres ou dos pobres contra os miseráveis.

No Areeiro da época, ter um emprego certo e registrado em carteira, era símbolo de sucesso (status), embora grande parte fosse de operários da Fábrica de Tecidos de Camaragibe, fundada pelos Engenheiros Antonio Carlos de Menezes e o Frances Pierre Collier em 1893. Por sinal, a fundação da fábrica com a sua vila para abrigar seus operários, foi um marco histórico importante para a povoação da região. A vila da fábrica situava-se em torno das cercanias da fábrica e se estendia até a ex-sede do Centro de Camaragibe. A escola Estadual Frei Caneca (1968), situada no centro, foi construída em terrenos obtidos após a derrubada algumas de casas da vila. A própria Rua Adélia Collier era totalmente constituída de casas da vila da fábrica. Lá situava-se um clube frequentado pela "alta" sociedade chamado "Vesúvio."

Ainda com relação aos habitantes do Areeiro, razões existiam por demais, para que pudessem se manter vivos. "Viver sem problema não é vida em toda sua plenitude" ! É vegetar ao sabor dos ideais de um Robson Crusoe ! É manter-se vivo sem destino ! É destituir-se da vida de relação. Consequentemente, bloqueia-se o convívio com outras pessoas e o ser flutua isolado em pensamentos hermeticamente fechados em si, e sobre si. Viver é algo muito mais amplo que o isolacionismo pessoal, transcende ao limite da introspecção pessoal para se abrigar num infinito de possibilidades humanas que se espalham e se harmonizam no convívio social.

Nas ruas, as crianças esbaldavam-se em brincadeiras cada vez mais diversas; Cantigas de roda, esconde-esconde, garrafão, pião, pulando corda, berlinda, briga de galo usando os dedos indicador e médio para reversarem-se na contenda, carrinhos de lata, cavalo de pau e, às tardes, empinação de papagaio ( pipa ), jogar futebol, barra á barra com bola de meia, jogo de bola de gude , além de aproveitarem os finais de semana, para o famoso cozinhado, incluindo brincadeiras com bonecas, embora quase sempre ocorressem no dia-a-dia. Às vezes, o esconde-esconde tornava-se enfadonho porque quase ninguém era achado nos esconderijos, exceto, nas noites de lua cheia quando este satélite refletia a luz mais intensamente, facilitando sobremaneira, a uma melhor acuidade visual de todos.

A ASSOCIAÇÃO DE MORADORES

Lá no final da rua principal, um cidadão conhecido por “Pedro Gordo”, presidente da Associação de Moradores, entoava quase sempre, à tarde, o seu grito de alerta, acompanhado de repetidas batidas num “flandre” através de uma baqueta improvisada, geralmente, uma haste pequena de um galho de araçá. Seus gritos ecoavam por quase todo Areeiro, anunciando em voz alta; olha a festa da jacaaaaa, olha a festa da burricaaaaa e outras...Lá na Associação, as crianças submetiam-se a brincadeiras diversas; quebra panelas, pau de sebo, corrida do ovo na colher, assado... sendo brindadas ao final, com o lanche previamente anunciado e servido, gentilmente por, Dna. Alaide, esposa do presidente. Mesmo antes da iluminação elétrica, a Associação construiu um salão de festas usado para abrigar os participantes durante as reuniões e encontros musicais, protagonizados inicialmente por um grupo de chorinho... ( Música : Lembranças. Compositor Raul Sampaio:... *Lembro o olhar, lembro o lugar, teu vulto amado...lembro o sorriso e o paraíso que tive ao teu lado...lembro a saudade , que hoje invade os dias meus...para o meu mal...lembro afinal do triste adeus*......), e após a iluminação elétrica, quase sempre uma “Radiola ABC", rodando LPs ( Long Plays ) e Compactos de 33 rotações duplos ou simples. em datas previamente estabelecidas, faziam a festa.. Um fato digno de ser mencionado é que algumas dessas crianças demonstraram logo cedo, suas habilidades em caçar, pescar ou desenvolverem atividades artísticas, por conta própria, sem muita ingerência dos pais. Daí a criação de um mini-circo criado e coordenado pelo filho do secretário da Associação, onde essas crianças tiverem a oportunidade de demonstrarem suas habilidades com a música, o teatro, a dança, a poesia.,. enfim, com as Artes. só após alguns espetáculos, o acontecimento chamou a atenção dos pais, que se entusiasmaram e passaram a assistir às apresentações... Naquele instante, utilizava-se o rádio como instrumento de informação e entretenimento. Escutava-se bastante os programas musicais de Valter Lins, Tavares Maciel, Fernando Castelão. durante os dias úteis da semana, geralmente à tarde e, aos domingos, o programa de Paulo Duarte que também poderia ser assistido “ao vivo” no Auditório da Rádio Jornal do Comércio.

Registro se faça à participação de uma dessas crianças mo programa, cantando um bolero de Waldick Soriano intitulado: A Carta: Minha querida...saudações...escrevo esta carta...e não repare os senões...para dizer o que sinto...longe de ti, amargurado na saudade , nas horas de vida e felicidade...Renunciar ...

Também ouvia-se com um certo "frenesi" uma novela de rádio que chamava muito a atenção do público em geral, sob o título : Jerônimo, o Herói do Sertão. Na área literária procurava-se ler“gibis” e revistas, além de livros clássicos de nossa Literatura como as obras escritas por; José de Alencar, Olavo Bilac, Castro Alves, Machado de Assis.

OS FATOS SÃO FEITOS

Carro antigo, com direito a alavanca, buzina de caminhão, espumando pelas ruas, assim vivia o velho "Dão"...Galego, de olhos azuis, ajudante de feiras, sofrendo de deficiência mental, não dispensava seu "Bio-móvel " nas pequenas viagens que fazia de um trecho a outro pela região, fazendo mandados, levando e trazendo recados, assim, procedia o pobre coitado, às custas de algum trocado.

Dirigia seu carro por simulação. Gostava de estacionar em frente ao Centro Esportivo de Camaragibe, onde funcionava a escola do Prof. Luís. Quando algum pedido lhe era feito, de pronto estava preparado, denotando alegria, pois sabia que teria naquele momento como presente duas coisas que gostava muito de fazer : receber alguns trocados e dirigir o seu Bio-móvel pelas ruas da cidade. Simulava rodar a alavanca de ignição, ligava o carro e nele entrava batendo a porta com tamanha envergadura...corpo projetado para frente, direção nas mãos, buzina e motor na garganta, engatava suas marchas e circulando até o destino traçado, fazendo o que lhe devia, voltava suado, transmitia o que podia, apesar de sua dificuldade em emitir qualquer palavra, ainda assim, conseguia se comunicar após muito esforço e com a ajuda do dono do recado....

Comparando-se o velho Dão ao Motorzinho, cada um dentro de suas características genuinamente particulares, são exemplos vivos de dignidade, apesar de toda e qualquer dificuldade inerente a vida de cada um ...Se ainda vivo, com certeza, já teria demonstrado coragem e dito ser o seu carro o mais antigo da cidade e, talvez, viesse a compor uma frota de automóveis imaginários ( Bio-móveis), juntamente com o "Motorzinho" ...que anda livre pelas ruas e praças, estimulando a curiosidade ...

Pois é Dão ! Você também fez história...Atentos aos seus movimentos, alguns olhinhos de criança, não dispensavam nenhum movimento, e guardaram como lembranças, o prazer de tê-lo visto em pleno ato contínuo de sua apresentação. Faço-lhe, então, através de lembranças expressas através da escrita, o registro de sua passagem, com honras e méritos pela sua coragem, de ter contribuído em transformar um cenário de pura melancolia, num ambiente de alegria no teatro de rua da cidade.

*PRIMEIRA EMANCIPAÇÃO DE CAMARAGIBE

Em 20 de dezembro de 1963 a Lei Estadual nº 4.988 elevou o distrito de Camaragibe à categoria de município. No dia 06 de julho de 1964, um acórdão do tribunal de Justiça anulou a emancipação (Mandado de Segurança 59.906).

*SEGUNDA EMANCIPAÇÃO

Em 13 de maio de 1982 através da lei estadual nº 8.951, Camaragibe foi desmembrado de São Lourenço da Mata, assumindo a condição de Município.

A CULTURA

A educação tradicional como tendência pedagógica incentivava ao aluno à leitura de obras importantes, principalmente, no período Colegial, com bastante ênfase no Curso Clássico. Veio a televisão chamando a atenção de todos. O difícil era a aquisição de um aparelho de televisão, razão pela qual, a garotada buscava a sede do Centro Esportivo de Camaragibe, que recebera a doação de um aparelho feita pela família Lapenda. Vieram então, as lutas de boxe, lutas livres, shows musicais de auditórios, noticiários. Na Europa ocidental, um conjunto musical de Liverpool ( Inglaterra ) chamado “The Beatles” começava a fazer sucesso e a revolucionar a história da música, além de modificar certos costumes, tocando e cantando o seu Rock in Roll (iê iê iê). Tal revolução propalou-se no mundo ocidental trazendo enfaticamente consigo, uma avalanche de mudanças de costumes. No Areeiro, os jovens acompanharam essa mudança, usando calças apertadas, cabelos longos, dançando Rock e causando indignação e surpresa aos pais. Os Beatles chegaram! Tempo de mudança, que tal ouvir: “I Want to Hold Your Hand”, Please Please Me, She Loves You, Girl, Yesterday, numa década em que a herança do passado musical era muito boa, mas não mexia com o ímpeto da juventude de praticar e querer ouvir coisas novas.

No Brasil, gravadoras e emissoras de rádio e televisão apressaram-se em adaptarem-se aos novos conceitos, as novas mudanças, criando e estimulando seus elencos de artistas, através de uma série de campanhas veiculadas pelo rádio e a televisão, como: A “Jovem Guarda”, programa de televisão que tinha como apresentador o cantor e compositor Roberto Carlos Braga. Tal programa, criou uma espécie de comoção nacional entre os jovens, garantindo dessa forma, uma fatia muito ampla na Indústria Fonográfica e afins, presentes no mercado nacional. A criança do Areeiro agora era o/a jovem em busca de novos valores. Chegou o grande momento de encarar a vida sob novas perspectivas a. Todos continuaram a se relaciona harmonicamente na Sociedade, mas com um olhar mais aguçado para o futuro. Paulatinamente, mudando para um nível mais concreto de vida. As fantasias infantis continuaram a ocorrer nas gerações subsequentes, porém, a geração de adolescentes que agora se formara buscava novos rumos, novos rituais, novas formas de encarar o mundo, incluindo a preocupação inicial com o seu futuro profissional.

Os jovens do Areeiro também participavam dos grandes eventos folclóricos e festivos vivenciados pela população Camarajibense. Durante as festividades juninas enfeitava-se às ruas com bandeirolas, balões sanfonados e cada família preocupava-se em acender suas fogueiras em função das reverências que se faziam aos santos católicos : Santo Antonio, São João e São Pedro. O ponto alto das comemorações ocorria durante as vésperas de São João . Muito milho cozido e assado, canjica, pamonha, pés-de-moleque, bolo de mandioca, bolo de chocolate, bolo de milho , refrigerantes, refrescos, constituíam-se, em parte obrigatória, no cardápio oferecido nas residências. Milho assado nas brasas da fogueira, promessas eram feitas pelos jovens, principalmente as jovens durante a véspera de Santo Antonio, considerado o Santo casamenteiro. Ainda diante da fogueira fazia-se o pacto do compadrio gerando uma maior aproximação e proteção entre os compadres a partir dali. Ruas enfeitadas, comidas na mesa, fogos em geral, desde o traque de massa até os foguetões e rojões, fogueira acesa, quadrilha se apresentando e o forró rolando a festa inteira.

O PASTORIL

Logo na saída do Areeiro, existia o pastoril de Luís Guarda, que se tornou famoso pela organização do evento e pelo entretenimento que proporcionava. No palco, sobre um tablado de madeira, eram formados dois cordões de adolescentes muito bonitas: O cordão encarnado comandado pela contramestra e o cordão azul comandado pela mestra, além de uma outra garota no centro representando a Diana, vestindo-se das duas cores. Todas usavam uma pandeirola, acompanhando as cantigas de pastoril entoadas com bastante vibração.

Meu São José dá-me licença

Para o pastoril dançar

Viemos para adorar

Jesus nasceu para nos salvar

É do meu gosto e de minha opinião

Amar as "duas cores" com prazer no coração

É de amar, as duas cores

Com prazer no coração

Cantiga entoada pela Diana. A representante das duas cores. Quando o cordão azul se apresentava substituía as “duas cores” pelo 'azul', acontecendo o mesmo ao cordão encarnado que substituía as “duas cores” pelo 'encarnado'.

No pastoril também ocorriam as figuras do Velho, a Camponesa e o Anjo. Durante as apresentações eram feitas doações em dinheiro em favor dos partidos ou cordões. Na última apresentação, contava-se o valor final das doações recebidas por cada partido e aquele que durante as jornadas tivesse atingido um valor maior em dinheiro, seria o vitorioso da contenda e a representante principal "coroada".

O NATAL

Na festa do Natal, já antecipada durante o início de novembro, acompanhava-se no Areeiro os movimentos do Parque da Festa instalado na Rua da Festa, hoje chamada de Rua Eliza Cabral de Souza, em homenagem a parente de Pedro de Souza, considerado homem forte de Camaragibe. As luzes complementares do Parque, acendiam-se à noite provocando um clarão muito forte que se estendia até os céus, enquanto o serviço de som dotado de várias cornetas ( hoje substituídas pelas caixas de som ), eram instaladas em diferentes posições, anunciando mensagens natalinas. Recados entre amigos e enamorados eram divulgados publicamente acompanhados de fundo musical dos grandes sucessos do momento. No rol dos artistas divulgados entravam; Orlando Dias, Ângela Maria, Cauby Peixoto, Carlos Alberto, Nelson Gonçalves, Augusto Calheiros, e outros... Enquanto isso, lá no Areeiro , a animação era geral. Existia uma espécie de pacto anual entre as pessoas no sentido de se encontrarem na Rua da Festa durante o Natal. Existiram casos em que pessoas se encontravam anualmente. Um fato é que todos gostariam de se apresentarem bem; roupa nova, dinheiro pra comprarem pipocas, roletes de cana, algodão doce, cavaco, frutas carameladas e se divertirem nos brinquedos. Alguns adolescentes conheceram seus pares ali. A estratégia para ser aceito partia do homem ao piscar um dos olhos em direção a sua pretendente. Em caso de correspondência, o caminho estava aberto a um encontro para que o casal pudesse conversar. O homem teria que pedir consentimento para namorar àquela pretendente, que poderia dar a resposta em “rito sumaríssimo”, ou seja, imediatamente, antes que ele concluísse a última palavra, ou então, solicitar-lhe um tempo prá pensar. Significaria que o jovem seria intensamente investigado, até a sentença final. Sendo positiva a resposta, iniciava-se um novo cerimonial que culminaria com a ida do jovem à casa dos pais da namorada para ser questionado, principalmente no tocante aos seus interesses pela jovem, onde entravam também uma série de informações como : estudo, profissão, pais, endereço, e, em caso de ser aceito pelos pais da donzela, marcava-se desde já, os dias em que seriam permitidas sua presença ao recinto, mas, sempre vigiados pela mãe, irmãos.

31 DE DEZEMBRO

Normalmente. durante durante o 31 de dezembro, no Areeiro, a maior parte das famílias abrigava-se em casa para reverenciar a mudança de datas. O Cardápio de comidas era praticamente o mesmo, em relação ao Natal. O desejo manifesto por cada um, prendia-se à esperança por melhores dias, incluindo a satisfação de objetivos traçados, desde àqueles ligados a área profissional, quanto aos urgentemente ligados à superação de conflitos, doenças e outras questões de “fórum intimum". Logo após a passagem de ano, costumava-se visitar e receber visitas mutuamente, principalmente entre vizinhos mais próximos. A expectativa de mudança gerada por um novo ano que já acontecera representava, dialeticamente motivos de preocupação e regozijos perenes na vida daquele povo. Razão pela qual, o ano novo que eclodira, seria tratado e festejado, ao menos de início, semelhantemente ao surgimento de um novo filho. Com toda pompa, obedecendo a cerimoniais já consagrados em sua evolução, desde o nascimento até o estágio final de amadurecimento.

De tal sorte que, quando o relógio atingia a marca de: 00:00 h, as luzes elétricas apagavam geral e as pessoas buscavam o aconchego das demais, através de palavras alvissareiras, recheadas de abraços e apertos de mão solenes. Momento de defumar a casa, momento de disparar os fogos de artifício, em que pese, o choro de alguns e, paradoxalmente, o sorriso de outros. Inegavelmente, eram momentos sinceros, fraternos e de profunda emoção, despojados de quaisquer outras intenções, quer não fosse a de harmonizar-se com o mundo em redor. No dia 06 de janeiro, costumava-se fazer reverência a festa de Santos Reis como extensão do Natal. Toda ornamentação das casas e ruas só seriam desfeitas após esta data, muito mais pelo reconhecimento à visita dos Reis Magos ao menino Jesus, ainda na Manjedoura. Eram eles: Melchior ou Belchior o mais velho, Gaspar o mais novo e Baltasar com idade média entre os dois. Os escritos atinentes a esse acontecimento ocorrem na Bíblia em Matheus, revelando que guiados por uma estrela, os Reis Magos identificaram o local em que o menino Jesus se encontrava e ofereceram-lhe “Ouro” em reconhecimento a realeza, “Incenso” a sua divindade e a “Mirra” representando simbolicamente a imortalidade. A Mirra era uma espécie de resina antisséptica usada para embalsamar os mortos. Ainda hoje, a troca de presentes que se realiza durante o dia do Natal é uma dádiva dos Reis Magos. Cessadas as atividades Natalinas no Areeiro, o cenário normalmente era refeito, dentro de um clima impregnado de bastante respeito, aliado a preocupação substancial de nínguém ferir outrem. Todavia, detectava-se sem muito esforço a presença de condicionantes diferentes, acrescidos à conduta de vida de cada pessoa, dentre os quais destaca-se: "As perspectivas de futuro geradas pela introdução de um novo calendário na vida de cada um". O momento era de suprema esperança no sentido de se vivenciar novas realidades em função dos sonhos contidos nas mentes e iniciados ou ratificados por ocasião dos festejos natalinos. Os mais jovens e crianças em férias escolares, agora ocupavam todo o espaço de tempo possível para vivenciarem as experiências ainda adormecidas pela exiguidade de tempo no cumprimento de outras tarefas, anteriores ao período de férias. Assim, além das brincadeiras tradicionais, buscavam o novo, o inusitado, algo que pudesse trazer-lhes uma maior amplitude de conhecimentos a serem absorvidos e repassados por ocasião da volta às aulas. Surgiram várias ideias, porém, a de maior impacto e aceitação foi a de explorar regiões ainda desconhecidas pela maioria. Assim, conheceu-se o rio Capibaribe de uma forma diferente da usual. Cortando a Mata São João e, consequentemente margeando uma determinada extensão de terra do município de São Lourenço da Mata. Outras explorações foram feitas ao Açude da Prata, nome atribuído a lenda

de que Branca Dias, esposa de Diogo Fernandes, primeiro proprietário do Engenho Camaragibe, tenha lançado pratas em suas águas. Visitou-se também as Matas de Eucalipto e Azeitoneiras, ao Convento das Carmelitas, o Seminário Cristo Rei, a estação de Trem, a estrada da Volta ao Mundo, o Açude São Bento, contido pelo Balde, a casa Grande do Engenho Camaragibe ou casa de Maria Amazonas Mac Dowell, a construção de um Convento de Padres em Aldeia (...hoje FOP), através da ação do Arcebispo D. Hélder Câmara com apoio dos EUA, através de seu presidente, John Fritzgerald Kennedy, também católico e assassinado em 22 de novembro de 1963, sexta-feira, às 12.30h, quando circulava na praça Dealey em Dallas Texas...

O CAMPO DO CENTRO X ANTONIO GERMANO

Aqueles que acompanhavam partidas de futebol, quando o time do Areeiro não estivesse jogando, buscavam o campo do Centro Esportivo para assistirem aos jogos locais. Muitos tiveram a oportunidade de assistirem ao Ballet de Futebol promovido pelo time do Centro, com destaque para vários atletas, dentre os quais o Vavá Nero, filho da Educadora Maria Alice de Barros; Chico Honorato e Jota reversando-se no Gool, Amaral, Pedro Tacaca, Roberval, Arnaldo Pavão, Nezinho e outros que enchiam os olhos dos expectadores de emoção, sob o fundo musical e aos gritos de satisfação da torcida capitaneados pelo torcedor nota mil conhecido por Elias Sapateiro. Vitória certa, baile à noite, na sede. Lá se encontravam moças e rapazes, além de senhoras acompanhadas de seus respectivos pares ,calculadamente bem vestidos e disponíveis a dançarem. Era noite de "gala" , principalmente àquelas em que se dava o aniversário do clube, ou logo após uma vitória diante do Guarany ou Penharol que também faziam parte do cenário esportivo de Camaragibe. Ainda durante os bailes, menção honrosa seja feita às figuras do professor Luís Nascimento e o Músico Instrumentista conhecido por sr. Tena, considerados verdadeiros pés de ouro na arte de dançar. Era de fazer a menina dos olhos gozar de prazer aos vê-los dançando; O tratamento destinado à dama, os passos, as evoluções e o desfecho final. Por serem menores de idade, alguns garotos do Areeiro comprimiam-se do lado de fora, nas janelas do clube, para assisterem ao espetáculo. Entretanto, aos shows da "Jovem Guarda" na televisão exibidos aos domingos, à franquia ao Clube era garantida. Sob a orientação do sr. Antonio Germano, todos eram obrigados a rezar um " Pai Nosso " e em seguida, sentavam-se de forma ordeira e sem muita conversa para assistirem ao programa. O bonito de tudo é que o sr. Antonio era veementemente contra a qualquer tipo de bagunça. O indivíduo teria que assistir ao show, calado sob pena de ser posto sumariamente para fora do recinto. Além disso era ele o responsável pela disciplina da excelente

Escolinha do Prof. Luís, que funcionava ali mesmo. Na época, escreveu não leu o pau comeu, ou seja, ou o aluno decorava a tabuada, ou a palmatória cumpriria sua função. Claro que essa não seria tarefa do sr. Antonio que se preocupava em formar fileiras para a entrada do aluno, quase sempre ensinando a cantar o Hino do Brasil, ensinando a orar e durante o recreio evitando balbúrdia. Sr. Antonio Germano, também ajudava na Igreja Pio X, durante a celebração das missas. Fazia parte do Canto Coral e dos filhos de Maria. Foi funcionário Público pela Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, tendo sido lotado na Escola Estadual Frei Caneca. Morou no Areeiro e pela sua contribuição à Educação, foi premiado com a medalha de "Honra ao Mérito" pela Câmara de Vereadores.

Paullo Carneiro
Enviado por Paullo Carneiro em 06/02/2017
Reeditado em 17/02/2017
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