A ARTE DE “PICHAR O SETE”

Opinião /Desabafo de uma paulistana

Nos últimos anos a megalópole Sampista, essa nossa que abraça o mundo inteiro, foi extremamente judiada.

É preciso escolher palavras, pensamentos e orações dignas das omissões do momento.

Aqui não opino apenas com os olhos de quem é paulistana da gema, mas falo com o coração angustiado de quem , aos poucos, sente perder algo que lhe é muito caro, no caso, a externar a tristeza que sei que não é só minha, ao ver o estado de degradação social da cidade aonde eu nasci, a quem contribuo socialmente com trabalho, impostos e demais ações cidadãs, então, teço algumas palavras à minha querida cidade da qual tenho vagas lembranças de tempos melhores para a tábua das comparações da vida em sociedade.

Perdemos totalmente a referência de qualidade de vida urbana e o respeito pelo espaço que é de todos.

Mais um "mega- retrato", um tomo de Brasil.

Ao longo dos tempos-e tristemente!- aprendemos que uma gestão sempre pode ser pior que a pior gestão da nossa História.

São Paulo, em tese, a cidade mais rica do país, aos poucos demonstra pelas ruas o que é ser pateticamente rico com vida essencialmente paupérrima, um triste paradoxo que instiga o pensamento do mais simplório ser .

Afinal, toda pobreza dói igualmente no Espírito das gentes: é a dor “comuníssimamente” democratizada via falácias...aqui e por aí.

Pagamos caríssimo para sermos cada vez mais pobres...todos, posto que o sofrimento urbano por aqui é holístico e não poupa ninguém.

Com a explosão da era mais corruptora do nosso todo, a que carcomeu o país inteiro em todos os seguimentos dos valores humanísticos inclusive, São Paulo, dantes tida como uma possível via final comum de sonhos aqui desaguados vindos do país e do mundo inteiro, hoje figura um “cemitério” de projetos perdidos em conjunto, que aqui também morrem nas calçadas das tantas e sucessivas gestões ineptas, sonhos expostos ao relento como os corpos das gentes que fazem das ruas os seus projetos de lares desabados, que sequer sonham que algum dia serão soerguidos.

A fumaça da drogadição esfria a todos e aquece a muitos...que mais nada têm.

Seres vivos perambulantes, triste produto da ineficiência política dos “homens”, corpos apáticos, hoje desprovidos de vida, mesmo de vida vegetativa.

Flores por aqui, na resiliente natureza primaveril, ainda têm vida mais digna que o Homem.

Somos um curioso cenário social de tendas expostas nas ruas , circundados de ciclovias por todos os lados, afinal, era preciso recuperar urgentemente alguma via VISÍVEL de passagem digna, limpa e sustentável em meio o caos da tragédia urbana que nos assola.

É qual uma maquiagem que pouco dura, a desbotar na primeira chuva de lágrimas torrenciais.

Democraticamente assistimos e vivemos, em todas as classes sociais, o que o abandono da educação , aliado às más gestões históricas e à corrupção dos valores sociais, podem fazer com a cidadania,inclusive das MEGALÓPOLES tidas acima de quaisquer riscos de desmanches: execrá-la de forma lúdica.

Estamos ludicamente desmanchados.

Adjetivo como “lúdica” porque, a despeito de todo o sofrimento ancorado no coração de todos que têm um mínimo de consciência do que é prioridade e qualidade de vida cidadã, ainda se tenta gritar aos quatro ventos que aqui é a melhor cidade do mundo para se trabalhar e “subir na vida”.

Bem, e não é só aqui.

É urgente sonhar, acreditar...e não acordar nunca.

Recentemente a cidade olímpica, a belíssima cidade maravilhosa também foi coroada a MELHOR DO MUNDO PARA SE VIVER, o povo aplaudiu, agora chora inconformado, a conosco disputar quem melhor protagoniza a cena de horror urbano mais inédita no país!

Afinal, concordo plenamente: é preciso, em algum momento da vida, voltar a se ser criança feliz, voltar a se brincar de bola, de casinha, de professor, de carrinho, de boneca , de bicicletas, de patins, de skate, de circo, fazer estórinhas, ter um amigo imaginário e até se brincar de médico.

E a mais triste e catastrófica das brincadeiras:

Quanto melhor se brinca de governar, mais conseguimos , qual num passe de mágica, uma total satisfação social à brincadeira fictícia de maquiar o tudo prioritário que de todos foi sorrateiramente furtado...só brincando de brincar.

Assim, aprendemos que é preciso um certo talento gestor para disfarçar o caos, mas nem isso conseguimos nesses dias de horrores lúdicos sampistas.

Hoje, descortinados todos os cenários escondidos, até as ciclovias desbotam sua tinta vermelha, frágil e metafórica, inócua figura de alívio social, como cor rutilante advinda do sangue derramado pelas ruas, dos quadros surreais encenados pela nossa violência urbana sem controle.

A Paulista, nobre avenida do povo, cartão postal ,aberta ao palco amortecedor das dores de todas as vozes inaudíveis do mundo, hoje rouba a cena da ida esquina da poesia assustada de Caetano.

Na nossa "RONDA" por Sampa de Paulo Vanzolini, saibam, alguma coisa-ainda!-sempre acontece nos nossos sensíveis olhos do coração, inclusive na Paulista, sempre que cruzamos TODAS AS SUAS ESQUINAS, não apenas a clássica esquina musa, a da Ipiranga com a São João.

Afinal ,como cidadãos, é obrigação enxergar o tudo que os olhos não vêm, hoje, O TUDO escancaradamente delator do que foi esquecido.

E se olharmos para cima, até aonde nossos olhos conseguem impressionar as retinas, veremos que é possível alçar sonhos por aqui sim!- através das vozes que escalam nossos arranha-céus, inclusive pelas pontes esculturais de cimos-sonhos inatingíveis!-que hoje "AO PICHAR O SETE" gritam ao mundo o abandono incontido das tantas gerações do nada.

Infelizmente.