TERCEIRIZAÇÃO - Experiência no Japão
Durante certo período trabalhamos como operários para algumas das gigantes tecnológicas do Japão, como empregados terceirizados.
Percebemos que, apesar de realizarmos com eficiência, muitas vezes o mesmo tipo de trabalho dos funcionários efetivos, havia certa elitização que cerceava nossas ações na empresa. O funcionário efetivo, qualquer que fosse seu nível, sempre atuava como líder em relação aos terceirizados, tratando a todos com tom de comando, fosse esse estrangeiro ou mesmo, japonês.
Essa elite é a que tem acesso aos treinamentos visando seguir carreira com possibilidade de atingir os mais altos postos.
O operário terceirizado, não importa quão eficiente ou quanto tempo de trabalho tenha, estará sempre no mesmo nível de quando foi admitido. Isso gera a longo prazo, certa depressão, afetando sua vida em vários aspectos inclusive, incidindo numa menor eficiência profissional.
Ele é praticamente invisível dentro da empresa, que, ao contrário, trata com muito tato seus funcionários efetivos, para além de evitar perdê-los, prepará-los para assumir as posições de responsabilidade no futuro.
Esses efetivos recebem vultosos bônus de acordo com a lucratividade da empresa duas vezes por ano, e, logicamente, é algo inacessível aos empregados terceirizados.
Os contratos de trabalho dos terceirizados são na maioria de um ou dois meses de duração. Findo, havendo demanda da contratante, poderá ser renovado, caso contrário, resta buscar outra colocação em outra empresa. Óbviamente, em caso de crise que demande corte de pessoal, os primeiros a serem cortados são os operários terceirizados.
Caso ocorra algum imprevisto com a contratante, a mesma pode dispensar os trabalhos da empresa terceirizada, sem maiores explicações ou obrigações legais. Nesse caso, cabe à terceirizada arcar com os custos das demissões, porém, a lei permite que esta apenas realoque o operário em qualquer outro lugar e serviço, que pode ser distante ou de alta periculosidade, etc., e, caso este recuse, pode-se incorrer na demissão sem maiores custos.
As terceirizadas costumam pagar o primeiro salário apenas após dois meses trabalhado. Com as facilidades legais para abertura deste tipo de firma, são comuns as "falências", deixando os operários sem receber os dois últimos meses trabalhados. Resta-lhes apelar para a longa e exaustiva batalha judicial para o recebimento destes.
A sonegação de impostos por parte destas empresas no passado, também era uma constante. Estavam sempre mudando a razão social, nome fantasia, etc, para fugir ao fisco.
O que chama a atenção, é o enriquecimento vertiginoso dos donos dessas empreiteiras, que sem a devida preparação para a vida empresarial, ou "berço", de repente passavam a ostentar carrões, ternos e gravatas espalhafatosos, relógios e jóias pesadas muito além do recomendado na discreta sociedade japonesa.
Os acordos entre contratante e terceirizadas são livres, seguindo as negociações do mercado, sem que a preocupação ou interesses dos operários pesem nas decisões. Não importa o valor negociado entre as empresas, as terceirizadas pagam, na maioria das vezes, o quanto querem, dentro das margens da lei, que tem definido um sistema de salário mínimo para cada estado no país.
Atualmente a legislação japonesa se tornou bem mais rigorosa, visando uma proteção maior aos trabalhadores. Agora, caso o operário terceirizado atue na mesma fábrica por 3 anos consecutivos, recebe o direito de ser efetivado como funcionário direto desta, com os mesmos privilégios concedidos aos demais efetivos.
É vetado às terceirizadas, selecionar operários com base em idade, gênero e nacionalidade, e a contratante deve aceitar qualquer que seja enviado ao trabalho, sem passá-lo por testes ou entrevistas.
No Japão, país que sempre careceu de mão de obra, esse sistema permitiu a entrada no país e consequente contratação de imigrantes pobres, que, ganhando o menor salário-hora permitido, só conseguiam empregos através das terceirizadas. Isso favoreceu grandemente o enriquecimento das empreiteiras.
O problema pode vir a surgir no Brasil, país com excesso de mão de obra simples e poucos empregos, se a legislação permitir a contratação de estrangeiros pobres que seriam recrutados diretamente em seus países e trazidos ao Brasil; estes estariam praticamente obrigados a trabalharem por pelo menos um ano para ressarcir as dívidas de moradia e viagem providenciadas pelas empreiteiras, que, no caso do Japão, sempre cobravam um valor abusivo pelas passagens aéreas.
É certo que essas empreiteiras (terceirizadas), oferecem alguma chance àqueles que, pelos mais variados motivos não conseguem um emprego direto e necessitam de trabalho.
Mas esse sistema também acaba por criar um problema social, quando pessoas ainda jovens, que com algum empenho poderiam conseguir um cargo direto, "viciam'' no esquema de terceirização, crendo que terão um salário sem ter que aguentar as pressões da companhia, por desempenho e concorrência por cargos, por exemplo.
O simples fato de constar no currículo que a pessoa trabalhou a maior parte do tempo como empregado terceirizado, desabona, muitas vezes, fechando as portas quando este decide enfim, buscar algo melhor e mais seguro.