“Cultura de Paz”

“Se queres paz, prepara-te para a guerra” (?) – Publius Flavius Vegetius Renatus. 

“A guerra é a continuação da política por outros meios” (?) – Carl von Clausewitz.

A antítese da paz é a guerra, que possui em seu seio o conflito que se embrutece em violência extrema e generalizada: entre nações, é guerra; dentro de nações, é guerra civil. Entretanto, discutir apenas a dicotomia paz x guerra não dimensiona totalmente uma conceituação sociológica da primeira.

Em Sociologia, no tocante à sua entrada, em 2008, como disciplina no currículo do ensino médio brasileiro, se aborda a “Cultura de Paz”, com base nos preceitos estabelecidos pela ONU/UNESCO: “Está intrinsecamente relacionada à prevenção e à resolução não violenta de conflitos. Fundamenta-se no princípio pluralismo, que assegura e sustenta a liberdade de opinião; na tolerância, na solidariedade e no compartilhamento em base cotidiana. Trata-se de construir globalmente uma cultura que respeite todos os direitos individuais, que se empenhe em prevenir conflitos e que se comprometa com a solução das novas ameaças não militares para a paz e para a segurança, como a exclusão, a pobreza extrema e a degradação ambiental” (Referencial Curricular RS: Sociologia, 2009, p. 93).

Logo, ao contrário das citações feitas no início desse texto, podemos concluir que, nos dias atuais, quem deseja a paz se prepara para construir a paz e que a guerra (e a violência) é a negação e a falência da política entendida enquanto espaço democrático de mediação de conflitos sociais, políticos ou econômicos. A construção da “Cultura de Paz” é um caminho para isso.

O conflito é inerente às sociedades humanas. Em todo o pensamento sociológico clássico (Marx, Durkheim e Weber) ele é objeto de análise, geralmente no interior de sociedades especificas. Todavia, a forma como esse é resolvido consiste numa opção a ser feita por paises, classes e grupos sociais. O fato é que onde existe liberdade de expressão e igualdade política e econômica a violência não é a opção; o contrário também é verdadeiro. Democracia e igualdade são os grandes sustentáculos da paz em qualquer nação.

Uma teorização sobre o tema foi realizada pelo sociólogo e matemático norueguês Johan Galtung, pioneiro dos estudos sobre a paz. Para Galtung, existe uma “paz negativa” (ausência de guerra) e uma “paz positiva” (ausência de violência). Conforme o autor, para que a paz positiva se efetive é necessário a superação da “violência estrutural” (oriunda da desigualdade de poder e da injustiça social), sendo que ainda existem a “violência direta” (agressão física, bélica) e a “violência cultural” (normas e comportamentos sociais – como a cultura de ódio na internet - que a legitimam e reproduzem).

“A paz invadiu o meu coração” – Gilberto Gil.

É por meio da evolução baseada em formulações teóricas como a de Galtung que chegamos a propostas como a “Cultura de Paz” para a solução de conflitos inter e intra nacionais. O psicólogo norteamericano David Adams, da UNESCO, aponta oito pilares para esta: “1 – Educação para uma ‘Cultura de Paz’; 2 – tolerância e solidariedade; 3 – participação democrática; 4 – fluxo de informações; 5 – desarmamento; 6 – direitos humanos; 7 – desenvolvimento sustentável; 8 – igualdade de gêneros”. Acrescentaria um nono pilar, refletindo a partir do pensamento de Galtung: diminuição das desigualdades sociais e da concentração de renda, que são grandes fatores de desagregação social em sociedades como a brasileira.

Por fim, creio que a “Cultura de Paz” é um dos meios para concretizar a paz no mundo, nos países e nas cidades, essas que, em última instância, são onde de fato vivemos e compartilhamos o espaço social com as demais pessoas.


Texto publicado nas versões impressa e online no "Caderno Especial de Natal: Paz" do Jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br