Quem tem medo do Círio de Nazaré
Ninguém tem o direito de achar que não se deve acreditar em Deus. Mas não se deve também ter o direito de impedir que alguém duvide.
A Holanda, também conhecida como (Reino dos) Países Baixos, já foi vítima de grandes inundações. Para certos povos, desastres desse tipo “eram sinais divinos a mostrar que os seres humanos estavam se comportando mal na terra”. Os holandeses, contudo, preferiram acreditar que as autoridades falharam na manutenção dos diques. Algo semelhante ao que ocorreu com “o rompimento da barragem de Fundão, no subdistrito de Bento Rodrigues, a 35 km do centro do município brasileiro de Mariana, Minas Gerais, na tarde de 5 de novembro de 2015”, quando se deu o colapso de “uma barragem de rejeitos de mineração controlada pela Samarco Mineração S.A., um empreendimento conjunto das maiores empresas de mineração do mundo, a brasileira Vale S.A. e a anglo-australiana BHP Billiton”. Rompimento que praticamente acabou com um rio que era Doce.
A Holanda, para alguns autores, foi de certo modo a capital do Iluminismo europeu. “O Iluminismo separou a cultura europeia das suas raízes mergulhadas em antigas ideias de magia, realeza, hierarquia social e preponderância do clero”, preferindo apostar na “igualdade de cada indivíduo e no seu direito a opiniões livres e ao autogoverno”, desde que isso não redundasse em anarquia ou inibição da liberdade alheia.
O poder de Deus na terra já foi por muitos contestado. E em muitos casos – talvez não em todos, dada à condição do homem de eterno aprendiz – não se pode dizer que não existe coerência nessa contestação. “Darwin dizia que a história da criação era um conto da carochinha. Freud afirmava que tínhamos domínio sobre nós próprios. Spinoza negava a existência de milagres, de anjos, da necessidade de orar a uma entidade exterior: Deus era a natureza e nós. Émile Durkheim assegurava que os homens inventaram a religião para se sentirem seguros”.
Obviamente as ideias desses homens sempre poderão ser combatidas, sob muitos aspectos, incluindo-se, quem sabe, o raciocínio horizontal ou cartesiano. No entanto, ninguém poderá negar-lhes a objetividade.
O fato é que se a Holanda não venceu o mar, pelo menos convive com ele amigavelmente.
A partir daí talvez se possa estabelecer certa conexão entre o que foi dito e o título do texto.
Rio, 10/10/2016