GQ na Copa e na cozinha (2)
A cidade de Natal/RN está localizada na esquina do continente sul-americano. Teve ao longo de sua história patrões com padrões portugueses, holandeses e americanos. Agora aguarda e prepara-se para receber novos patrões com padrões FIFA. Um patrão internacional reconhecido por inúmeros países em todos os continentes.
Regras, espaços, participantes, povos e públicos pré-estabelecidos e prédeterminados. Regras que vão alem do campo e dos estádios, atingindo o raio de alguns quilômetros. Regras mercadológicas e midiáticas; regras jurídicas com legados e delegados. Da arbitragem em campo aos tribunais extraordinários, instalados nas arenas com juizados especiais para pequenas causas. Turistas e torcedores estrangeiros ainda têm direito a uma cartilha oferecida pela FIFA dando dicas de como se comportar em países de culturas e comportamentos diferentes.
O turismo provoca um afluxo de pessoas a determinados locais por diversas razões: sejam elas, dos locais, dos transportes ou dos viajantes. Locais que possuem uma história e uma cultura, construídas ao longo de sua ocupação com suas estórias e histórias. Atrativos históricos, bucólicos e gastronômicos. Características climáticas e geográficas como incentivos de viagem e acomodação.
Copa do Mundo é uma estratégia para trazer e fazer turismo, conhecer novos lugares, outros estados e países. Nos tempos de paz a Copa mundial de futebol funciona como uma guerra não declarada. Uma guerra simbólica nos campos gramados com uma invasão pacífica correndo pela retaguarda. Um turista deseja conhecer um pouco de tudo, da nova cidade ou região a ser visitada e conhecida. Invadir, experimentar, vivenciar e ocupar. E um pouco de tudo está inscrito e descrito na culinária local. Um exército de estomago vazio na ganha uma batalha.
A comida típica é um relato histórico da população local, por invasões sofridas e ocupações realizadas. As primeiras ocupações de uma região começam com a necessidade da busca de água, por frutos nativos, animais de caça e de pesca. Com fogo e utensílios, técnicas e temperos já conhecidos, preparam-se novos pratos diferenciados pelos costumes, e ordem de adição dos ingredientes.
Água e apetrechos culinários; frutos e raízes; animais de pesca e caça; mais os conhecimentos de preparo dão início a uma culinária local. A junção dos quatro elementos: terra, água, fogo e ar, dão origem a um quinto elemento de aroma e sabor.
Ocupantes bélicos do Forte Reis Magos (Natal/RN) necessitavam subir pelo rio Potengi com canoas e toneis para buscar água potável para uso do forte. Buscavam lugares e fontes onde a água era menos salobra. Com certeza descobriram frutos e frutas, trunfos e trufas. O forte teve ocupações portuguesas e holandesas ao longo da história local. O forte estabelecia uma ocupação estratégica e militar. E a necessidade de água potável favoreceu a ocupação do interior subindo o grande rio.
No século passado hidro aviões americanos pousaram, em local próximo ao Forte dos Reis Magos, fazendo escala de abastecimento. E assim a cultura local foi se construindo e se modificando. Constam informações que Natal foi a primeira cidade
brasileira a mascar chiclete, a consumir coca cola, e usar óculos tipo ray ban, no estilo aviador.
A história da alimentação constrói a história de um local, representa a cultura local. A necessidade de alimento; a disponibilidade de alimentos; e o conhecimento de quem faz e quem degusta. Sabores e saberes estão implícitos em cada prato típico. O homem modifica o meio, e o meio é modificado pelo homem. A culinária local é modificada por povos invasores e o povo invasor modifica a sua própria culinária. O homem constrói e destrói.
Aves modificam o ambiente ao transportar sementes de um lado para o outro. Abelhas e outros insetos modificam o ambiente ao transportar o pólen entre as flores provocando uma fecundação. Cada qual com a sua práxis de modificação. O homem modifica o ambiente com guerras e invasões, ocupações bélicas e pacíficas, ocupações de povoamento e turísticas. Navios transatlânticos e aviões intercontinentais tem a capacidade de transportar enormes quantidades de passageiros com títulos de turistas e imigrantes.
A retornar de uma viagem, de uma guerra ou uma ocupação, o migrante retorna com novos conhecimentos dos locais onde esteve da mesma forma que deixa suas visões e suas ideias por onde esteve. O conhecimento vem dos livros que lemos, das pessoas que convivemos, dos lugares onde estivemos e da comida que comemos.
Entre Natal e Parnamirim/RN ─ 23/03/2014 Texto escrito para: Jornal de HOJE – Natal/RN