Não se nasce... TORNA-SE!
"Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino. Somente a mediação de outrem pode constituir um indivíduo como um Outro. Enquanto existe para si, a criança não pode apreender-se como sexualmente diferenciada. Entre meninas e meninos, o corpo é, primeiramente, a irradiação de uma subjetividade, o instrumento que efetua a compreensão do mundo: é através dos olhos, das mãos e não das partes sexuais que apreendem o universo" - BEAUVOIR, Simone. O Segundo Sexo, volume 2. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1967, 2ª edição, p. 9.
É incrível como a incompreensão gera preconceitos. Há pouco menos de um mês, presenciamos - como sempre, nas redes sociais, uma vez que sejam o principal meio de comunicação hoje em dia -, o grassar do discurso de pessoas inconformadas com um trecho da obra de Simone de Beauvoir, a qual (conforme pode ser notado no trecho acima) apresenta que não se nasce masculino e feminino (do ponto de vista social), mas que se torna.
Parece lógico, pelo menos para mim, compreender que não há um destino social que acompanhe a determinação biológica do sujeito. Nasce-se macho e fêmea, e a sociedade molda o comportamento, indicando o que é ideal para cada um desses seres.
Digam-me vocês, se nunca ouviram expressões do tipo: "Isso é coisa de menina!", ou "Você não é mulherzinha!". Mais do que isso, é extremamente normal seguir o "padrão" ao presentear as crianças: carrinhos, brinquedos de cunho bélico, e outros de "macho" para os meninos, pois esse é o papel que deverão assumir na sociedade; e bonecas, brinquedos que imitem utensílios de cozinha, ou eletrodomésticos para as meninas, pois, indiretamente, se transmite a mensagem de que as mulheres devem ser submissas, e se dedicar unica e exclusivamente ao trabalho doméstico.
É isso o que a sociedade faz, meus caros. É disso que Beauvoir fala - que a sociedade forma o "padrão" de comportamento masculino e feminino - e são essas práticas que refutamos, afinal de contas, é deveras obsoleto classificar 'azul' como menino e 'rosa' como menina.
Por ora, prefiro não me aprofundar muito em outros debates que somente esse trecho da obra de Beauvoir pode trazer. Opto por me resumir ao caráter opressivo da sociedade, o que tem gerado muito sofrimento para ambos os seres (masculino e feminino).
É pelos padrões socialmente erigidos que homens se negam, por exemplo, a fazer exame de próstata (exame do toque), pois creem que isto arranhará a sua sexualidade. Culpa deles!? Não! Culpa da sociedade! É, ainda, por esses mesmos padrões, que vemos muitas mulheres submissas a condições desumanas, por crerem que não podem se apartar de seus maridos e levar uma vida sozinhas. Entendam... Na mente delas, elas não têm outra escolha, pois foi isso o que a sociedade sempre ensinou! Culpa delas!? Elas têm escolha? Não! Culpa da sociedade!
A sociedade é muito mais cruel do que se pensa, e continua a gerar mazelas. O que acontece, no entanto, é que muitos se iludem com o falso sentimento de mudança, e não percebem o mal que a sociedade causa, ainda que de modo velado!