Tango Brasileiro
Conversamos com as pessoas e vamos descobrindo coisas. Como, por exemplo, o fato de que a posição contrária à redução da maioridade penal não é só uma questão jurídico-institucional-filosófica. Ou algo parecido. Ela é desaconselhável simplesmente porque já não cabem mais detentos em nossas prisões. Que, talvez como nos EUA, reúnam algo em torno de 1% da população.
Quando chega o primeiro domingo de maio, é possível que o delegado ou o juiz diga para algum prisioneiro: “Vai pra casa ver a sua mãe”. Mesmo sabendo que aquela saída pode não ter volta. O que não deixa de contribuir para a impunidade.
Alguns perigosos bandidos mortos recentemente em investidas policiais estavam gozando de liberdade condicional.
Outro fator responsável pelo aumento da impunidade é a incidência praticamente diária de assaltos e crimes de morte, cada vez mais assombrosos. Ou nem tanto, na medida em que a eles nos acostumamos. Com os criminosos nem dando agora tanta bola para as imagens gravadas por câmaras estrategicamente posicionadas. Não há efetivo policial que dê conta dessa quantidade absurda de crimes, muitos deles violentos. Podemos imaginar a pilha, sempre crescente, de processos existentes em cada delegacia. Os próprios policiais provavelmente duvidando de que 30% deles sejam de fato apurados.
Os bandidos naturalmente sabem disso. Sabem que a diversidade de ações criminosas acaba deixando a polícia tonta ou maluca.
E não vai dar em nada a pretensa higienização ou extermínio dos responsáveis por atos criminosos, traduzida em ações esporádicas que não podem ocorrer com a mesma velocidade dos crimes diários em nossas ruas ou lares. Não poderão dar em nada enquanto não houver como proporcionar o verdadeiro combate, através, por exemplo, da redução do contrabando de armas, de outra política para o consumo e venda de drogas e da redução das desigualdades sociais geradoras dos bolsões de pobreza nas grandes capitais. O que não é novidade para ninguém, como não é para os que se encontram, como nós, bem afastados do palco das decisões.
Outra providência também seria a elevação substancial (mesmo) do salário dos policiais, para a consolidação da dignidade da profissão. Correspondendo essa especial remuneração à exoneração sumaríssima em casos de comprovados desvios de conduta.
Enquanto não houver atitudes dessa natureza, ou outras mais abalizadas, só poderemos contar, para quem acredita, com a providência divina. Como no caso daquele argentino que, caído com um tiro na perna, em Vargem Pequena, só não morreu porque engasgou o revólver de quem lhe perseguia.
Rio, 20/08/2015