ENTRE O PAVOR E O TEMOR (SOCORRO! ALGUÉM PODE ME AJUDAR?!)
“Num tô intendeno nada!”
Acordo e, de repente, vejo pipocando em tudo que é noticiário policial a chacina nas penitenciárias de Manaus. Ao ver as reações de nossas autoridades face a situação, não vejo outra saída a não ser pedir ajuda.
A questão é: o que os meus olhos estão vendo e meus ouvidos estão ouvindo (com o perdão dos trocadilhos) são, de fato, fatos, ou meras quimeras? Eu acordei no Brasil ou em Marte?
Por favor, alguém aí pode me ajudar?!
Autoridades estaduais e federais – incluindo a presidente da Suprema Corte de Justiça e o pretendente da República – ficam atônitas com a eficiência (embora inegavelmente aterrorizante) operacional e a competência administrativa do crime organizado, face a um Estado exatamente contrário: completamente ineficiente e totalmente desorganizado.
De tão atordoado, o pretendente levou 04 dias pra assimilar o nocaute e, ainda meio grogue, chamou de acidente a segunda maior carnificina do gênero em toda a história do país – perdeu a oportunidade de continuar calado.
O sinistro da Justiça, antes de qualquer relatório pericial, concluiu que o acontecido não poderia ser posto na conta do crime organizado porque a maioria dos assassinados foram condenados por crimes não relacionados às facções apontadas como provocadoras do fato – como se na cadeia houvesse alguma lei ou poder capaz de impedir que o crime recrute novos reforços dentre os que ali estão, independentemente dos motivos que os levaram para lá, ou como se o tipo de condenados mortos mudasse a origem de quem ordenou a matança. Ora, ao crime organizado pouco interessa quem serão as vítimas; sua luta, neste caso, é contra o Estado, não contra indivíduos.
De certa forma, ele (o ministro) não está de todo errado. Realmente, o débito deve ser colocado mesmo é na conta do Estado (aqui, no sentido de sistema público), afinal, o crime organizado não administra nenhum presídio – pelo menos oficialmente.
“Ah, mas colocar na conta do Estado (agora, no sentido de unidade federativa) não pode, porque o complexo penitenciário onde ocorreu o ‘acidente pavoroso’ é administrado pela iniciativa privada”, alegam as autoridades – como se a empresa tivesse sido contratada por marcianos. “A responsabilidade é toda deles”, dizem os secretários de Estado. “Nós enviamos relatórios avisando e solicitamos escolta armada”, retrucam os prestadores do serviço.
Nesse particular, seria de bom alvitre alguém lembrar os senhores mandatários e seus assessores que, embora tenham contratado uma empresa para administrar os presídios – e podem contratar quantas quiserem, pois dinheiro não é problema, como já mostraram várias reportagens – não foi ela quem o povo, através do voto, escolheu para lhe representar e administrar o Estado, Estado que, aliás, é mantido com o dinheiro desse mesmo povo que elege os governantes. Seria bom lembrar aos que dizem que a responsabilidade não é do Estado (sistema) que quem recolhe os impostos e taxas não é a empresa contratada pra administrar os presídios, e sim o Governo. O fato dele usar o dinheiro arrecadado para terceirizar a gestão da coisa pública, apenas a descaracteriza um pouco como tal – além de atender outros interesses que não vale entrar no mérito agora –, mas em nada diminui a responsabilidade do sistema público e de quem o gerencia. O que muda, neste caso, é a estratégia de gestão, não a pessoa capaz para gestar, que, com ou sem terceirização, será sempre quem foi eleito para este fim.
Enquanto não se identificam os mortos nem os mandantes dos crimes, os secretários batem boca com o ministro. Este disse não ter recebido nenhuma solicitação de ajuda, enquanto aqueles afirmam que enviavam relatórios semanais ao Governo Federal.
A presidente do Supremo Tribunal Federal vai ao Estado e reúne com seus colegas de toga, mas (em relação à Imprensa) entra muda e sai calada – talvez a fala do outro presidente (o da República) lhe tenha soado como presságio.
E por falar em Justiça, acusados de furtos de comida em supermercado estão sendo colocados (na cadeia) juntos com criminosos periculosos porque lhes é negada a audiência de custódia, pois o Judiciário está de recesso. Veja que não são alguns juízes, mas a instituição que está em recesso, como se o crime entrasse em recesso ou os criminosos combinassem com as vítimas dia e hora de as atacarem.
A Imprensa bem que procurou explicação sobre a suspensão das audiências de custódia durante o tal recesso, mas o órgão do Conselho Nacional de Justiça (que, em tese, fiscaliza a conduta das comarcas e tribunais) responsável por repassar as informações – a Assessoria de Comunicação – também encontra-se em recesso.
Já instituições como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e AMB (Associação dos Magistrados do Brasil), entre outras, sinalizam requerer do Estado indenizações às famílias dos presidiários assassinados. “Eles estão sob a responsabilidade do Estado, que tem o dever de protegê-los”, alegam.
Verdade. É obrigação do Estado proteger os presidiários.
É importante não olvidarmos que também é dever (até mais ainda) do Estado proteger o cidadão (seja ele quem for) que, em sua faina diária, é vítima de toda sorte de violência, incluindo assaltos brutais e latrocínios. E aí, as famílias desses infelizes estão sendo indenizadas também?
E, o mais trágico – e também cômico –: apesar da alardeada crise econômica, para o sistema prisional sobra alguns bilhões de reais; porém, depois do anúncio claramente improvisado do pretendente Temer sobre o Plano de Segurança, fica claro que o plano é cada um rezar pro seu santo de devoção – ou recorrer à forma sobrenatural que crê – e torcer pra permanecer fora do alcance da mira do bandido, porque o Governo não tem é plano algum.
Aliás, talvez seja por saber que está sobrando dinheiro para a Segurança, que o Governo do Amazonas paga mensalmente por preso praticamente o dobro (R$ 4.700,00) da média do país (R$ 2.400).
“Um preso no Brasil custa R$ 2.400,00 por mês, e um estudante do ensino médio custa R$ 2.200 por ano [13 vezes menos]. Alguma coisa tá errada na nossa pátria amada”. Palavras da presidente do STF, ministra Carmem Lúcia em novembro de 2016.
Enquanto os criminosos decidem a permanência (ou transferência) de juízes, administram empresas, financiam formação de advogados e eleição de mandatários públicos, os governantes dizem que a culpa é de quem presta o serviço, a presidente do Supremo fica calada (embora demonstre está agindo), o da República diz que foi um acidente, e alguns dos novos prefeitos baixam decretos entregando tudo a Deus.
De fato, Manaus viveu um “acidente pavoroso”. E o Brasil vive um colapso (em todos os aspectos) TEMERoso.