Bertrand Russell: mensagem ao futuro

Há 45 anos, no dia 3 de fevereiro de 1970, falecia, de gripe, aos 98 anos, o matemático e filósofo britânico Bertrand Russell, um dos grandes pensadores do século XX, agraciado com o Nobel de Literatura em 1950. Dentre as inúmeras facetas de sua vida pública e intelectual, foi, ao lado de Albert Einstein, um ativo militante contra as armas nucleares, sendo que, juntos, lançaram um manifesto pelo desarmamento em 1955.

Entretanto, o que me leva a evocar brevemente seu enorme legado aqui é a famosa resposta que dá a uma pergunta durante uma entrevista de TV, vídeo que seguidamente as pessoas compartilham nas redes sociais da internet. Era o ano de 1959. Russell, já com 86 anos, concedeu a entrevista ao jornalista John Freeman no programa Face to Face, na rede de inglesa BBC. Eis a parte final da mesma:

“John Freeman - Uma última pergunta. Suponha, Lord Russell, que esse filme seja assistido por nossos descendentes, como os pergaminhos do Mar Morto, daqui a mil anos. O que você acha interessante dizer a essa geração sobre a sua vida e as lições que você aprendeu?

Bertrand Russel – Eu gostaria de dizer duas coisas, uma intelectual e outra moral. O conselho intelectual que eu gostaria de dar é esse: quando você está estudando um assunto, ou considerando alguma filosofia, pergunte a si mesmo, somente, quais são os fatos e qual é a verdade que os fatos revelam. Nunca se deixe divergir pelo que você gostaria de acreditar ou pelo que você acha que traria benefícios sociais se fosse acreditado. Olhe apenas e somente para quais são os fatos. Esse é a recomendação intelectual que eu gostaria de dar.

O conselho moral que eu gostaria de dar é muito simples. Eu diria: o amor é sábio; o ódio é tolo. Nesse mundo que está ficando mais interconectado, nós temos que aprender a tolerar uns aos outros, nós temos que aprender a aceitar o fato de que algumas pessoas dizem coisas que não gostamos. Nós só podemos viver juntos dessa forma, se formos viver juntos e não morrer juntos. Nós precisamos aprender a bondade da caridade e da tolerância, o que é absolutamente vital para a continuação da vida humana nesse planeta.”

Não é à toa que a resposta repercuta nos dias atuais com tanta força. Há 70 anos do final da IIª Guerra Mundial, ainda estamos imersos numa cultura do ódio (principalmente manifesto na internet) e da violência, tanto nas relações em sociedade quanto entre países. A resposta expressa dois princípios, intelectual e moral, que se complementam. Primeiro, procurar conhecer as coisas da forma mais objetiva possível; segundo, praticar a tolerância. Uma coisa leva a outra.

Justamente ao falar sobre as experiências totalitárias de seu tempo, principalmente da Alemanha nazista, Hannah Arendt encontrou a gênese do totalitarismo (a forma mais extrema de autoritarismo) na ausência de reflexão das pessoas que a ela aderiram. Assim, essa irreflexão levou a um agir irracional, onde a falta de reconhecimento da condição humana do outro prevaleceu, levando a um limite extremo de intolerância. Foi a partir dessa noção que ela elaborou o seu famoso conceito de banalidade do mal, caracterizando um fenômeno totalitário que foi aceito irreflexivamente e praticado naturalmente por pessoas comuns, nas quais a presença de uma maldade extrema não era encontrada.

A resposta de Russell, atualíssima, nos leva a um sentido oposto a intolerância e a irreflexão. Devemos voltar ao passado, sempre que ele ajude a pensar o presente.



Integra da entrevista, para os interessados:  https://www.youtube.com/watch?v=Ut7drCi2mts


Texto publicado na seção de Opinião do jornal Portal de Notícias, versões online e impressa
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