IDOS TEMPOS!

Idos Tempos!

Minha infância na capital de São Paulo, tudo era tão diferente que não há a menor comparação com os dias de hoje. Os automóveis eram todos importados da Inglaterra, França e Estados Unidos. Pouca movimentação na rua dos carros particulares, mas, em compensação, diversos carros de aluguel, sempre na cor preta, chapa vermelha, faziam ora corrida pré-estabelecida, ora tipo lotação em percurso por traçados pré-determinados. Fora este meio de transporte tinha o bonde, aberto nas laterais com estribo de passarela do cobrador ou o camarão, fechado com o cobrador fixo em determinado lugar, trazendo em seu interior reclame como este: Veja ilustre passageiro o belo tipo faceiro que o senhor tem a seu lado e no entanto, acredite, quase morreu de bronquite salvou-o o Rhum Creosotado e, ônibus.

Ir a cidade não se cogitava o uso de roupa esporte. Era necessário o vestuário tipo costume ou terno com gravata. Chapéu para os mais velhos, e as senhoras de roupas discretas, luvas brancas, boinas, sapatos fechados nos mais variados modelos de saltos. Nunca se viu uma mulher de sandália e vestido colorido, muito menos acima do joelho. Nem mesmo nas praias para o banho de mar, se via mulher desnuda, seus maios eram roupas de banho muito bem acobertadas. Elas, fumarem na rua, nem pensar. Calça comprida pra mulher não existia. Seus casamentos eram inseparáveis, mas, quando raramente alguma mulher fosse desquitada (hoje divorciada) era considerada artista de radio e de teatro, e como tal, não prestavam, eram imorais. Muitas mulheres trabalhavam fora como professoras, enfermeiras, funcionárias de repartição publica e nada mais.

Os cinemas só entravam os homens de paletó e gravata, e assistia um conserto de orquestra, ou de pianistas, cantores, conjuntos de corda em musica de câmera, antes do inicio das sessões. Havia um serviço de indicação de lugar com lanterna para os que chegavam atrasados. Mas se algum namorado ousasse beijar sua amada, era logo censurado pelo lanterninha que focava em sua cara, fazendo qualquer pecador pagar sua penitencia vermelho de vergonha. Depois do cinema o chique era tomar chá nos magazines, assistir aos desfiles de moda. E aos proêmios os programas se estendiam aos bares, as mesas de bilhar, aos carteados nos clubes, as corridas nos hipódromos. E aos mais ousados um Teatro de Revista, uma ida às casas das meretrizes.

O comportamento religioso era frequente das mulheres dentro das igrejas e os homens na porta a espera delas. As procissões os homens levavam os andores num revezamento inesperado, carregavam os estandartes e levavam as tochas. As mulheres cantavam de cabeça coberta com suas mantilhas e rezavam em seus livros de missa. Muitas pertenciam às suas irmandades distintas pelas cores dos seus colares de cetim e pingentes de medalhas das Congregações.

A politica era representada por meia dúzia de Partidos, e as eleições eram com cédulas que eram escrutinadas mão a mão, somadas e divulgadas somente ao final da apuração. Assim se manipulava o resultado perpetuando seus lideres no poder.

A vigilância municipal ficava a cargo da Guarda Civil, e a Força Pública para a Segurança do Estado. O Exercito fazia a proteção nacional.

Nas escolas havia na grade curricular a educação física, cívica, religiosa e orfeônica. E os alunos participavam dos desfiles em feriados Nacionais, com uniformes e corpo musical de fanfarra.

Os alunos formavam fila no pátio, entravam em sala de aula e aguardavam em pé a chegada do professor. Quando da visita do Diretor os alunos ficavam em pé até que fosse autorizado a se sentarem. Cada aluno tinha uma caderneta com o carimbo da presença diária e com as observações disciplinares dos alunos para os pais tomarem ciência. No final de ano eram anotadas as notas das matérias e a sua aprovação ou reprovação do ano letivo. Havia turmas matutinas, vespertinas e, conforme o colégio a turma sem internato e internato. Principalmente nos colégios de padres e de freiras.

As profissões prestadoras de serviço eram as de engraxate, sapateiro, encanador, eletricistas, tapeceiro, barbeiro, afinador de instrumentos musicais, garçom, cozinheiro, despachante, torneiro, ferreiro, marceneiro, vidraceiro, padeiro, carteiro, chaveiro, chofer, musico, maestro, datilografo, etc. E as profissões acadêmicas se restringiam em Advogado, Contador, Dentista, Engenheiro, Farmacêutico, Médico, etc. As barbearias eram sinalizadas com um bastão colorido nas cores americana e francesa em azul, vermelho e branco. Os barbeiros trabalhavam com navalhas afiadíssimas, a toda ora amoladas no couro pendurado no braço da cadeira, e a tesoura muito usada, costumava beliscar a barba e o cabelo. A máquina de cortar cabelo era manual tipo alicate e os penteados eram fixados com goma ou óleo. Os cortes eram do tipo aparado, americano ou militar. Assim surgiu a musica carnavalesca: -“olha a cabelereira do Zezé, será que ele é”?

Os meios de comunicação eram jornais, revistas, radio, telex e telefone. Mas o telefone era precário, dependia da intervenção da telefonista, não havia numero suficiente para todos, e tinha que solicitar a ligação pelo numeral máximo de cinco dígitos. As ligações interurbanas tinham que ser programadas e aguardadas serem completadas, mas sua audição era péssima, muitas vezes aos berros para que na outra linha ouvisse o recado. E o entretenimento eram os saraus de canto, poesia e execuções de instrumentos musicais, e audição de discos tocados em vitrolas. Assistir os shows nos coretos em praça publica, preferencialmente das bandas e fanfarras. Registrava-se a presença pela fotografia revelada na hora, através da habilidade do fotografo, no manuseio dos produtos químicos que trazia numa caixa encapuzado, onde o filme era velado na foto captada pela objetiva em negativo e depois transposicionadas para o positivo retrato. Muitas vezes este processo de revelação carecia de água, cujo recurso de última hora era o fotografo lamber o retrato que amarelava com o tempo, razão pela qual os fotógrafos eram chamados de lambe-lambe, com suas máquinas caixão afixadas em cavalete por tripé.

As viagens nacionais podiam ser de trem, ônibus, avião e navio, mas as internacionais se restringiam apenas de navio e avião com muita limitação de qualidade e velocidade.

Os Bancos Oficiais, Estrangeiros e Particulares ficavam no Centro da Cidade, assim como as casas comerciais, os Correios, Mercado, Cinema, Teatro. Nos bairros somente quitanda, açougue, mercearia, feira, sapateiro, oficina mecânica e farmácia. Tudo o mais tinha que ser encontrado na cidade. Alguns bairros eram privilegiados com Colégios, Igrejas, Cemitérios, Cinema e Museus. Bairros tipo colônia de estrangeiros havia fábricas, tecelagem, clube, hipódromo e hospital. Num determinado bairro ficava a estação de trem, aeroporto, parque de diversões, hospício, cadeia e penitenciária; Convento, Mosteiro e Abadia; acessam a estradas rodoviárias donde partiram os Bandeirantes.

A moeda corrente inicialmente era o Real com as frações em sentis de reis ou inteiros em múltiplos contos de reis; depois de 1942 surgiu o Cruzeiro até 1967 quando surgiu o Cruzeiro Novo; em 1970 surge o Cruzeiro novamente; em 1986 vira Cruzado, mas em 1989 passa a ser chamado de Cruzado Novo. Em 1990 o valor passa a se chamar novamente de Cruzeiro, até 1993 para a nova nomenclatura de Cruzeiro Real, que durou apenas um ano, vindo a ser chamado de Real desde 1994 até os dias de hoje.

Assim era no meu tempo de criança, que não faz tanto tempo assim, em que pese ter sido no século passado. Com o advento do pós Guerra com o surgimento da técnica industrial até a era espacial com toda a tecnologia que espanta qualquer criança do meu tempo de infância.

São Paulo 21 de Abril de 2.015

José Francisco Ferraz Luz

CHICO LUZ
Enviado por CHICO LUZ em 21/04/2015
Reeditado em 22/04/2015
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