Educação, política e violência: o professor na encruzilhada
Lamentável e inaceitável o ocorrido com os professores em Curitiba (Paraná) no mês que passou. O chefe maior e também governador do Estado simplesmente soltou a PM (Polícia Militar) sobre professores indefesos que estavam a lutar por direitos. Amanhecemos tristes, estarrecidos, abobalhados e mais burros após aquele dia. O fato foi quase inacreditável, pois a Polícia Militar (em todo o Brasil) diz caminhar (e com muitos recursos) no sentido da polícia de proximidade e/ou comunitária e foi possível naquele dia assistir ao vivo PMs violentos, cruéis e despreparados servindo como exército privado de um governador sem escrúpulos, o senhor Beto Richa do PSDB.
E fechamos o mês de abril com mais um capítulo de truculência, de força bruta desproporcional por parte da polícia e humilhação ostensiva dos professores. Essa é a “pátria educadora”, essa é a política de segurança pública em democracia que se alimenta do medo e da insegurança nossa de cada dia. A realidade do Paraná, entretanto, nada mais é do que um retrato de todo o Brasil que comunga na educação alguns problemas que merecem maiores detalhes:
Em primeiro lugar, é notável o pouco caso, a banalização e o descrédito da profissão docente. Talvez nem seja uma profissão. Meus alunos dizem que “qualquer um pode dar aula” e “segurar a atenção de uma turma de 40 ou 50 alunos”. Creio que reside justamente neste ponto os gargalos da “autoridade momentânea” que goza o docente em frente a uma sala de aula. Se “qualquer um pode lecionar” ou estar “naquele lugar”, qualquer um também pode colocar em xeque a legitimidade, o direito, a discricionariedade e o poder do professor. É por aí que encontramos a possibilidade da violência e a maturação de acordos tácitos de que “é melhor não pesar na mão com a caneta”, pois - apesar de ser professor - corre-se o risco da reprovação, especialmente em escolas despreparadas e alienadas da conjuntura atual.
Em segundo lugar, é óbvio que se o docente não possui a autoridade preservada em sala de aula o que esperar da “autoridade da rua” ou das autoridades que estão nos órgãos governamentais? Os casos dos professores em São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Espírito Santo são suficientes para ver como a legitimidade da profissão docente há muito é contestada. Já na primeira ação governamental, professores são colocados em segundo plano quando o assunto é política pública. Fala-se em educação, mas não se fala daqueles que garantem o seu desenvolvimento. Não ao acaso o salário é o primeiro ponto a ser mexido e remexido porque, geralmente, toca-se com força nos “recursos humanos” na intenção de baixar custos de uma demanda que é infinita. Por sinal, esta é outra justificativa para não se dar credibilidade aos docentes e nada como revirar direitos e salários de uma categoria que deve ficar quieta e calada em nome de um pouco de economia. Para que? Não sei! É melhor deixar para a imaginação dos leitores, visto que no Brasil com os recursos públicos pode-se fazer muita coisa, inclusive, enxertar cuecas e aumentar os recursos privados.
Em terceiro e último lugar, o que dizer de um país que cuida tão mal dos seus cuidadores? Mais de uma vez já disse que professores exercem atividades de “interação com cuidado” e poucos profissionais estão mais próximos de crianças, adolescentes e jovens do que eles. Logo, o docente atua em vários campos e é curioso como a população brasileira não contesta o baixo salário deste profissional que educa e passa um bom tempo com seus filhos. O paradoxo é interessante, pois quando o professor apanha, quando é jogado ao chão, toma bala de borracha, puxões de cabelo e empurrões como se fosse animal boa parte desta mesma população grita de dor. Sociedade cínica, pois não sabe o que fazer. Geme diante de uma TV, tem pena daquele que sofre na mão da polícia, levanta o dedo em riste em favor da política pública levada a efeito pelo governo e ao mesmo tempo não observa, não responsabiliza, não acompanha e tampouco participa efetivamente da educação dos próprios filhos. Sociedade hipócrita porque muitos dos seus filhos sequer chegarão ao curso superior e mesmo assim ela não vê o docente como um mecanismo de mudança das condições objetivas de sua vida. É certo que a escola é uma instituição complexa e o mesmo pode-se dizer da profissão docente. A descrença, o desrespeito e o cinismo coletivo alimentam um mosaico de imagens negativas sobre a educação e sobre os professores que chega ao absurdo. Contradição maior é quase impossível, dado que a educação como política de Estado é garantia certa de um futuro promissor para um país e sua gente. Longe da educação com qualidade é impossível esperar homens e mulheres plenos e conscientes em cidadania. De outro modo, próximo ao cinismo político, o qual tem inclusive participação de professores para o trabalho sujo, a coisa fica até pior e neste caminho é claro que qualquer um pode ser professor, inclusive políticos do PT, do PSDB, do PP, do PMDB e outros Ps que estão por aí.